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Vitamina B12 e cognição em idosos – Parte 1/2

A vitamina B12 (cobalamina) é encontrada somente em produtos animais e é necessária para a síntese de DNA, o componente que contém os genes das células. Esta vitamina também ajuda na manutenção dos tecidos nervosos e na formação normal do sangue. Indivíduos com deficiência de vitamina B12 apresentam distúrbios neurológicos. O teor de vitamina B12 na carne bovina é o mais elevado de todas as carnes, ao redor de 2,8 microgramas/100 gramas. São necessárias 8,4 porções (100 gramas) de carne branca de aves ou 5,1 porções (100 gramas) de lombo suíno para proporcionar a mesma quantidade de vitamina B12 disponível em uma porção (100 gramas) de carne bovina.

Introdução

A vitamina B12 (cobalamina) é encontrada somente em produtos animais e é necessária para a síntese de DNA, o componente que contém os genes das células. Esta vitamina também ajuda na manutenção dos tecidos nervosos e na formação normal do sangue. Indivíduos com deficiência de vitamina B12 apresentam distúrbios neurológicos. O teor de vitamina B12 na carne bovina é o mais elevado de todas as carnes, ao redor de 2,8 microgramas/100 gramas. São necessárias 8,4 porções (100 gramas) de carne branca de aves ou 5,1 porções (100 gramas) de lombo suíno para proporcionar a mesma quantidade de vitamina B12 disponível em uma porção (100 gramas) de carne bovina (21).

Muito antes de ter sido reconhecido que a deficiência de vitamina B12 pode ser causa de anemia perniciosa, Addison (1849) notou que a “mente ocasionalmente ficava vaga” em seus pacientes (1). No começo do século XX, houve vários relatos de sintomas mentais em pacientes com anemia perniciosa e em 1913, Barrett (2) também descreveu mudanças histopatológicas no córtex cerebral, notavelmente neuro-degeneração e danos na massa branca e vasos sanguíneos. Embora tenha havido muitos relatos subsequentes de déficits cognitivos em pacientes com anemia perniciosa, foi somente na década de cinquenta que a demência foi primeiramente associada com o baixo status de vitamina B12 independentemente da anemia perniciosa (3). Apesar de o conceito da demência reversível devido à deficiência de vitamina B12 tenha se tornado amplamente reconhecido, de fato, houve poucas evidências de que o tratamento com vitamina B-12 melhora o status cognitivo em pacientes com demência, em contraste da dramática melhora nos sinais hematológicos após o tratamento em pacientes com anemia perniciosa (4).

Nesse artigo, três questões principais serão abordadas:

1) Quais são as evidências de que as concentrações de vitamina B-12 dentro do usualmente aceito como normal estão associadas com déficit cognitivo em idosos?

2) Quais os possíveis mecanismos biológicos que podem mediar o efeito das baixas concentrações de vitamina B12 no cérebro?

3) Pode algum desses déficits cognitivos associados com o baixo status de vitamina B12 ser revertido pelo tratamento com vitamina B-12 e, se sim, existem implicações para a política de saúde pública?

Baixo status de vitamina B12 e falhas cognitivas

A cognição, ou nossa capacidade de perceber, pensar e lembrar, é influenciada por muitos fatores, sendo um deles a nutrição. A ideia de que baixas concentrações de vitamina B12 podem estar associadas com problemas cognitivos foi levantada por Bell et al (5) em 1990 e claramente expressada por Rosenberg e Miller (6) quando escreveram: “Para a maioria das pessoas, incluindo idosos, deficiências evidentes de vitaminas são improváveis; é mais provável que deficiências suaves ou sub-clínicas possam ter um papel na patogênese da redução da função cognitiva com o envelhecimento”. Entretanto, uma recente revisão sistemática (7) concluiu que “evidências de estudos longitudinais de coorte e caso-controle sugerem que não existe associação significante entre concentrações sanguíneas e ingestão dietética de vitamina B12 com testes de desempenho cognitivo ou doença de Alzheimer”. Outra revisão mostrou que seis estudos prospectivos, que incluíram 4607 pessoas, que reportaram uma relação inversa entre déficit cognitivo ou demência e ingestão de vitamina B12 ou concentrações sanguíneas dessa vitamina, mas também mostrou que outros 10 estudos, envolvendo 7537 pessoas, não encontraram associação com o status de vitamina B12 (8).

Como essas discrepâncias podem ser explicadas? Primeiro, precisamos lembrar que os distúrbios cognitivos são comuns e que existem muitas causas possíveis, não havendo razão para que sempre se associe esses distúrbios com o baixo status de vitamina B12. Então, deve-se buscar por evidências de distúrbios cognitivos naqueles com baixo status de vitamina B12 ao invés de buscar o baixo status dessa vitamina naqueles com distúrbios cognitivos. Em segundo lugar, a cognição pode ser avaliada por muitos testes diferentes e não se sabe quais setores cognitivos podem estar particularmente associados com a vitamina B12. Em sua revisão sistemática, Raman et al (7) notou que 30 diferentes métodos de testes cognitivos foram usados nos trabalhos que ele avaliou. Em terceiro lugar, não se sabe se a associação entre baixas concentrações de vitamina B12 e déficits cognitivos é linear ou se tem um limiar. Em quarto lugar, a avaliação do status de vitamina B12 não é direta, porque as concentrações totais de vitamina no plasma não são um bom marcador para o status de vitamina nos tecidos (9). Abordagens alternativas são usar marcadores metabólicos que refletem o funcionamento da vitamina B12, como concentração total no plasma de homocisteína (tHcy) ou ácido metilmalônico (MMA) (10), concentração sanguínea de holotranscobalamina, saturação de transcobalamina (11) ou razão entre holotranscobalamina e vitamina B12 total (12). Finalmente, está se tornando aparente que a associação entre baixo status de vitamina B12 com o déficit cognitivo pode depender do contexto, por exemplo, do status de folato da população estudada (13). As revisões citadas anteriormente (7,8) levaram alguns desses fatores em consideração. Os mais recentes e relevantes estudos serão discutidos abaixo.

Um estudo caso-controle sobre status de vitmaina B12, avaliado através da concentração de holotranscobolamina no plasma, mostrou que baixos níveis de holotranscobolamina e níveis aumentados de MMA e tHcy, mas não o nível total plasmático de vitamina B12, estiveram associados com doença de Alzheimer patologicamente confirmada (15). No mesmo estudo, o teste cognitivo global no controle populacional esteve correlacionado com a concentração plasmática de holotranscobalamina acima do alcance normal, de 35 a 200 pmol/L. Dois outros estudos feitos com idosos mostraram associações entre maiores concentrações de MMA e déficit cognitivo, mas nenhuma associação da cognição com o nível plasmático de vitamina B12 (16,17). A utilidade da razão entre holotranscobolamina e vitamina B12 total foi mostrada em um estudo onde somente essa razão, mas não o nível total de vitamina B12 nem de holotranscobolamina, esteve correlacionado com avaliações globais em testes cognitivos (12). Um grande estudo em uma comunidade, o Banbury B12 Study, confirmou que novos marcadores, ao invés do nível plasmático total de vitamina B12, estão mais bem correlacionados com a cognição (18). Nesse estudo, os autores examinaram 820 pessoas que viviam em residências comunitárias, com mais de 75 anos, e avaliaram associações entre vitamina B12 total do plasma, holotranscobalamina, MMA, tHcy e distúrbios cognitivos. Os resultados mostram que somente os que tiveram os níveis mais baixos de vitamina B12 total no plasma estiveram associados com distúrbios cognitivos, enquanto, no caso da holotranscobalamina, níveis não tão baixos foram relacionados a distúrbios cognitivos. Altos níveis de MMA (o grupo de nível mais alto) e de tHcy (os dois mais altos) também foram relacionados com distúrbios cognitivos. Além disso, holotranscobalamina a um nível menor do que o normal foi associada com maior risco de desenvolvimento de distúrbios cognitivos.

Dois novos estudos prospectivos suportaram os relatos anteriores de que o status de vitamina B12 é um dos fatores que influenciam o declínio cognitivo. Em um estudo na Coreia, a incidência de demência em uma população de 625 idosos não foi associada com as concentrações iniciais de vitamina B12, mas foi significantemente relacionada com a mudança na vitamina B12 plasmática durante o período de acompanhamento de dois anos (19); essa associação foi evidente com incidência três vezes maior de demência naqueles com menores concentrações de vitamina B12 no plasma comparado com aqueles de maiores concentrações. Naquele que foi provavelmente o maior estudo desse tipo, Clarke et al (20) examinaram a associação entre marcadores de status de vitamina B12 e declínio cognitivo durante um período de 10 anos em 1648 idosos vivendo em residência comunitária (65 anos) em Oxford, Reino Unido. Foram encontradas associações significantes no começo e após 10 anos entre os resultados dos testes cognitivos e baixos níveis de holotranscobalamina, alto MMA ou alto tHcy, mas não com o nível total plasmático de vitamina B12. Usando um modelo linear de efeitos mistos, os autores encontraram associações entre declínio cognitivo do início até 10 anos depois com baixas concentrações de holotranscobalamina e altas concentrações de MMA ou tHcy. Nenhuma associação significante foi encontrada entre baixas concentrações de vitamina B12 e declínios cognitivos subsequentes. Usando esse modelo, estimou-se que dobrando a concentração de holotranscobalamina de 50 para 100 pmol/L levaria a uma redução de 30% na taxa de declínio cognitivo, enquanto dobrando a concentração de MMA de 0,25 para 0,50 µmol/L, levaria a um aumento de 50% na taxa de declínio (20). Esse importante estudo foi bem controlado para uma variedade de outros fatores que podem influenciar o declínio cognitivo e levou à conclusão de que o baixo status de vitamina B12 dentro do alcance normal é um fator de risco significante para o declínio cognitivo em idosos. Mais uma vez, essa conclusão notavelmente partiu do uso de outros marcadores que não a vitamina B12 em si.

Referências bibliográficas

1. McCaddon A. Homocysteine and cognition: a historical perspective. J Alzheimers Dis 2006;9:361-80.

2. Barrett AM. Mental disorders and cerebral lesions associated with pernicious anemia. Am J Insanity 1913;49:1063-78.

3. Droller H, Dossett JA. Vitamin B12 levels in senile dementia and confusional states. Geriatrics 1959;14:367-73.

4. Hector M, Burton JR. What are the psychiatric manifestations of vitamin B12 deficiency? J Am Geriatr Soc 1988;36:1105-12.

5. Bell IR, Edman JS, Marby DW, et al. Vitamin B12 and folate status in acute geropsychiatric inpatients: affective and cognitive characteristics of a vitamin nondeficient population. Biol Psychiatry 1990;27:125-37.

6. Rosenberg IH, Miller JW. Nutritional factors in physical and cognitive functions of elderly people. Am J Clin Nutr 1992;55:1237S-43S.

7. Raman G, Tatsioni A, Chung M, et al. Heterogeneity and lack of good quality studies limit association between folate, vitamins B-6 and B-12, and cognitive function. J Nutr 2007;137:1789-94.

8. Smith AD. The worldwide challenge of the dementias: a role for B vitamins and homocysteine? Food Nutr Bull 2008;29:S143-72.

9. Miller JW. Assessing the association between vitamin B-12 status and cognitive function in older adults. Am J Clin Nutr 2006;84:1259-60.

10. Clarke R, Refsum H, Birks J, et al. Screening for vitamin B-12 and folate deficiency in older persons. Am J Clin Nutr 2003;77:1241-7.

11. Bor MV, Nexo E, Hvas AM. Holo-transcobalamin concentration and transcobalamin saturation reflect recent vitamin B12 absorption better than does serum vitamin B12. Clin Chem 2004;50:1043-9.

12. Garrod MG, Green R, Allen LH, et al. Fraction of total plasma vitamin B12 bound to transcobalamin correlates with cognitive function in elderly Latinos with depressive symptoms. Clin Chem 2008;54:1210-7.

13. Morris MS, Jacques PF, Rosenberg IH, Selhub J. Folate and vitamin B-12 status in relation to anemia, macrocytosis, and cognitive impairment in older Americans in the age of folic acid fortification. Am J Clin Nutr 2007;85:193-200.

14. Selhub J, Morris MS, Jacques PF, Rosenberg IH. Folate-vitamin B-12 interaction in relation to cognitive impairment, anemia, and biochemical indicators of vitamin B-12 deficiency. Am J Clin Nutr 2009;89(suppl):702S-6S.

15. Refsum H, Smith AD. Low vitamin B-12 status in confirmed Alzheimer´s disease as revealed by serum holotranscobalamin. J Neurol Neurosurg Psychiatry 2003;74:959-61.

16. Lewis MS, Miller LS, Johnson MA, Dolce EB, Allen RH, Stabler SP. Elevated methylmalonic acid is related to cognitive impairment in older adults enrolled in an elderly nutrition program. J Nutr Elder 2005;24: 47-65.

17. McCracken C, Hudson P, Ellis R, McCaddon A. Methylmalonic acid and cognitive function in the Medical Research Council Cognitive Function and Ageing Study. Am J Clin Nutr 2006;84:1406-11.

18. Hin H, Clarke R, Sherliker P, et al. Clinical relevance of low serum vitamin B12 concentrations in older people: the Banbury B12 study. Age Ageing 2006;35:416-422.

19. Kim J-M, Stewart R, Kim S-W, et al. Changes in folate, vitamin B12, and homocysteine associated with incident dementia. J Neurol Neurosurg Psychiatry 2008;79:864-8.

20. Clarke R, Birks J, Nexo E, et al. Low vitamin B-12 status and risk of cognitive decline in older adults. Am J Clin Nutr 2007;86:1384-91.

21. Rodrigues do Valle, E. Carne bovina: alimento nobre indispensável. Embrapa Gado de Corte. http://www.cnpgc.embrapa.br/publicacoes/divulga/GCD41.html.

Baseado no artigo “Vitamin B-12 and cognition in the elderly”, de A David Smith e Helga Refsum, publicado no American Journal of Clinical Nutrition, Vol. 89, No. 2, 707S-711S, February 2009.

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