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Rendimento de carcaça X Rendimento do ganho de peso

Por Rafael da Costa Cervieri1

O rendimento de carcaça é determinante sobre o custo de produção e sobre a rentabilidade da atividade de engorda, seja de animais terminados a pasto ou em confinamento. Vários fatores interferem sobre este: grupo genético, grau de acabamento da carcaça, idade, jejum pré-abate e nível energético da dieta. Por exemplo, à medida que o animal aumenta de peso e deposita mais gordura de cobertura, o rendimento de carcaça aumenta.

Dietas com maior teor de alimentos concentrados (maior nível energético) promovem maiores ganhos de peso e maior rendimento de carcaça pela maior deposição de gordura e menor conteúdo gastrintestinal. Na prática, animais magros no início de engorda apresentam entre 48 e 51% de rendimento de carcaça e são abatidos com rendimentos entre 50 e 55%, fruto dos fatores citados acima.

Mas e o rendimento do ganho de peso, seria o mesmo que o rendimento de carcaça? Devemos considerar que 1 kg de ganho de peso vivo corresponderia a quantos gramas de carcaça? Esta questão exerce grande impacto sobre o custo da @ engordada ou custo do ganho de peso.

Comumente técnicos e produtores efetuam a seguinte conta para calcular o custo da @ engordada em confinamento: supondo que o animal tenha ganhado ou esteja ganhando 1,000 kg/dia, multiplica-se este ganho por 50%, chegando ao valor de 500 gramas de carcaça. Dividindo o custo diário por cabeça pelo ganho de 500 gramas de carcaça e em seguida multiplicando o resultado por 15 (peso de uma @) chega-se ao valor da @ engordada. Outra maneira é considerar o rendimento do ganho igual ao rendimento final da carcaça. Repedindo a pergunta: 1,000 kg de ganho de peso vivo sempre corresponde a 500 gramas de carcaça?

Na verdade o rendimento do ganho de peso na maioria das situações supera o valor de 50%, chegando a valores de até 87%, ou seja, para 1,000 kg de ganho de peso o ganho de carcaça seria de 870 gramas (Coleman et al., 1995). Valores entre 60 e 65% de rendimento de ganho são freqüentemente obtidos na engorda em confinamento.

O ganho de peso se dá pelo acréscimo de tecidos componentes ou não da carcaça e pelo enchimento do trato digestório. A fração do ganho de peso que é depositada como tecidos da carcaça (ossos, músculo e gordura) é a que importa am animais destinados o abate e pode variar significativamente, como demonstrado no trabalho de Coleman et al. (1995).

Neste estudo, novilhos Angus foram submetidos a 145 dias de recria ou crescimento (alimentados com dieta contendo 55% de silagem de sorgo à vontade ou dieta com alto teor de concentrado, 87% da MS, com consumo limitado). Em seguida todos animais foram confinados por 105 dias com uma única dieta de alto concentrado. Utilizando as médias dos dados dos dois sistemas de recria e da fase de confinamento, o ganho em carcaça, como fração do ganho de peso vivo, quase duplicou no confinamento em relação a recria ou fase de crescimento. O rendimento de carcaça aumentou de 57% no início do confinamento para 64% ao final dos 105 dias de engorda. O enchimento do trato gastrintestinal diminuiu de 15,6 para 8,5% do peso enxuto durante o confinamento com alto concentrado.

Tanto a dieta como a maturação dos tecidos do animal são responsáveis pelas alterações. No gráfico abaixo se observa o rendimento do ganho na fase de recria e confinamento, ressaltando que o ganho em carcaça corresponde a mais que os 50% que comumente computamos.

Gráfico 1. Ganho de peso vivo e de carcaça nas fases de recria e engorda.


No exemplo que se segue é possível constatar as diferenças quanto ao custo da @ engordada, calculado de três maneiras distintas (levando em conta ou não o maior rendimento do ganho de peso): assumindo que o rendimento do ganho seja de 50%, ou seja, igual ao rendimento de carcaça comercial para bois magros no início do confinamento; considerando o rendimento do ganho igual ao rendimento final de carcaça, neste exemplo 52,5%; e finalmente levando em conta o aumento de rendimento de carcaça propiciado pela engorda, com 50% no início e 52,5% ao abate.

Dados utilizados na simulação:
– Peso vivo inicial: 360 kg (12@ com 50% de rendimento de carcaça);
– Peso vivo final: 480 kg (16,8@ com 52,5% de rendimento de carcaça);
– Ganho de peso médio diário: 1,350 kg/dia
– Dias de confinamento: 89 dias
– Custos com alimentação: R$ 222,22 (R$ 2,50/cabeça/dia x 89 dias)
– Custos operacionais: R$ 26,67 (R$ 0,30/cabeça/dia x 89 dias)

Tabela 1. Comparativo do custo de produção da @ engordada.


Fica claro que quando não consideremos o rendimento do ganho da maneira correta, o custo de produção da @ engordada pode ser até 20% maior! No exemplo em questão o rendimento do ganho de peso foi de 60% e não de 52,5 ou 50% como utilizamos em muitas situações. Para chegar no valor de 60%, basta dividir o ganho total em carcaça (4,8@ x 15 = 72 kg) pelo ganho de peso vivo total (480 – 360 = 120 kg).

O custo da @ colocada é o referencial para a atividade de engorda, principalmente para quem se utiliza do confinamento. Calculá-lo de forma correta é fundamental, pois, dependendo da maneira como chegamos ao custo, este pode inviabilizar determinado projeto ou interferir na decisão do produtor se vai confinar ou não seus animais. Para tal, devemos ter em mãos os rendimentos de carcaça inicial e final. Apesar de não ser possível obter o exato rendimento de carcaça inicial, o valor de 50% adotado comercialmente para animais machos é um bom referencial.

Se não levarmos em consideração o maior rendimento do ganho, estaremos desprezando uma das maiores vantagens da engorda em confinamento, o aumento do rendimento de carcaça.

Referência Bibliográfica

Coleman, S.W., et al. 1995. Silage or limited -fed grain growing diets for steers. I. Growth and carcass quality. J. Animal Sci. 73:2609

________________
1Doutor em Nutrição e Produção Animal, Professor do curso de Zootecnia da Universidade São Marcos.

3 Comments

  1. Janete Zerwes disse:

    Caro Rafael,

    A discussão proposta em seu artigo é muito oportuna para nós pecuaristas, que vendemos nosso gado, por @, com cálculo atrelado ao rendimento % da carcaça.

    Não temos a noção exata das perdas anuais que sofremos, com a comercialização da carne atrelada a @, e, ao cálculo efetuado pelo frigorífico em cima do rendimento percentual da carcaça.

    Sabemos de antemão, que não temos condições de acompanhar a avaliação do % de aproveitamento de carcaça durante o abate, ao passo que para a indústria frigorífica este é um procedimento de rotina.

    Está claro em seu artigo o quanto é difícil o cálculo desta fórmula.

    Acredito que para nós pecuaristas a compra e a venda por Kg de peso vivo, facilitaria os cálculos de custo benefício, de aquisição e/ou engorda, independente do sistema da mesma.

    Ao mesmo tempo, estaríamos unificando o sistema referencial de comercialização, que em alguns estados, como o RS, por exemplo, é efetuada pelo valor do Kg de peso vivo.

    Poderíamos deixar a questão da qualidade da carcaça, para ser explorada como um “plus” a ser discutido entre pecuarista e indústria.

    Abraço,

    Janete Zerwes
    Pecuária de Corte

  2. Rafael Cervieri disse:

    Prezada Janete,

    Este tema que abordei no artigo causa grande impacto não só na questão da qualidade e aproveitamento da carcaça pela indústria, mas também na eficiência econômica dos sistemas de produção. Um ponto de rendimento pode significar lucro ou prejuízo, por exemplo, na engorda confinada.

    Concordo com você que em muitas situações não temos condições de acompanhar o que realmente rendem os produtos. Outra questão relevante é a maneira como calculamos o rendimento, uma vez que este depende do jejum dos animais, raça, tipo de dieta, acabamento, etc, gerando resultando por vezes surpreendentes.

    A remuneração em função do kg vivo é adotada na Argentina como referência de comercialização e diferenciação da qualidade dos animais. Sem dúvida é um método mais simples e claro para os produtores, pois o cálculo é direto e independe do manuseio da carcaça pelo frigorífico.

    Entretanto poderiam ocorrer também algumas distorções no tocante ao jejum pré-pesagem. O principal é que haja idoneidade e confiança entre produtor e indústria, seja qual for o referencial de remuneração.

    Acredito que o pagamento por qualidade de carcaça (a chamada classificação), o “plus” que você comentou, é um caminho irreversível e necessário para nossa pecuária, independente do sistema de pagamento, kg vivo ou rendimento.

    Abraço,

    Rafael Cervieri

  3. Janete Zerwes disse:

    Caro Rafael,

    Volto a comentar seu artigo, sobre outro enfoque: a necessidade de ampliarmos as unidades de confinamento no estado de Mato Grosso, como mecanismo de aumento de eficiência na produção de carne para o sistema como um todo.

    Estamos as vésperas do ENIPEC – Encontro Internacional dos Negócios da Pecuária, de 7 a 12 de maio, aqui em Cuiabá, boa oportunidade para troca de idéias entre produtores, e o reforço sobre a necessidade de especializações nas diferentes fases da produção animal, cria, recria e acabamento/engorda.

    Seus cálculos corroboram a importância de avaliarmos as vantagens de acabamento/ confinamento/ semi confinamento, dentro das fazendas, e a qualidade de carcaças resultantes desses acabamentos.

    Penso que teríamos maior rentabilidade se criássemos alianças mercadológicas entre confinadores e criadores, disponibilizando pastos para cria e recria (quiçá a recria desapareça), e aumentando a velocidade de giro do capital.

    Seu artigo reforça nossos argumentos neste sentido.

    Obrigada,

    Janete Zerwes

    Coordenação em Tecnologia e Pecuária
    Comissão de Produtoras Rurais – FAMATO – MT

    Ps.: O acabamento eficiente e a industrialização no estado de origem da produção, facilitam a regionalização e certificação do produto, resguardando-nos dos embargos generalizados, provocados por problemas de sanidade animal.

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