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Vitamina B12 e cognição em idosos – Parte 2/2

De forma geral, seria prudente encorajar as pessoas, especialmente os idosos, a manter um status bom, mais do que somente satisfatório, de vitamina B12 através da dieta. Um estudo de coorte em Framingham mostrou que o uso de suplementos, cereais fortificados e leite pareceram proteger contra baixas concentrações. O consumo de alimentos de origem animal, especialmente as carnes, pode ajudar a manter esse status, já que são as únicas fontes naturais dessa vitamina.

Possíveis mecanismos biológicos

Existem muitos mecanismos possíveis através dos quais o baixo status de vitamina B12 pode influenciar no funcionamento do cérebro e, por conseguinte, na cognição, e esses mecanismos não são reciprocamente exclusivos. Uma possibilidade é que o efeito é mediado por homocisteína, porque o baixo status de vitamina B12 está associado com a elevação da concentração de tHcy (concentração total no plasma de homocisteína) (21). Muitos mecanismos foram propostos para os efeitos da homocisteína no cérebro, além do efeito no sistema de vasos sanguíneos cerebrais (8,22). Alternativamente, o efeito do baixo status de vitamina B12 pode ser mediado pelas maiores concentrações de ácido metilmalônico (MMA), como discutido por McCracken et al (17); notavelmente, a concentração de MMA no fluido cérebro-espinhal é duas vezes a concentração no plasma (23).

A deficiência clássica de vitamina B12 é acompanhada por alterações nas concentrações de citocinas, como o fator de necrose tumoral ou o fator de crescimento epidérmico (24). Até agora, não se sabe se essas citocinas são modificadas em pessoas com status de vitamina B12 normal baixo. A hipótese mais comum, entretanto, para os efeitos neurotóxicos do baixo status de vitamina B12 é que esse leva à deficiência de S-adenosilmetionina (SAM) e, através disso, às reações deficientes de metilação no sistema nervoso central (25). Níveis muito baixos de SAM foram encontrados em fluido cérebro-espinhal (26) e no cérebro (27) de pacientes com doença de Alzheimer, mas não se sabe de algum estudo de SAM no cérebro em relação ao status de vitamina B12.

Em um nível mais global, sugerimos que duas outras mudanças associadas com o nível baixo-normal de vitamina B12 possam mediar os efeitos na cognição: a atrofia do cérebro e os danos à massa branca. Perdas progressivas no tecido cerebral (atrofia) são bem estabelecidas como um fator associado com, ou causando, um declínio cognitivo ou demência (28-30) e, recentemente, mostrou-se que o baixo status de vitamina B12 no início do estudo era um indicador de atrofia em todo o cérebro em idosos residindo em comunidades (31). A atrofia progressiva do cérebro foi associada com as concentrações plasmáticas de vitamina B12 em um alcance de 800 a 160 pmol/L e com concentrações de holotranscobalamina de 250 a 25 pmol/L. Não existe um limiar óbvio de concentração abaixo do qual a atrofia começa (31). As pessoas com os níveis mais baixos de vitamina B12 no plasma mostraram duas vezes a taxa de atrofia (1,05%/ano) que aquelas com níveis mais altos (0,51%/ano).

A deficiência clássica de vitamina B12 está associada com danos à massa branca na medula espinhal e no cérebro, o que tem sido atribuído a danos à mielina como resultado de uma metilação deficiente da proteína básica de mielina (25,32). Existem muitas evidências de que os danos à massa branca no cérebro estão associados com, e podem preceder, declínios cognitivos (30,33). É, portanto, notável que, em participantes de um estudo em Rotterdam, danos à massa branca estiveram relacionados ao status de vitamina B12 acima do normal, segundo avaliado pelos níveis plasmáticos totais de vitamina B12, holotranscobalamina, saturação de transcobalamina e MMA (34). Relatórios anteriores de pacientes com deficiência de vitamina B12 mostraram que mudanças na massa branca são reversíveis com tratamento com vitamina B12 (35).

Concluímos que o déficit cognitivo associado com o baixo status de vitamina B12 pode ser devido em parte à perda de tecido cerebral durante muitos anos, mas também a danos potencialmente reversíveis à massa branca. Entretanto, para saber se essas associações são causais são necessários estudos de intervenção.

Os déficits associados ao baixo status de vitamina B12 são reversíveis?

As descobertas discutidas acima levantam importantes questões: o nível baixo de vitamina B12 realmente causa danos cognitivos? Ou são observadas associações meramente como consequência de fatores que podem confundir, como por exemplo, algum fator de estudo de vida ou fatores não reconhecidos em análises? Na clínica prática, descobriu-se que pacientes com falhas cognitivas associadas com deficiência de vitamina B12 frequentemente, mas não sempre, melhoram com o tratamento, enquanto aqueles com demência evidente não mostram melhoras (36). Entretanto, esses são trabalhos com indícios casuais e existem muito poucos estudos controlados aleatórios nos quais somente a vitamina B12 foi dada a idosos com falhas cognitivas ou demência. A revisão de Cochrane em 2003 (37) encontrou somente dois estudos com metodologia aceitável, que tinham um total de 42 pacientes envolvidos, dos quais somente 36 completaram o estudo. Os períodos de tratamento foram de 1 a 5 meses. Os pontos avaliados foram mudanças nas Análises do Estado Mini-Mental ou nas Análises Escala-Cognitiva da Doença de Alzheimer, que avaliam capacidades cognitivas globais: nenhuma diferença foi encontrada entre os grupos tratados e os placebos. Uma recente revisão sistemática (38) identificou seis estudos que satisfizeram seu critério metodológico, mas a ampla variedade de doses usadas e os 35 testes de funções cognitivas dificultam a chegada de conclusões. Notavelmente, alguns estudos reportaram uma piora na cognição nos grupos tratados com vitamina B12 comparado com aqueles que recebiam placebo. No entanto, em quatro dos seis estudos, os participantes eram idosos normais, sem problemas cognitivos.

Está claro que nenhuma conclusão pode ser tirada dos estudos publicados. Esses estudos foram muito curtos em duração e frequentemente realizados em tipos errados de indivíduos. “Grandes estudos aleatórios são necessários para avaliar o valor da vitamina B12 para melhorar a função cognitiva e prevenir ou retardar o declínio cognitivo em idosos normais ou com demência. Estudos são necessários para usar critérios estabelecidos e validados e medir a função cognitiva, sendo longo o suficiente para detectar tendências” (37), segundo Cochrane.

Existem implicações para a saúde pública?

É uma prática clínica e de saúde pública aceitável tratar pessoas que têm concentrações baixas de vitamina B12 com uma dose estabelecida (normalmente 150 pmol/L) para prevenir anemia, neuropatia e falhas cognitivas. Os estudos observacionais descritos parecem mostrar associações entre baixo status de vitamina B12 (isto é, concentrações plasmáticas > 150 pmol/L) e falhas cognitivas, aumentando a taxa de atrofia cerebral e os danos na massa branca. A falta de evidências dos estudos de intervenção não pode ser usada como evidência contra uma ligação causal porque os estudos foram inadequados para testar essa hipótese. Assim, na ausência de bons estudos, o que fazemos? Os dados limitados não sugerem que existe um limiar de concentração de vitamina B12 abaixo do qual esses efeitos se tornam aparentes; mais exatamente, a associação parece ser contínua na maioria do alcance normal. Um fator desconhecido é se a exposição prolongada ao baixo status de vitamina B12 leva a danos irreversíveis no cérebro; existem sugestões que há uma janela limitada de oportunidades para mudanças reversão de mudanças cognitivas (39,40). Pacientes com defeitos genéticos na via de vitamina B12 presumivelmente precisariam ser sido expostos desde o nascimento e dessa forma é notável que os déficits cognitivos e os danos na massa branca em um paciente de 42 anos de idade com deficiência de cobalamina podem ser revertidos com tratamento com um coquetel que reduz a homocisteína, incluindo a vitamina B12 (41).

De forma geral, seria prudente encorajar as pessoas, especialmente os idosos, a manter um status bom, mais do que somente satisfatório, de vitamina B12 através da dieta. Um estudo de coorte em Framingham mostrou que o uso de suplementos, cereais fortificados e leite pareceram proteger contra baixas concentrações (42). O consumo de alimentos de origem animal, especialmente as carnes, pode ajudar a manter esse status, já que são as únicas fontes naturais dessa vitamina. Essas seções da população que têm alta preponderância de baixo status de vitamina B12 e aqueles países onde a deficiência de vitamina B12 é comum precisariam tiras suas próprias conclusões através de dados observacionais. Até termos evidências convincentes de estudos, não se pode recomendar medidas de larga escala de saúde pública, como fortificação obrigatória de alimentos com vitamina B12 (44).

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Baseado no artigo “Vitamin B-12 and cognition in the elderly”, de A David Smith e Helga Refsum, publicado no American Journal of Clinical Nutrition, Vol. 89, No. 2, 707S-711S, February 2009.

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