Por Rodrigo S. Marques , Bruno Cappellozza e Reinaldo F. Cooke
Rodrigo Marques é zootecnista e mestre pela Esalq/USP. Atualmente realiza o programa de doutoramento em Animal Science na Oregon State University – Corvallis, OR, EUA
Bruno Capellozza é zootecnista e mestre Oregon State University. Atualmente realiza o programa de doutoramento em Animal Science na Oregon State University – Corvallis, OR, EUA
Reinaldo Cooke é professor e pesquisador na Oregon State University – Eastern Oregon Agricultural Research Center, Burns, OR
Com o objetivo de maximizar a rentabilidade dos sistemas de cria, os produtores de bovinos de corte são desafiados a produzirem 1 bezerro por vaca por ano. O fator que define a obtenção desse objetivo é o desempenho reprodutivo do rebanho. Como consequência, perdas econômicas resultantes de falhas reprodutivas chegam a casa de 2,8 bilhões de dólares por ano nos EUA (Lamb et al., 2011) e a Figura 1 ilustra os custos dos problemas reprodutivos em rebanhos (corte e leite) norte-americanos.
Temperamento dos animais é um dos diversos fatores que afetam o desempenho reprodutivo em rebanho de corte. No presente artigo, temos o objetivo de introduzir o conceito de temperamento, maneiras para avaliação desse parâmetro, assim como seus efeitos no desempenho de vacas adultas, novilhas de reposição e na subsequente produtividade das progenies. Dados do nosso grupo de pesquisa serão apresentados tanto em rebanhos Bos indicus (Cooke et al., 2011), cruzamentos de B. indicus × B. taurus (Cooke et al., 2009 a,b) e também em rebanhos B. taurus (Cooke et al., 2012).
O conceito de temperamento
Temperamento pode ser definido como as respostas comportamentais dos animais quando expostos ao contato humano (Fordyce et al., 1988). A medida que o temperament fica mais excitável, a resposta dos animais ao contato humano ou qualquer outro procedimento de manejo se torna mais excitável e/ou agitado. Como será reportado a seguir, temperamento pode ser avaliado pelos produtores de bovinos de corte e ser usado como um critério de seleção não apenas por questões de segurança, mas também como uma maneira de melhorar o desempenho reprodutivo e geral do rebanho.
Diversos fatores podem afetar temperamento animal, tais como sexo, idade e a raça. Dentre esses, raça é o aspecto mais importante, dado que bovinos com influencia B. indicus (Nelore e Brahman) são mais excitáveis do que bovinos B. taurus (Angus, Simental e Hereford), embora animais com temperamento mais excitável/agressivo são frequentemente observados em rebanhos B. taurus, principalmente em animais jovens. Além disso, rebanhos criados em sistemas de produção extensivo são frequentemente mais excitáveis quando comparados a rebanhos criados em sistemas intensivos, pelo resultado da menor interação com humanos.
Figura 1. Custos anuais totais das disordens reprodutivas nos EUA (Adaptado de Bellows et al., 2002).
Temperamento: como avaliar?
Técnicas para avaliar o temperamento dos animais podem ser classificadas como de movimentação restrita ou não. Dentro das técnicas que não retém a movimentação animal, como o próprio nome implica, o temperamento é avaliado pelo medo ou a resposta agressiva ao contato humano quando os animais estão livres para se moverem dentro de uma área pré-estabelecida. Exemplos dessas técnicas são a velocidade de saída do tronco de manejo e o escore de baia. Brevemente, a velocidade de saída quantifica o tempo que cada animal gasta para percorrer um distancia pré-determinada (1,9 m), enquanto que o escore de baia avalia o comportamento de cada animal quando este entra em uma baia e interage com uma pessoa que fica parada em um canto da baia. Para a velocidade de saída, os animais avaliados ainda podem ser divididos em quintis de acordo com as velocidades calculadas e recebem uma nota de 1 a 5 (escore de saída; 1 = animais no quintil mais devagar; 5 = animais no quintil mais rápido).
Ao contrário, as técnicas de movimentação restrita avaliam o temperamento dos animais quando esses são fisicamente restritos, tais como no tronco de contenção. O escore de tronco é um exemplo dessa técnica, na qual os animais são individualmente contidos no tronco e recebem uma nota na escala de 1 a 5 de acordo com o seu comportamento, onde: 1 = calmo e sem movimento, 2 = movimentos inquietos, 3 = movimentos frequentes com vocalização, 4 = movimentação constante e 5 = luta violenta e contínua.
Após a avaliação dessas técnicas, escores de temperamento podem ser calculados para cada animal pela média dos escores de tronco e saída. Além disso, os animais podem ser classificados de acordo com o escore de temperamento como tendo um temperamento adequado (≤ 3) ou excitável (> 3). Esse critério foi desenvolvido com base nas pesquisas do nosso grupo indicando que temperamento moderado (tais como escores de temperamento 2 e 3) não prejudicam produtividade animal (Cooke et al., 2009a; 2011; 2012), mas permitem que os animais lidem com desafios associados ao sistemas de produção extensivos. É importante para os produtores terem em mente que outros métodos de avaliação de temperamento existem, mas os que foram reportados aqui são os mais confiáveis para quantificar o temperamento do rebanho e relativamente de fácil realização durante os procedimentos de manejo.
Estratégias de manejo para melhorar o temperamento do rebanho
Semelhante a avaliação do temperamento, estratégias para melhorar o temperamento do rebanho devem ser práticas e confiáveis. Como mencionado anteriormente, a alternativa mais simples e direta para manejar o temperamento do rebanho é incluir essa característica como um critério de seleção, particularmente em touros, vacas e novilhas de reposição, e principlamente pela moderada herdabilidade dessa característica. Além disso, o descarte de animais excitáveis e menos produtivos, tais como vacas e novilhas que não emprenham na estação de monta, também irá beneficiar o temperamento e a eficiência produtiva do rebanho.
Outra alternativa que nosso grupo avaliou no Eastern Oregon Agricultural Research Center (EOARC) em Burns, é a aclimatação de novilhas de reposição ao contato humano (Cooke et al., 2012). Por um período de 4 semanas e 3 vezes por semana, os animais são individualmente e gradualmente aclimatados ao centro de manejo e também à presença humana. Essa técnica é descrita e apresentada a seguir:
– Semana 1: Animais são individualmente processados, mas não são presos no tronco de manejo,.
– Semana 2: Animais são individualmente processados no tronco de manejo e presos (cabeça) no tronco por aproximadamente 5 segundos.
– Semana 3: Animais são processados de maneira similar a semana 2, mas presos (cabeça) no tronco por 30 segundos.
– Semana 4: Durante as 3 primeiras semanas, os animais retornaram ao pasto/baia imediatamente após o manejo, considerando que na 4ª semana eles permanecem no centro de manejo por 1 hora, são processados novamente e somente após essa atividade retornam ao pasto.
Como tempo e despesas com serviços são alguns dos muitos entraves que impedem a realização dessa técnica, uma alternativa a ser adotada pelos produtores seria manter os animais perto do centro de manejo e/ou andar pelo pasto/baia durante a alimentação. Essas estratégias têm por objetivo maximizar a interação do ser humano com o gado, de uma maneira que os animais se acostumem com o movimento e o contato humano, impedindo respostas agressivas nas futuras atividades de manejo, tais como vacinação e inseminação artificial (IA).
Impactos do temperamento no desempenho do rebanho
Nessa seção, nosso objetivo é apresentar dados recentes do nosso grupo de pesquisa de como o temperamento afeta o desempenho reprodutivo do rebanho, tanto em vacas adultas quanto em novilhas de reposição.
Tabela 1. Variáveis do desempenho reprodutivo de vacas B. taurus de acordo com o temperamento (Adaptado de Cooke et al., 2012).
Novilhas de reposição
Novilhas de reposição devem ser manejadas para atingir a puberdade aos 12 meses de idade, emprenhar ao 15 meses e parir pela primeira vez com 2 anos de idade. Novilhas que não atingem esse objetivo afetam significativamente a rentabilidade do sistema de produção de corte, sendo que essas novilhas não irão desmamar um bezerro antes de atingirem 3 anos de idade. Por isso, um adequado manejo nessa categoria animal é imprescindível para obter um número máximo de animais parindo com 2 anos de idade. Cooke et al. (2009a) avaliaram os efeitos da aclimatação (anteriormente descrito) em novilhas de reposição (Braford, Brahman × Angus, e Angus) após o desmame com a intenção de melhorar o temperamento, enquanto que taxas de crescimento, obtenção de puberdade, e taxas de prenhez foram avaliados até o início estação de monta. Novilhas que foram aclimatadas alcançaram a puberdade e emprenharam mais cedo durante a primeira estação de monta.
Além disso, esse processo de aclimatação efetivamente melhorou o temperamento desses animais (chute score em B. indicus e saída de velocidade em animais B. taurus) e também reduziu as concentrações plasmáticas de cortisol no final do período de aclimatação.
Conclusões
Em conclusão, temperamento afeta o desempenho reprodutivo do rebanho, assim como a produtividade do sistema de cria. Para evitar perdas econômicas resultantes da ineficiência produtiva e reprodutiva do rebanho, os produtores de gado de corte são encorajados a incluir temperamento como critério de seleção/descarte, usando qualquer uma das técnicas anteriormente apresentadas como escore de tronco e velocidade de saída.
1 Comment
Muito bom esse artigo, depois de anos de erros com o manejo do gado, é tarde ++ a tempo de corrigir, nem só de pasto e grama o gado vivera !!! Acredito que o Brasil seja o maior criador de gado do planeta + somos os piores cuidadores da galaxia !!! Erramos por falta de conhecimento…..