EUA: Produtores de carne buscam divulgar benefícios nutricionais da carne
18 de julho de 2002
Comissão Européia envia França para Corte de Justiça pela segunda vez
22 de julho de 2002

Superovulação de doadoras de embriões bovinos sem observação de cio

Por Pietro Sampaio Baruselli1 e Márcio de Oliveira Marques2

1. Introdução

A transferência de embriões (TE) é a técnica mais utilizada em todo o mundo para multiplicar animais de alto valor genético (Bó et al., 2000). No ano de 2000 foram realizadas oficialmente cerca de 6.000 colheitas de embriões no Brasil, e aproximadamente 113.000 no mundo (Thibier, 2001).

Entretanto, apesar da grande importância da TE para acelerar o ganho genético dos rebanhos, o emprego desta biotecnologia é passível de algumas limitações: 1) manejo para detecção de cio; 2) necessidade de iniciar o tratamento superestimulatório em momento determinado do ciclo estral; 3) baixa consistência da produção de embriões viáveis por doadora; 4) cerca de 20 a 30% das doadoras não produzem nenhum embrião transferível. Esta variabilidade na resposta à superovulação pode decorrer de fatores relacionados ao tratamento ou, em maior medida, ser conseqüência de fatores individuais associados à dinâmica folicular.

O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados de protocolos de superovulação que propõem a redução da variabilidade individual pelo controle farmacológico da dinâmica folicular ovariana e da ovulação, com a vantagem de também facilitarem o manejo dos animais e a programação antecipada dos procedimentos e dos técnicos envolvidos.

2. Momento adequado para o início do programa de superovulação

Nos últimos anos, estudos têm demostrado claramente que, para que a TE atinja a sua máxima eficiência, os tratamentos superovulatórios devem ser realizados no início da onda de crescimento folicular, antes da seleção do folículo dominante. A maioria dos programas superestimulatórios tinha início entre o dia 8 e o dia 12 do ciclo estral, momento mais provável de início da segunda onda de crescimento folicular. Entretanto, esse procedimento dependia da detecção do “cio base” da doadora para programar o tratamento. Além disso, o início da segunda onda de crescimento folicular é variável, o que pode determinar respostas inconstantes à superovulação.

Desta forma, uma alternativa viável para controlar a dinâmica folicular em momento aleatório do ciclo estral, sem a necessidade de detecção de cio, facilitaria sobremaneira o manejo, a programação logística das fazendas e dos técnicos, bem como os resultados dos programas de TE.

3. Controle da dinâmica folicular e da superovulação

Nos últimos 10 anos foram desenvolvidos alguns métodos para controlar o início da onda de crescimento folicular em bovinos. A administração de agonistas de GnRH, LH e de métodos mecânicos (aspiração folicular) têm sido empregadas com êxito para promover o início da onda de crescimento folicular em um intervalo de tempo conhecido.

Um dos métodos hormonais mais eficientes e de custo reduzido que tem sido empregado com sucesso é a administração da combinação estrógeno + progesterona. Após sua aplicação, os folículos antrais presentes no momento do tratamento entram em atresia pelo mecanismo de retroalimentação negativa do eixo hipotálamo-hipofisário. Desta forma, o início da nova onda de crescimento folicular é sincronizado, começando 4,3 dias após o tratamento (Bó et al., 1995). A Tabela 1 apresenta uma comparação entre os resultados obtidos quando da utilização de 17Beta-estradiol (E-17Beta) associado à progesterona (P4) na superovulação de vacas e novilhas e aqueles decorrentes do método tradicional de superovulação com detecção de estro.

Tabela 1 Resposta superovulatória (média +/- desvio padrão) em vacas e novilhas de corte e de leite superestimuladas nos Dias 8 a 12 após o cio (tratamento tradicional), e após o uso de dispositivos com progestágenos associado a 5 mg de E-17Beta e 100 mg de P4. Córdoba, 1999.

Como pode ser constatado, o tratamento com progesterona e estradiol apresentou resposta similar àquela decorrente do tratamento tradicional, com a vantagem de ser possível iniciá-lo em dia aleatório do ciclo estral, de maneira sincronizada e pré-determinada. Desta forma, o técnico pode sincronizar grupos de doadoras em dias previamente programados, facilitando o manejo dos programas de TE.

O Benzoato de Estradiol (BE) é um outro estrógeno disponível no mercado brasileiro, e teve seu efeito comparado ao do E-17Beta na indução do início da onda de crescimento folicular (Bó et al., 1996). No mesmo experimento anteriormente apresentado, objetivou-se avaliar secundariamente o efeito da administração de análogo da prostaglandina F2alfa (PGF2alfa) durante o terceiro (Dia 6) ou quarto dias (Dia 7) do tratamento com FSH (Folltropin-V, Vetrepharm, Canadá).

Foram utilizadas vacas de corte (Red Angus, n= 81; Simental, n=16 e Red Brangus, n=8), dividas em quatro grupos em delineamento fatorial 2×2. No Dia 0, todas as vacas receberam um dispositivo contendo progesterona (DIV-B, Syntex, Argentina), juntamente à administração de 2,5 mg de E-17Beta e 50 mg de P4 (Lab. Rio de Janeiro, Argentina), ou 2,5 mg de BE e 50 mg de P4. Os tratamentos superestimulatórios foram iniciados no Dia 4. As vacas foram subdivididas novamente para receber a primeira dose de PGF2alfa (150microgramas de d-cloprostenol, Preloban, Intervet) na manhã do Dia 6 ou na manhã do Dia 7. Os dispositivos foram retirados no dia da segunda aplicação de PGF2alfa, e todas as vacas foram inseminadas 48 e 60 h após a remoção do implante (Dias 8 e 9). Os embriões foram colhidos 7 dias após a primeira IA, e avaliados segundo as normas da IETS.

Tabela 2 Resposta superovulatória (médias +/- desvio padrão) em doadoras superestimuladas 4 dias depois da administração de E-17Beta ou BE.

Não houve diferença significativa entre as raças e os tratamentos superestimulatórios (Tabela 2), o que demonstra que o Benzoato de Estradiol também pode ser utilizado eficientemente em associação à progesterona no início de tratamentos superovulatórios.

Esses resultados foram confirmados em zebuínos por Barros e colaboradores (2000), que utilizaram BE no início de protocolos de superovulação com dispositivos intravaginais contendo progesterona, e também obtiveram resultados satisfatórios.

4. Inseminação artificial em tempo fixo em programas de superovulação

Mesmo com a possibilidade de sincronização da onda de crescimento folicular no início do tratamento superovulatório, o momento da inseminação artificial da doadora de embriões ainda dependia da detecção de estro. Como esse procedimento é sujeito a erros, e impossibilita a programação prévia da data exata da colheita dos embriões, nosso grupo de pesquisa delineou um experimento para comparar 2 protocolos de superovulação com inseminação artificial em tempo fixo (IATF).

Foram utilizadas 10 vacas Nelore mantidas a pasto em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, divididas ao acaso em dois tratamentos. As doadoras foram superovuladas utilizando um delineamento “cross-over”, e o tratamento invertido após um intervalo de 35 dias.

No primeiro grupo (P24), as vacas receberam (Dia 0) um dispositivo intravaginal contendo progesterona (CIDR-B, InterAg, New Zealand) e 3 mg de benzoato de estradiol im (Estrogin, Farmavet). No Dia 5 iniciou-se a administração de 130 mg de FSH (Folltropin, Vetrepharm, Canada) em doses decrescentes, duas vezes ao dia, durante 4 dias. No Dia 7 (7:00) foi administrado um análogo da prostaglandina F2alfa (PGF2alfa; 0,8 mg Delprostenate im; Glandinex, Tecnopec), sendo o CIDR-B removido no Dia 8 (7:00), 24 horas após a aplicação da PGF2alfa. No Dia 9 (7:00), 25 mg de LHp (Lutropin, Vetrepharm, Canada) foram administrados 48 horas depois da aplicação da PGF2alfa. Todas as doadoras foram inseminadas 12 e 24 horas após a injeção de LH. No Dia 16 foram realizadas a colheita e a classificação dos embriões. O segundo grupo (P36) recebeu protocolo semelhante ao do primeiro grupo, exceto pela retirada do CIDR-B 36 horas após a injeção de PGF2alfa (Dia 8, 19:00).

Tabela 3 Resultados (média +/- desvio padrão) dos tratamentos superovulatórios P24 e P36 em doadoras de embriões da raça Nelore. Campo Grande, 2000 (Zanenga et al., resultados preliminares).

Os resultados (Tabela 3) sugerem que a realização da IATF 12 e 24 horas após a administração de LH (48 horas após a PGF2alfa), concomitantemente à retirada do CIDR depois de 24 ou 36 da administração de PGF2alfa, é viável para programas de transferência de embriões em Bos indicus, sem a necessidade de detecção de estro, o que concorda com resultados prévios encontrados na literatura (Barros et al., 2000).

Atualmente, o protocolo P24 está sendo utilizado para comparar diferentes dosagens de FSH (Folltropin-V, Vetrepharm, Canada) em doadoras Nelore inseminadas em tempo fixo. Os resultados preliminares da superovulação e colheita de embriões de parte das 20 vacas delineadas “cross-over” são demonstrados na Tabela 4.

Tabela 4 Número de embriões viáveis e congeláveis (média +/- desvio padrão) em vacas Nelore superovuladas com diferentes doses de FSH (Folltropin-V) e inseminadas em tempo fixo. São Paulo, 2002 (Resultados preliminares).

Como se vê, esses resultados indicam que não existem diferenças no número de embriões transferíveis e congeláveis de doadoras Nelore após o emprego de diferentes dosagens de FSH em protocolos que sincronizam o início da onda folicular e empregam a inseminação artificial em tempo fixo. Entretanto, parte das doadoras utilizadas no experimento em tela foi selecionada por histórico de fertilidade e diâmetro ovariano; assim, deve-se ressaltar que essas doses necessitam ser testadas em doadoras que não tenham sido previamente selecionadas.

5. Proposta de esquema para superovulação, inseminação artificial e colheita de embriões em tempo fixo

Com base nos dados obtidos, nosso grupo de pesquisa propôs um tratamento (Figura 1) para a utilização a campo na superovulação de doadoras de embrião.

Figura 1 Protocolo para superovulação, inseminação artificial e colheita de embriões em tempo fixo em bovinos. O tratamento consiste na inserção de um dispositivo liberador de progesterona juntamente à administração de Benzoato de estradiol (BE) e progesterona (P4) no Dia 0 (M), com início do tratamento superovulatório no Dia 4 (M), aplicação de PGF no Dia 6 (M), remoção do dispositivo no Dia 7 (M), aplicação de LH no dia 8 (M), seguido da inseminação artificial em tempo fixo 12 e 24 horas após o LH. O estro não é observado e a colheita dos embriões é realizada no Dia 15.

6 – Referências Bibliográficas

Barros, C.M. Controle farmacológico do ciclo estral e superovulação em zebuínos de corte. Anais do Simpósio sobre controle farmacológico do ciclo estral em ruminantes. São Paulo, SP; 31 de maio a 2 de junho, 2000. p. 158-189.

Bó, G.A. Sincronizacion de celos para programas de inseminacion artificial y transferencia de embriones bovinos. Anais do Simpósio sobre controle farmacológico do ciclo estral em ruminantes. p. 35-60. São Paulo, SP, 31 de maio a 2 de junho, 2000.

Bó, G.A.; Adams, G.P.; Caccia, M.; Martinez, M.; Pierson, R.A.; Mapletoft, R.J. Ovarian follicular wave emergence after treatment with progesterone and estradiol in cattle. Animal Reproduction Science, v.39, p.193-204, 1995.

Bó, G.A.; Adams, G.P.; Pierson, R.A.; Mapletoft, R.J. Effect of progestogen plus estradiol-17Beta treatment on superovulatory response in beef cattle. Theriogenology, v.45, p.897-910, 1996.

Bó, G.A.; Baruselli, P.S.; Moreno, D.; Cutaia, L.; Caccia, M.; Tríbulo, R.; Tríbulo, H.; Mapletoft, R.J. The control of follicular wave development for self-pointed embryo transfer programs in cattle. Theriogenology, v. 57, p. 53-72, 2002.

Thibier, M. The animal embryo transfer industry in figures: a report from the IETS data retrieval committee. IETS Newsletter, v.19, n.4, 2001.
___________________________
1Prof. Dr. Pietro Sampaio Baruselli é professor do Departamento de Reprodução Animal, FMVZ – USP
2Márcio de Oliveira Marques é médico veterinário e mestrando do Departamento de Reprodução Animal, FMVZ – USP

Os comentários estão encerrados.

plugins premium WordPress