Pecuária de corte desafia a crise e mantém crescimento
17 de setembro de 2015
PIB do agronegócio se recuperou em junho com crescimento de 0,99%
17 de setembro de 2015

Por que as pessoas têm tanto medo dos OGMs? Veja a opinião de um especialista

AP Photo/Darko Vojinovic

Quando a rede americana de alimentos, Chipotle, anunciou no começo desse ano que não serviria mais alimentos feitos com organismos geneticamente modificados (OGMs) devido a preocupações com a segurança, os clientes se alegraram, mas havia um grande problema: quanto mais cresce a desconfiança dos americanos com relação aos OGMs, mais a comunidade científica está se movendo na direção oposta. Há agora quase uma unanimidade entre os cientistas de que os OGMs são seguros para o consumo. A Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA), a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Associação Médica Americana (AMA) disseram que os OGMs são seguros para o consumo.

No entanto, a divergência entre os cientistas e o público dos Estados Unidos somente cresce. Por exemplo, em uma pesquisa recente, 60% dos americanos disseram que acreditam que os OGMs são “inseguros de forma geral”. No ano 2000, a população se dividia quase que igualmente com relação a isso.

AP Photo/Darko Vojinovic

AP Foto/Darko Vojinovic

 

Há muitas razões para isso, disse o economista agrícola da Universidade do Estado de Oklahoma, Jayson Lusk, que vem estudando a aversão das pessoas aos OGMs desde que eles foram lançados no final dos anos noventa. Lusk compara essa divisão à divergência que existia entre a comunidade científica e o público geral sobre mudança climática, mas alerta que pode ser difícil mudar a mente das pessoas com relação à biotecnologia.

O repórter do Wonkblog, do The Washington Post, Roberto A. Ferdman, entrevistou Lusk para entender porque as pessoas têm tanto medo dos OGMs, porque ele acredita que elas não deveriam ter e o que é necessário para dissipar esse medo.

JaysonLusk400

Jayson Lusk. Foto: http://www.ales.ualberta.ca.

 

Vamos direto ao coração da questão. Quando começou todo esse papo dos aspectos positivos e negativos dos OGMs?

O tema vem sendo discutido há muitos anos. Houve um pouco de interesse quando as primeiras culturas biotecnológicas chegaram ao mercado no final dos anos 90, e houve grupos, é claro, que se opunham a elas, mas em geral, não era uma maioria significativa de pessoas.

O que trouxe isso para a atenção de todos, fracamente, foram os vendedores de muitos alimentos naturais e produtos orgânicos. Não quero dizer que eles estavam alimentando o medo das pessoas, mas acabaram fazendo isso, pelo menos a uma extensão que ajudava nas vendas de seus próprios produtos. Então, foi feita publicidade e essa promovia os produtos como não contendo OGMs, o que aumentou a conscientização dos consumidores.

E vocês acompanharam o sentimento dos consumidores, certo?

Conduzi uma pesquisa mensal por dois anos, até agora, que acompanha a conscientização e a preocupação das pessoas para diferentes questões alimentares. E, sim, uma das preocupações que acompanhamos foi a biotecnologia e os OGMs. Então, por pelo menos dois anos, acompanhei mensalmente o medo e o conhecimento.

E o que isso mostrou?

A sensação geral é que existem altos e baixos sobre como as pessoas sentem, mas eles não são tão perceptíveis ou significativos como a maioria das pessoas pensa. Nós perguntamos às pessoas se já ouviram falar sobre OGMs nas últimas semanas e, então, perguntamos o quão preocupadas elas estão com relação aos OGMs agora. As respostas variam um pouco. Às vezes, as visões são mais negativas, especialmente se há alguma forma de notícia negativa sobre os OGMs, mas geralmente, elas não mudam muito. Quero dizer, as pessoas certamente não estão se sentindo melhor sobre os OGMs, mas sua aversão está estável. 

O que exatamente têm os OGMs que as pessoas estão com tanto medo?

A maioria das pessoas não tem muito conhecimento sobre os OGMs. Uma pessoa média não gasta muito tempo pensando sobre isso. No entanto, se ela visse informações sobre eles no rótulo, provavelmente teria aversão a eles. É algo que parece um pouco não natural, e há uma tendência psicológica de desejar naturalidade nos alimentos e evitar algumas formas de novidade em alimentos. Isso joga com um viés psicológico que temos contra eles.

Então, não necessariamente as pessoas têm uma aversão inata e forte aos OGMs, per se, mas elas têm uma reação negativa a algo que parece um aditivo ou incomum.

Então, as pessoas não são necessariamente contrárias aos OGMs especificamente?

Na verdade, não. Quero dizer, elas são, mas é parte de uma aversão mais geral à biotecnologia, a coisas que as pessoas não entendem.

De muitas maneiras, acho que é semelhante a qualquer coisa que aparece com um rótulo que diz “pode conter X”, onde X é literalmente algo que as pessoas nunca ouviram falar ou não entendem e, por causa disso, soa como algo estranho.

Nós testamos isso com um rótulo em maçãs que dizia: “essa maçã é amadurecida usando etileno”, que é um processo muito comumente usado e seguro, mas as pessoas tiveram aversão a essas maçãs assim como têm aos OGMs, simplesmente porque não sabem o que é etileno.

As pessoas realmente não diferenciam um lote inteiro entre essas coisas. Elas são apenas não familiares, coisas que soam assustadoras sobre o alimento.

O que você acha sobre a rotulagem dos OGMs?

Se houvesse algum risco demonstrável para a saúde ou a segurança, acho que seria, sem dúvida, uma obrigação. Isso é verdadeiro para, digamos, amendoim, porque muitas pessoas são alérgicas. Isso também é verdadeiro para rótulos nutricionais, porque sabemos que o número de calorias e outros nutrientes que você consome tem relação direta com a sua saúde. Essas são razões legítimas para rotular os alimentos. Mas como a comunidade científica está mais ou menos de acordo que as culturas de OGMs não são mais prejudiciais do que as tradicionais, fica menos claro qual o propósito dos benefícios da rotulagem.

Minha aversão é essa. Se não há riscos para a saúde associados com as culturas de OGMs, então, por que forçar uma rotulagem obrigatória?

Agora, rotulagens voluntárias são outra coisa. Há todo tipo de rotulagens voluntárias por aí. Há muitas coisas com as quais as pessoas se preocupam individualmente e estão dispostas a pagar mais por isso. Há um mercado muito saudável para produtos voluntariamente sem OGMs e eu não vejo nada de errado com isso. Isso não quer dizer que não veja abusos da confiança das pessoas. Já vi sal rotulado como não contendo OGMs, quando o sal, por definição, não pode ser geneticamente modificado, uma vez que é um mineral e não contém DNA.

No final do dia, acho que vejo valor em ambos os argumentos, mas tendo a ficar do lado dos que são contra a rotulagem, porque acho que os custos são provavelmente maiores.

Okay, vamos falar sobre o futuro agora. Você diria que alcançamos o pico da aversão aos OGMs?

Sabe, eu realmente não tenho ideia. Essas coisas são realmente difíceis de prever, muito mais difíceis do que as pessoas pensam.

Vamos supor que você tenha tido um grande susto realmente com relação à segurança alimentar, que tenha tocado em culturas OGMs, ainda que tangencialmente. Isso influenciaria opiniões de forma incrivelmente rápidas. Agora, isso não parece que vai acontecer e eu certamente não acho que acontecerá, mas não está fora de cogitação.

Um outro caminho que poderia ocorrer, entretanto, é que alguém lance uma cultura biotecnológica que capture a imaginação do público, mas não o assuste. Dessa forma, as pessoas se aproximariam de uma cultura de OGMs mais acessível e, ao fazer isso, tornar-se-iam menos sensíveis à bizarrice ou à estranheza referente às culturas de OGMs que sentiam antes.

Um exemplo perfeito disso é a nova maçã Ártico, que não fica marrom quando cortada, especialmente se não for feita por algum gigante agrícola, como a Monsanto.

Mas as pessoas podem também apenas perceber que a maioria dos queijos que comem é feita de enzimas que são geneticamente modificadas. Os diabéticos, também, usam insulina que é feita de bactérias ou leveduras geneticamente modificados.

Então, você acha que as pessoas têm menos chances de acreditar nas culturas com OGMs se essas forem feitas por grandes companhias?

Definitivamente. Uma das maiores preocupações das pessoas é que temos essas grandes companhias agroquímicas se beneficiando dessa tecnologia. Isso as beneficia, por exemplo, permitindo que vendam mais sementes ou herbicidas.

O que as pessoas não sabem é que algumas dessas culturas estão agora sendo produzidas por organizações sem fins lucrativos e universidades, e que essas culturas realmente reduziriam a necessidade de uso de químicos ou fertilizantes. Algumas delas eliminam a necessidade de pesticidas e herbicidas de vez.

Você pode pensar em outras formas de tecnologia que superaram os medos dos consumidores?

Um exemplo perfeito é a pasteurização do leite. No mínimo, isso era muito estranho para as pessoas e ninguém sabia o que pensar sobre isso, mas hoje, é amplamente aceito e visto como um processo que melhora a segurança do leite.

Outro exemplo é o micro-ondas. Todo mundo tem um desses em casa hoje em dia, mas nos anos setenta, esse número era quase zero. Demorou um pouco para as pessoas adotarem esse sistema.

Mas então há coisas como irradiação de alimentos que são perfeitamente seguras, mas as pessoas parecem estar permanentemente céticas com relação a elas.

Por que as pessoas aceitam certas coisas, mas outras não?

Uma das teorias sobre porque as pessoas respondem a riscos é que seu nível de percepção de riscos depende do quão familiar algo é para elas. Em geral, as coisas que são menos familiares serão percebidas como de maior risco. A outra coisa é o controle. Quando acreditamos que temos mais controle sobre algo, tendemos a ver isso como sendo de menor risco. Então, se você une essas duas coisas, aquilo sobre o que temos pouco controle e que não são familiares parecerão extremamente arriscado para as pessoas, mesmo que não deva parecer.

O que é interessante é que isso é o que na verdade pode ser citado como uma razão para rotular os produtos com OGMs. Dessa forma, as pessoas podem sentir como se tivessem mais controle, que podem evitá-los se quiserem e, dessa forma, passem a vê-los como de menor risco.

De qualquer forma, essa é uma coisa muito subjetiva. Se as pessoas fossem objetivas com relação aos riscos, estariam muito mais preocupadas com os carros, que matam mais pessoas por ano do que qualquer outra coisa, mas elas não estão.

Então, você não pode apostar se as pessoas acabarão aceitando os OGMs?

Eu não sei o que realmente vai acontecer, mas posso lhe dizer o que espero que aconteça. Espero que as pessoas sejam um pouco mais otimistas e um pouco mais positivas em sua visão sobre a biotecnologia. Tenho um livro que sairá no ano que vem chamado “Unnaturally Delicious”, que avalia todos os diferentes tipos de inovações no mundo dos alimentos. Estou muito animado com os avanços nesse espaço.

Em geral, eu gostaria de elevar a conversa sobre os OGMs além do que é feito atualmente. A verdade é que muitas das preocupações que as pessoas têm com os OGMs, especialmente aquelas relacionadas ao uso de pesticidas e herbicidas, definharão. A tecnologia que temos desenvolvido não requererá seu uso.

Não estou dizendo que devemos adotar tudo, quer queira, quer não. É muito importante não introduzirmos novos alergênicos no sistema de alimentos. Como a tecnologia nos permite muitas coisas, inevitavelmente haverá muitas coisas que simplesmente não podemos aprovar, e não devemos.

O que acho reconfortante sobre a discussão é que parece ser algo análogo à discussão sobre mudança climática. No início, todos os veículos de mídia tinham posição em todos os lugares. Mas conforme foi formado um consenso científico, houve muito mais acordo sobre o que a ciência diz.

Por Roberto A. Ferdman, para o Wonkblog, do The Washington Post.

Os comentários estão encerrados.

plugins premium WordPress