Fechamento 12:16 – 07/11/01
7 de novembro de 2001
Panorama de mercado de carnes na Argentina reflete crise do setor
9 de novembro de 2001

Qualidade da carne suína – parte 3 (final)

Bernardes1, L. A. H. & Prata2, L. F.

MEDIDAS “ON-LINE” PARA ESTIMATIVA DA QUALIDADE

Os métodos “on-line” de determinação de qualidade de carne constituem o grande alvo das pesquisas na área. Há alguns anos, diversos equipamentos para medição “on-line” de características de composição de carcaça têm sido usados na tipificação eletrônica e objetiva na linha de produção. O propósito tem sido estabelecer pagamento diferenciado ao produtor, bem como monitorar os ganhos genéticos em termos de rendimento de carne magra, espessura de toucinho e avaliar indiretamente os planos de manejo e nutrição utilizados nas granjas, visando otimizar a manifestação do potencial de crescimento dos animais.

Atualmente, as sondas de tipificação eletrônica disponíveis mais conhecidas são a “Fat-O-Meater”, a “Hennessy Grading” e a “Destron”, de tecnologias dinamarquesa, neozelandesa e canadense respectivamente. Essas sondas são automáticas e medem também a espessura do músculo Longissimus e fornecem assim uma medida mais precisa do conteúdo de carne magra na carcaça. Elas operam utilizando luz refletida para detectar a interface entre gordura e músculo quando a ponteira da sonda é inserida de forma a atravessar a parede da carcaça ou simplesmente empurrada contra ela, o que varia de acordo com o equipamento utilizado.

A gordura e o músculo possuem cores diferentes e, portanto, refletem a luz de forma distinta, possibilitando a detecção da interface entre um tecido e outro. A luz é gerada por um diodo emissor de luz e detectada por um sensor adjacente, que registra o perfil de luz refletida versus a distância do ponto de inserção na face externa da carcaça. O local de medida é padronizado e definido geralmente como entre a terceira e quarta últimas costelas ou na direção da última costela, a 6-8cm da linha média da carcaça.

Dessa forma, como essas sondas medem a luz refletida, além das características de composição de carcaça, elas fornecem também uma medida de reflectância da carne, ou seja, uma variável ligada à qualidade (cor). Operam de forma similar a outro instrumento mais especializado, conhecido como “Fibre Optic Probe (FOP)”, que emite luz para o interior da carne através de fibras ópticas localizadas em um pequeno orifício na extremidade da sonda. A luz refletida é então captada por um sensor, também através de fibras ópticas. A FOP foi especialmente desenvolvida para detecção da condição PSE, e mede a cor profunda do músculo, sendo que seu foto-detector é sensível ao infravermelho, mas não à luz visível, e o comprimento de onda da luz emitida (aproximadamente 900nm) foi escolhido para minimizar os erros causados pela absorção de luz pelos pigmentos naturais da carne.

Outro instrumento canadense, o “Colormet”, é capaz de determinar simultaneamente medidas de reflectância superficial e profunda no músculo.

Uma consideração importante com relação ao uso de sondas de determinação de reflectância relaciona-se ao momento das leituras. Da mesma forma como para determinação objetiva ou subjetiva de cor, o ideal é que as medidas de reflectância sejam tomadas após definidas as transformações do músculo em carne e a qualidade final da carne, ou seja, cerca de 24 horas post-mortem. Medidas feitas aos 45 minutos pós-abate seriam capazes de detectar, com pequenos erros, apenas a condição PSE extrema, caso contrário, consegue-se somente uma indicação, sujeita a erros maiores, do potencial de qualidade da amostra analisada. As correlações dos resultados obtidos por sondas óticas/eletrônicas com avaliações subjetivas de cor são sempre melhores quando as medidas são feitas às 24 horas post-mortem. Outros fatores que interferem na determinação instrumental de cor, como o marmoreio, a seleção e preparação das amostras, podem afetar da mesma maneira as medidas de reflectância.

Os músculos também apresentam características elétricas, tais como capacitância e condutividade, as quais mudam com o tempo pós-abate. Vários equipamentos têm sido desenvolvidos para explorar essas propriedades e suas variações em carnes de diferentes qualidades, possibilitando assim a detecção das condições PSE ou DFD. Entre eles existem o “Pork Quality Meter (PQM)” e o “MS-Tester”, que são utilizados principalmente em pesquisas, apesar de sua resistência mecânica e facilidade de uso. Alguns estudos, porém, têm demostrado baixa eficiência e fracas correlações desses instrumentos com outros mais consagrados. O PQM, apesar disso, apresenta a vantagem de que medidas feitas aos 45 minutos post-mortem são aparentemente semelhantes a aquelas determinadas várias horas pós-abate.

AVALIAÇÕES SUBJETIVAS DE COR E ESTRUTURA DE SUPERFÍCIE

Existem vários padrões internacionais de avaliação de cor e estrutura de carne suína, que trabalham com escalas de 1-5 ou 1-6, variando de extremamente pálida, flácida e exsudativa até extremamente escura, firme e seca. Como exemplos existem os padrões da “National Pork Producers Council” (EUA), do Ministério da Agricultura do Canadá e o “Japanese Pork Color Standards” (Japão). Certas escalas preferem considerar apenas a cor da carne, enquanto outras já associam a cor à estrutura (firmeza e teor de exsudação).

A avaliação subjetiva de cor e estrutura de superfície sofre interferência dos mesmos fatores levantados para a determinação objetiva. Recomenda-se que a intensidade de luz incidente sobre a carne a ser avaliada esteja entre 800 e 1600lux, utilizando-se luz branca fria.

Uma dificuldade significativa relacionada à avaliação da estrutura é que os padrões procuram separar os grupos de qualidade de acordo com sua firmeza (flacidez) e exsudação. Entretanto, carnes PSE podem apresentar estrutura de superfície nem flácida, nem exsudativa. Flacidez é característica integrante da condição PSE, mas outros fatores podem ajudar no seu desenvolvimento, como a retirada do tecido conjuntivo sobre o LD. A flacidez também aumenta ao longo do eixo do músculo LD. Em outros casos, a superfície parece exsudativa como se os limites das fibras estivessem menos aderidos uns aos outros. Enfim, a análise subjetiva da estrutura de superfície em especial, mas também a da cor, exige muito treinamento antes de ser posta em prática como fator determinante na classificação qualitativa da carne suína.

Muitos trabalhos, entretanto, têm apresentado boas correlações entre avaliações subjetivas de cor e outros métodos “on-line” de determinação de qualidade, inclusive o pH, o que representa uma oportunidade para empresas de pequeno porte, que dispõem de menos recursos para investimentos, mas precisam manter os mesmos padrões de qualidade das grandes industrias.

Finalmente, uma observação importante é que os vários músculos da carcaça suína apresentam diferenças no grau de contração e no tipo de fibra que os compõem. Com isso, são diferentes o padrão de queda do pH e, consequentemente, as propriedades de cor e CRA, o que deve ser levado em consideração na rotina de análise de qualidade de carne. As fibras vermelhas (oxidativas), presentes especialmente nos músculos da paleta, tendem a apresentar o pH mais alto; enquanto as fibras brancas (glicolíticas) e intermediárias, predominantes no lombo e no pernil, mostram um pH menor. Essas características são, portanto, relevantes quanto à susceptibilidade dos diferentes músculos à formação das condições PSE e DFD. Tem-se que os músculos do lombo e pernil são mais predispostos à condição PSE, enquanto que os músculos da paleta apresentam mais a condição DFD.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cabe à indústria determinar a sua necessidade e selecionar os procedimentos de análise de qualidade de carne mais adequados aos seus objetivos, após uma rigorosa análise da relação custo/benefício. O importante é que a monitoria de qualidade seja empregada como rotina, pois razões para exercê-la são muitas e justificáveis: seleção de animais produtores de carne de melhor qualidade, pagamento diferenciado aos produtores (como forma de estimular a produção de animais melhores), identificação de problemas nos processamentos e nos lotes abatidos para posterior gerenciamento dos mesmos, maximização no aproveitamento e destino das carcaças, diminuição de perdas, melhoria nas características sensoriais dos produtos, busca pela uniformização de carcaças, cortes e produtos cárneos (desejável em termos de incremento de produção e mercado) e, finalmente, para fins de pesquisa e retorno de informações aos produtores, para que toda a cadeia trabalhe em conjunto visando atender aos anseios do consumidor.

Não há mais espaço para os produtores e as indústrias trabalharem da forma que julgam melhor para eles mesmos. O consumidor é quem deve ser o fator determinante do que ser produzido e de como fazê-lo.

Vale lembrar que outras características de qualidade têm sido amplamente valorizadas nos dias de hoje, como inocuidade e ausência de contaminação microbiológica, por resíduos tóxicos ou produtos químicos, fatores relacionados à segurança alimentar. Além disso, têm grande importância atualmente o bem-estar animal e a sustentabilidade da produção, incluindo o controle ou a eliminação da agressão ao meio ambiente, o que em muitos lugares já é questão imposta pela própria natureza.

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1 Médico Veterinário, bolsista da FAPESP e mestrando na área de Medicina Veterinária Preventiva da FCAVJ/UNESP

2 Professor Doutor do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Reprodução Animal da FCAVJ/UNESP e orientador

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