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Qual o futuro da pecuária de corte no sul do Brasil?

Por Miguel Cavalcanti, CEO do BeefPoint

A pecuária do sul do Brasil é única e especial. Tem muitas oportunidades, em especial num mercado que demanda cada vez mais qualidade. Outro ponto forte é a tradição, a cultura e história. Quem faz pecuária no sul do Brasil tem mais do que um negócio, tem uma paixão e um grande orgulho pelo que faz. E eu admiro muito tudo isso.

Precisamos pensar que a pecuária do sul é diferente. Uma pecuária única, especial e com grande potencial. O foco dessa pecuária já é e deve ser cada vez mais a qualidade, a diferenciação, a agregação de valor.

No varejo, o preço do frango é mais baixo do que o do boi. E vai continuar sendo. E a pecuária vai ganhar quando trabalhar mais e mais para vender bem, mesmo com o preço mais alto. A pecuária do sul tem a mesma relação com a pecuária do centro-oeste do Brasil. O custo e o preço são mais altos, mas pode-se ganhar mercado com foco na qualidade e no fazer diferente.

Não vamos ganhar do frango tentando fazer um boi parecido com o frango. Vamos ganhar quando o fizermos cada vez mais diferente. Do mesmo modo com a pecuária do sul. Precisamos trabalhar o diferente, o especial, o  único.

Me lembro de ir num ótimo supermercado em Porto Alegre, RS e ver uma incrível gôndola de carne bovina. Enorme, bonita, com várias opções de preços, raças, selos e países. E também vi que a carne mais barata, a carne em promoção, eram cortes “importados” de outras regiões do Brasil.

Achei curioso e fui olhar de perto. No anúncio estava claro que era uma carne “de fora” e pelo visual era fácil de ver que era uma carne diferente. O corte de costela era muito menos “carnuda”, fiquei com a impressão de que não dava mesmo para vender duas costelas tão diferentes por um preço igual.

Para que a pecuária do sul tenha sucesso, vai ser preciso buscar inovação, qualidade, marketing e também a valorização da cultura, tradição e emoção.

Por exemplo, conheci em Porto Alegre uma lanchonete de hambuguers chamada Pampa Burguer. O posicionamento é produto de qualidade, com preço justo. Hamburguer assado na brasa. E o mais interessante, toda a comunicação, todo o visual remete as tradições gaúchas. Os nomes dos lanches são todos homenagens a cultura e história do RS. Achei muito bacana, gostei muito da comida e percebi que esse é um dos caminhos: juntar o que é moderno (lanches) com a tradição (imagine um lanche chamado “Galo Véio”). O slogan da marca é claro: “tradição no meio do pão”.

A qualidade, os produtos especiais são o ponto chave do sucesso da pecuária do sul, hoje e amanhã. O trabalho por exemplo que a churrascaria Vermelho Grill vem fazendo, de oferecer carne de alta qualidade num ambiente muito agradável. Cada vez mais vamos vender uma experiência de consumo, vamos comprar sensações, e momentos agradáveis.

Quando falamos de experiência, precisamos trabalhar duas frentes.

A primeira é a qualidade sensorial do produto. Sabor, maciez, coloração e textura. E também ensinar o consumidor a preparar o produto. Ou você tem alguma dúvida de quem vai ser a culpa (na cabeça do consumidor) se o prato ou o assado não ficarem bons?

A segunda é trabalhar a história. Isso inclui tradição e cultura. Temos que contar mais nossas histórias, celebrar nossos heróis da pecuária do passado. Precisamos comemorar quem faz um bom trabalho hoje. E também pensar no sistema de produção, em ser capaz de contar como e onde foi produzido.

Isso tudo é muito interessante e temos bons exemplos, de sucesso, no agro do sul do Brasil. O vinho gaúcho vem ganhando cada vez mais espaço, num mercado extremamente concorrido e que já tem inúmeros “players” fortes e atuando há anos. Outro exemplo são as cachaças gaúchas. Na Expointer do ano passado, pude conhecer e provar várias marcas, com qualidade e também apresentação de primeira. A embalagem, rótulo, material promocional, tudo era muito bonito. Parecia que o objetivo era concorrer com o uísque e não com a pinga.

E por último, o exemplo que considero mais inusitado. Os deliciosos e tradicionais doces de Pelotas. Imagine comer um doce de ovos de excelente qualidade, sabor incrível (meu favorito é o ninho) e olhar na embalagem e ter o endereço do site da associação e um número de rastreabilidade. Sim, em cada docinho tem escrito o número da rastreabilidade, onde você pode checar data de produção, remessa, etc.

Quando vi isso, reforcei ainda mais minha certeza de que o agro brasileiro tem muita coisa boa para mostrar, porém o que aparece mais ainda são as notícias ruins. Isso reforça o propósito do BeefPoint de promover o melhor da pecuária, de mostrar quem faz hoje a pecuária do futuro.

Outro exemplo interessante, é do nosso vizinho Uruguai. Um país pequeno, de tamanho similar ao do RS, que mesmo com poucos recursos, vem fazendo um trabalho primoroso em qualidade e promoção da sua carne bovina. Promovem muito bem suas qualidades, seus diferenciais, ou seja, divulgam aquilo que os torna diferentes. E também tem um trabalho exemplar de estratégia, planejamento e visão de longo prazo.

Para pensar longe, para construir o futuro, precisamos pensar em nossas lideranças. Fica aqui o desafio para você pensar quem são as novas lideranças do agro, no sul e no Brasil como um todo. Quem é a nova geração? Quem são as lideranças com menos de 40 anos?

O sucesso futuro não acontece por acaso. O futuro não é o que fazemos amanhã, mas aquilo que fazemos hoje. Vejo um cenário atual e futuro muito promissor para a pecuária do sul. As oportunidades estão aí, mas para colher, precisamos plantar. Precisamos trabalhar muito, muito mesmo, para conquistar esse lugar que é nosso, mas não será entregue de graça, sem esforço, suor e até algumas derrotas. Vamos em frente?

Fica a pergunta: O que você está fazendo para aproveitar as oportunidades únicas que a pecuária do sul do Brasil tem?

15 Comments

  1. Fernando Gebara Cunha disse:

    De acordo, a pecuária gaúcha encanta, nao só pela qualidade, como pela tradição, características que devem ser valorizadas como diferenciais…o espirito Gaucho de ser, como e o modelo argentino, uruguaio, texano, enfim, a verdadeira identidade e orgulho do produto/produtor rural. Parabéns pela matéria.

  2. Flauri Ademir Migliavacca disse:

    Muito bom e espetacular momento para este seu comentário Cavalcanti.
    As carnes bovinas aqui do sul são inigualáveis, estas cruzas européias e esta adaptação aos “pampas”, fazem sim toda a diferença de qualidade.
    Que bom tocastes no ponto crítico sobre a sucessão do AGRONEGÓCIO, é uma loucura o que estamos deixando nossos filhos desfazerem negócios tradicionais que vem de gerações e gerações, com domínio do negócio.
    Esta nova geração tem realmente que assumir a postura do Avô e dos pais, e tocar o negócio pra frente com afinco, com desprendimento.
    Visitar propriedades novas, novos empreendimentos e implantar estas tecnologias que estão já muito bem inseridas em algumas propriedades. Precisamos fazer com que 100% adote esta vanguarda.
    Parabéns pelo texto e mais ainda, pela força que vc está dando aos Sulistas, principalmente Gaúchos.

  3. Paulo Costa Ebbesen disse:

    Prezado Miguel, bom dia.
    Excelente artigo. Hoje a FIERGS vem trabalhando fortemente o tema “Inovação”, inclusive com campanhas na mídia, mostrando que as empresas que mais crescem são aquelas que investem em inovação.
    Acho que este é o caminho para a pecuária do RGS – INOVAÇÃO. Fazer o mesmo e da mesma forma que nossos antepassados faziam não traz perspectiva de sucesso. A cultura e a tradição devem ser mantidas. Mas a forma de produzir, comercializar, vender, fazer marketing, etc. devem ser inovadoras, com abordagens diferentes das que vemos atualmente.
    Um grande abraço
    Paulo Costa Ebbesen

  4. Múcio Paixão de Araújo disse:

    Parabéns pela visão ampla e clara !

  5. Felipe Pohl de Souza disse:

    Caro Miguel,

    Muito oportuno seu comentário, lembro apenas que o sul não é apenas o Rio Grande, mas também Sta. Catarina e Paraná, que também tem suas tradições e peculiaridades. No Paraná não há outra alternativa para a pecuária de corte, que não seja investir na qualidade e na agregação de valor do produto.
    Se somarmos os rebanhos destes três Estados, temos quase o rebanho argentino ou australiano e um enorme potencial de sermos uma referencia mundial em qualidade de carne, o que pode inclusive permitir ao Brasil disputar mercados mais nobres e deixar de brigar com a Índia!
    Um abraço e parabéns pela sia visão de futuro.

  6. Reginaldo disse:

    Miguel, estou preocupado com espaço que a pecuária está perdendo no PR. Estou fazendo um projeto de pesquisa para Doutorado em Desenvolvimento Regional. O meu foco é a preocupação da cadeia produtiva da carne estar perdendo espaço para a cana.

  7. Pascoal disse:

    Não podemos perder as oportunidades.
    No Paraná temos exemplos claros da preocupação dos produtores, é a formação de cooperativas de produtores de carne, preocupados e colocar produtos com qualidade e regularidade no mercado e agrengando valor.

  8. Marcelo Selistre disse:

    Parabéns pelo artigo, realmente a pecuária precisa de diferenciação para ter crescimento e sucesso e ser competitiva com outras atividades agropecuárias.
    O uso crescente de genética taurina no Brasil todo, como podemos verificar nos relatórios da ASBIA, vão agregar muito em qualidade de carne. É preciso uma maior valorização deste excelente produto, o boi cruzado, que aparece mais e mais a cada dia. Aí está uma oportunidade de melhora na pecuária.

  9. Octaviano Pereira Neto disse:

    A questão regional é mais profunda que designação regional, mas sim vem ao encontro dos projetos de denominação de origem, os quais segregam produtos segundo sua área de produção, transcendendo conceitos épicos e pouco alicerçados em dados e os coloca em termos de características edafoclimáticas e raciais, os quais de fato impactam no resultado final obtido.
    Embora muito bem demarcada a importância de dar valor ao que se tem, não devemoscair no ufanismo do “sucesso pronto”. Nas regiões mencionadas, há grandes e renomados expoentes da pecuária e também diversos casos de gado de qualidade bastente medíocre, como seria de se esperar em uma distribuição normal dentro de uma população (Curva de Gauss). Há que se separar o “joio do trigo” e buscar mercados para ambos.
    Programas de melhoramento e seleção são primordiais para alcançar a diferenciação de fato, associados à campanhas sérias e “sem donos” de marketing que promovam as qualidade e benéces de consumir a carne de uma determinada região.
    Creio já percorremos um bom caminho e outro tanto há que se galgar e tenho convicção que a discussão profissional dentro do segmento seja a base para tornar este “sonho” uma realidade, desprovida de paixões e calcada em resultados objetivos que demonstrem a qualidade do produto final, razão da agregação e reconhecimento de um valor diferenciado.
    Um cordial abraço a todos.

  10. Cesar G Galli disse:

    Eles sao de ponta mesmo. Sou Paulista de Barretos , Ribeirao Preto e frequentei a regiao quando em compra de touros Brangus (GAP) para trazer aqui para Mato Grosso . É outro mundo, fiquei maravilahado com os fazendeiros, a mao de obra entao…minha nossa, só as fazendas que nao gostei muito por terem solo muito razo, mas eles sabem produzir muito bem nestes locais. Me deu vontade de me mudar para lá, mas odeio o frio.

  11. Rogério Zart disse:

    Ótima avaliação, amigo Miguel, lúcida, pertinente, e correta.

  12. Jose Moglia disse:

    Parabéns Pelo Artigo Miguel.
    Porém a pecuária do RGS está seriamente ameaçada pelo avanço da soja, que em termos de rentabilidade dá de 10 a 0 na pecuária e pelo Monopólio dos frigorificos que pagam praticamente a mesma coisa do que pagam no restante do país, não bonificando a qualidade da carne mas fazendo-se beneficiar da mesma.

  13. Adilson Jorge Souza Poltroniere disse:

    Parabéns pelo artigo. Penso que sua reflexão sobre o futuro promissor da pecuária do sul bem que se aplica também a do Norte, com algumas ressalvas, é claro. Aliás, por que o senhor não aproveita e escreve um texto sobre suas impressões relativas à pecuária daquela região. Fica a sugestão. Forte abraço

  14. Paulo Araripe disse:

    Miguel, parabéns pela exposição de sua opinião sobre a pecuária do sul do Brasil. Muito pertinente você tocar neste assunto justamente em um período em que a pecuária brasileira está buscando qualidade aliada a produtividade. Em nosso país, se tem um lugar onde a mais alta qualidade da carne de bovinos é coisa comum, esse lugar se chama Rio Grande do Sul. Muito boas suas observações. Fiquei feliz em lê-la, já que invisto na pecuária gaúcha há mais de 3 anos e sei onde isso pode chegar. Que bom que pensa assim, pois minha opinião sobre a pecuária do sul é muito semelhante. Tenho escritório em Santa Maria/RS e estamos pensando em ampliar nossas ações para Alegrete/RS também por apostar naquele povo, suas tradições e no potencial forrageiro e pecuário que o estado tem. Abraço!

  15. Egon Valter Schwerz disse:

    No nosso país contimental temos climas literalmente diferentes. O frio com a geada e inverno no Sul e a seca com até um calorzinho no Centro Oeste. Logo por mais óbvio que parece são situações diferentes e necessáriamente de criações igualmente diferentes. Raças taurinas no sul e indianas no centro oeste, podendo eventualmente existir as híbridas em ambos lugares, dificeis de mantê-las na sua caracterização de padrão de carcaças. A tradição da pecuária sulina já é secular, são gerações que vem trabalhando com gado de corte. A história do centro oeste é recente e teve a sua grande força no gado nelore (rústico por excelência, até então) e nas forrageiras notadamente nas brachiaras de fácil implantação e resistentes. Afirmo então que nestes aspectos não dá para comparar, ou seja o que serve para um não serve ao outro pecuarista. É distinto. Agora associação, união, programas de trabalhos em conjunto poderão ser exemplos gratificantes a ambos, e neste aspecto o teu artigo, nobre amigo Miguel, traz valores importantes a serem analisados. Parabéns.

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