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1 de dezembro de 2009

Os novos desafios da cadeia produtiva da carne frente à crise econômica

É próprio da economia de mercado que haja flutuações cíclicas de curto e de longo prazo nos preços dos produtos e serviços e na rentabilidade dos agentes econômicos. Em períodos de crise como a atual, essas oscilações normais dos mercados tornam-se acentuadas por variáveis macroeconômicas e se resumem em drástica redução da demanda agregada por conta da absoluta crise de confiança dos agentes econômicos e dos consumidores. Esses fenômenos valem, com mais forte razão, para os mercados de produtos agropecuários, e tornam-se mais agudos diante de crise de confiança pela qual atravessa a economia mundial.

É próprio da economia de mercado que haja flutuações cíclicas de curto e de longo prazo nos preços dos produtos e serviços e na rentabilidade dos agentes econômicos. Em períodos de crise como a atual, essas oscilações normais dos mercados tornam-se acentuadas por variáveis macroeconômicas e se resumem em drástica redução da demanda agregada por conta da absoluta crise de confiança dos agentes econômicos e dos consumidores.

Esses fenômenos valem, com mais forte razão, para os mercados de produtos agropecuários, e tornam-se mais agudos diante de crise de confiança pela qual atravessa a economia mundial. Suas flutuações que já são por si só “mais nervosas”, por serem intrinsecamente relacionadas às flutuações (e frustrações) da oferta, podem ser amplificadas à medida que posições são feitas nos mercados futuros de produtos agropecuários, por sua crescente exposição aos riscos dos mercados financeiros.

Além disso, associado à conjuntura descrita, os países ditos emergentes sofrem com o protecionismo agrícola dos países desenvolvidos, fator que prejudica ainda mais a rentabilidade e as cotações dos produtos agropecuários, em geral, e da carne bovina, em particular, cuja produção brasileira atingiu a cifra de 8,13 milhões de toneladas, em um processo de crescimento que permite a privilegiada posição do Brasil como segundo produtor e primeiro exportador mundial dessa commodity.

Em levantamento recente, realizado com o apoio da FAPESP, o Instituto de Zootecnia, em conjunto com os Institutos de Economia Agrícola e Agronômico, foi detectado que a pesquisa científica e tecnológica voltada para a cadeia da carne defronta-se com desafios muito significativos para que o elo fraco “pecuarista” possa se tornar mais rentável.

Nos seis itens pesquisados junto a agentes-chave da cadeia que constituíram o projeto (macroeconomia, microeconomia, tendências de mercado, mudanças climáticas, tecnologias ambientais e da fronteira do conhecimento e políticas públicas), a pesquisa apontou para a importância da execução de estudos e pesquisas econômicas, a partir da disponibilidade de um conjunto bem articulado de estatísticas, que tornem disponíveis os enfoques regionais e/ou setoriais (sobretudo no que se refere à articulação da cadeia), de geração de renda e de estrutura da demanda, para que os passos relacionados à definição das demandas tecnológicas sejam mais bem contemplados.

A pesquisa desses institutos detectou ainda como parâmetros-chave para melhorar a remuneração do produtor, que as demandas tecnológicas sejam orientadas, em larga medida, pela questão ambiental e pela qualidade da carne bovina in natura, tanto para as exigências do mercado externo quanto para o interno, o que implica rastreabilidade, análise de pontos críticos e aplicação de requisitos de natureza étnica e religiosa. O quadro 1, conforme Sabadin (2006)1, apresenta um panorama dessas exigências, e como elas determinam a segmentação do mercado.

Quadro1. Principais exigências dos mercados externos para a compra da carne in natura brasileira

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Os resultados da pesquisa, realizada antes da atual crise econômica mundial, apontaram para uma divisão de opiniões entre agentes do mercado quanto à importância da intervenção governamental no setor da carne bovina no Brasil.

Entretanto, nos novos desafios que se antepõem ao setor da carne bovina diante da crise mundial, pode-se inferir que essa conjuntura tenha se alterado, sobretudo com as dificuldades financeiras de alguns elos da cadeia, especialmente os frigoríficos. No momento, a atuação estatal parece ser demandada de forma significativa, para que os objetivos estratégicos da cadeia sejam alcançados a longo prazo.

Assim, além do socorro emergencial aos frigoríficos, a sanidade, a geração de bancos de dados econômicos confiáveis, ou ainda a fiscalização sanitária e ambiental são atividades que desafiam tanto os agentes privados, como sobretudo o setor público, seja em áreas de pesquisa a serem contempladas, seja como serviços prestados.

No caso do Estado de São Paulo, a maioria dos animais abatidos são oriundos de outros estados, do que resulta serem necessárias pesquisas e adaptações tecnológicas de manejo para gerar ganhos compensatórios desse trânsito de animais. Além da pesquisa científica e tecnológica propulsora da esfera produtiva, coloca-se também a questão de tornar disponíveis novos produtos e processos tecnológicos, como vacinas, antígenos e genética superior, em que a pesquisa pública terá um caráter de propulsão científica de fundamental importância, inclusive no cenário nacional. Alguns dados do abate de bovinos de corte em São Paulo, para 2005, podem ser verificados na tabela 1.

Tabela 1. Abate de bovinos de corte, Estado de São Paulo, 2005

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O caráter compensatório da pesquisa no Estado de São Paulo pode ser verificado com os índices zootécnicos (reprodutivos, ponderais e de produção) ainda sofríveis do rebanho paulista, como mostra a tabela 2.

Tabela 2. Índices zootécnicos (reprodutivos, ponderais e produção), bovinocultura de corte paulista, 2005

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Em decorrência de mudanças já observadas em um curto período de 8 a 10 anos, o abate clandestino reduziu-se de forma acentuada no País, e no Estado de São Paulo pode-se afirmar que é praticamente nulo. Em 2005, já se verificava uma proporção relativa da carne bovina inspecionada no montante global brasileiro significativamente maior em relação à mesma proporção de carne bovina total (16,7% versus 11,4%), comprovando que praticamente toda a carne bovina produzida no Estado é inspecionada. Na tabela 3 podem ser comparadas as Regiões Sudeste, Sul e o Estado de São Paulo no período de 1997 a 2005.

Tabela 3. Produção de carne bovina inspecionada, em relação à brasileira total e inspecionada, 1997-2005

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Os progressos tecnológicos obtidos até o momento são de natureza compensatória e compõem também avanços recentes das pesquisas científicas, tendo ocorrido uma relativa convergência de padrões na cadeia produtiva (sobretudo sanitários e de processamento do produto final), facilitada, em grande parte, pela demanda mundial.

O projeto de pesquisa detectou uma agenda de esforços científicos e tecnológicos dirigidos para cadeia produtiva considerada como fundamental ao seu desenvolvimento, que inclui ações propositivas que vão desde a consideração das mudanças climáticas até a adoção da zootecnia de precisão, visando à qualidade e à rastreabilidade da produção. Grande parte dessa agenda já tem sido atendida pelos pesquisadores da área agropecuária do Estado de São Paulo. Espera-se que o cenário de crise econômica mundial não comprometa os avanços já conquistados nesse Estado e os novos caminhos a serem trilhados.

Por outro lado, os desafios ora impostos pela crise dizem respeito a como aumentar a eficiência entre os elos da cadeia, de modo a reduzir custos e ampliar escalas de operação, em cenários de preços estáveis ou em queda. Ainda que de longo prazo de maturação, a pesquisa na área da genética, que já vem contribuindo de modo significativo para o avanço do setor, deverá ser fundamental para ganhos de escala, contribuindo para a homogeneização do rebanho, para redução de custos de logística, e para a qualidade da carne, por meio da tipificação da carcaça, e viabilizando uma indústria que opera de forma mais coordenada e harmônica com o setor produtivo primário.

Referências bibliográficas:

1SABADIN, C. O comércio internacional da carne bovina brasileira e a indústria frigorífica exportadora. 2006. 123 p. Dissertação (Mestrado)-Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, 2006.

2Op. cit nota 1.

3PINATTI, E. Produtividade da bovinocultura de corte paulista em 2005. Informações Econômicas, São Paulo, v. 37, n. 6, p.17-25, jun.2007.

4Op. cit nota 3.

0 Comments

  1. Breno Augusto de Oliveira disse:

    São estudos como este que podem provocar alterações significativas na cadeia produtiva de agroalimentos. Gostaria de sugerir que o IZ atuasse em outros estados com sua técnica, principalmente no MT, maior estado fornecedor de agroalimentos para SP !

  2. celso de almeida gaudencio disse:

    Gostei do artigo, mas faltou indicar que a oferta é superior a demanda econômica, e que não há elasticidade econômica, mesmo com preço baixo da carne, não houve correspondente aumento no consumo.

    ¨Ainda que de longo prazo de maturação, a pesquisa na área da genética, que já vem contribuindo de modo significativo para o avanço do setor, deverá ser fundamental para ganhos de escala, contribuindo para a homogeneização do rebanho, para redução de custos de logística, e para a qualidade da carne, por meio da tipificação da carcaça, e viabilizando uma indústria que opera de forma mais coordenada e harmônica com o setor produtivo primário¨.

    Não entendi, o ganho de escala genética indica a capacidade de melhorar a produtividade, mas não se coaduna com escala produtiva de carne, a qual deve entender de política de produção ou de abastecimento. Ou melhor, se houver avanços genéticos e nos processos de conversão de carne, tem-se que diminuir o plantel para a terminação, para não correr o risco da demanda não ser econômica. Há que se recorrer à especialista em sistemas de produção, que olha todos os ângulos da questão. Entende.

  3. Abel Ciro Minniti Igreja disse:

    Prezado Sr. Breno,
    Sua opinião é um estímulo e uma honra para nós, pesquisadores de São Paulo. É de nosso sentimento que, para melhor conhecermos a dinâmica do setor primário e das cadeias agroalimentares e energéticas de São Paulo, precisamos conhecer mais a fundo a realidade brasileira, e principalmente o que se passa na Região Centro-Oeste.
    Fico à disposição para trocar idéias, e, por esse meio, aprender mais sobre a realidade regional dessa pujante parte do Brasil.
    Tomo a liberdade de encaminhar sua mensagem original aos demais membros da equipe, se me permitir.
    Saudações cordiais,
    Abel Ciro Minniti Igreja – PqC 6
    Instituto de Zootecnia

  4. Abel Ciro Minniti Igreja disse:

    Prezado Sr. Celso,
    Apreciei suas observações sobre nosso trabalho.
    No que se refere aos aspectos da contribuição da genética, talvez eu não tenha conseguido me fazer entender, por alguma omissão.
    Na verdade, a genética poderá contribuir para reduzir custos de transação na aquisição delotes de animais prontos para o abate com características homogêneas, além de propiciar o aumento desses lotes, e redução custos de logística (que implica a manutenção de equipes de compradores e corretores especializados, por parte dos frigoríficos).
    O que foi dito por Vossa Senhoria é rigorosamente correto. Nos Estados Unidos, o avanço da genética permite que, com rebanho muito menor, os frigoríficos operem em escalas de operação substancialmente maiores em relação ao Brasil.
    Também quanto à renda do consumidor, é correta sua observação. No Brasil, entretanto, está em marcha uma discreta mas constante redistribuição de renda, o que deverá favorecer o consumo de produtos de origem animal, inclusive da carne bovina.
    Mais uma vez, muito obrigado, procurarei ser mais explícito nos próximos artigos.
    Como estímulo aos demais membros da equipe, permita-me enviar-lhes sua mensagem original.
    Saudações cordiais,
    Abel Ciro Minniti Igreja
    Instituto de Zootecnia

  5. Fernando Penteado Cardoso disse:

    Tudo bem. Mas vamos pensar na comida do boi sem a qual eles inexistem.

    FORRAGEM DE BAIXO CUSTO
    A pecuária, tanto de leite como de corte, não passa de uma indústria de transformação da matéria prima “forragem” em produtos comestíveis lácteos e cárneos.

    Ao longo dos anos a forragem de menor custo tem sido e ainda é a obtida em pasto de terra nova de mata alta, rica em húmus e em nutrientes, com porosidade incomparável.

    Nos últimos 5 anos a Fundação Agrisus vem financiando projetos de ILP para leite com gado Girolando, na terra arenosa “Caiuá” de Santo Inácio/PR, em colaboração com a Universidade Estadual de Maringá-UEM e com supervisão do eng. agr. Fernando Sichieri.

    Apresentamos os resultados dos melhores tratamentos no ano agrícola 2008/09. Os números demonstram a viabilidade de produzir forragem a custo comparável ao obtido em terra nova, em sistema que se poderia chamar de “safrinha forrageira”, factível nas regiões de clima que possibilita uma segunda cultura.

    A fase II do projeto de pesquisa Arenito (528/08) avaliou e divulgou os melhores sistemas de tecnologias de Safrinha Forrageira pós Soja, e também implantação de forrageiras perenes e leguminosas, em consórcio com a cultura do Milho de Verão, na Estância J.A.E., em Santo Inácio/PR, no período 2008/2009.

    Para vizualizar o quadro com todos os detalhes visite:”www.agrisus.org.br”

  6. Abel Ciro Minniti Igreja disse:

    Ao Dr. Fernando Penteado Cardoso,
    Muito honrado por manter uma interlocução, por meio do artigo, agradeço a valiosa colaboração.
    Abel Ciro Minniti Igreja

  7. Alex Bastos disse:

    Caro Abel,

    Gostaria de uma melhor explicação da tabela 3,

    Desde já , grato
    Alex Bastos

  8. Abel Ciro Minniti Igreja disse:

    Prezado Alex Bastos,
    A tabela 3 descreve a evolução das participações relativas da produção total (dados da Anualpec) e da produção inspecionada (dados do IBGE) de regiões selecionadas e do Estado de São Paulo. A idéia da tabela é contrastar o Estado de São Paulo com outras unidades geográficas, e constatar que nesse Estado a produção inspecionada evoluiu de forma mais favorável em relação à produção total, em relação às outras regiões.
    Fico à disposição para demais esclarecimentos e agradeço o interesse.
    Abel Ciro Minniti Igreja

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