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Os motivos que fazem os jovens ficarem ou deixarem o campo no RS

Em meio ao desafio de reter jovens em um campo cada vez mais envelhecido, o papel da família no processo de sucessão é o que acaba determinando a decisão dos filhos de deixarem o meio rural ou darem continuidade aos negócios da família. Embora o cenário externo exerça influência, como rentabilidade da atividade e quantidade de terra, é o ambiente interno que conduzirá o caminho escolhido pela juventude rural. É o que mostra pesquisa feita pelo Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) com 743 filhos de agricultores no Estado, com idades entre 13 e 21 anos.

— O ponto chave da sucessão está dentro das famílias. Se os jovens crescem ouvindo os pais reclamando da profissão, é provável que migrem para a cidade. Claro que tem a ver com vocação também mas, de qualquer forma, os filhos precisam ser preparados para o futuro — afirma Raquel Breitenbach, professora do IFRS no campus Sertão e coordenadora da pesquisa.

O levantamento, realizado no ano passado em todas as regiões gaúchas, mostra os determinantes do interesse e da falta de vontade em serem sucessores familiares na atividade agrícola (veja detalhes da pesquisa no final da matéria).

— Os resultados contrariam o senso comum de achar que é só a questão financeira que interfere na decisão. E as motivações são muito semelhantes em todas as regiões — detalha Raquel.

Uma das causas que levam os filhos de produtores a quererem ser sucessores, segundo a pesquisa, é a autonomia dada pelos pais para participarem das decisões referentes à propriedade.

— O diálogo dentro da família é fundamental. Direito à herança todos terão, mas ser sucessor é uma decisão dos jovens a partir das oportunidades que a família oferece — acrescenta Clarice Vaz Emmel Böck, coordenadora estadual de Juventude Rural, Gênero e Educação do Campo da Emater-RS.

Homens ainda são mais estimulados a se manterem na propriedade

O índice de interesse dos entrevistados em ser sucessor é de 45,2%. Quando os resultados são divididos por gênero, o percentual aumenta para 59,6% entre os meninos e despenca para 28,6% entre as meninas.

— É uma questão cultural e histórica. As meninas ainda são mais incentivadas a saírem do campo, a estudarem nas cidades. Mais um indicativo da influência da família nesse processo — indica Clarice.

Apesar do ambiente ainda mais propício aos homens, a diferença de gênero no campo vem diminuindo, com cada vez mais mulheres dispostas a assumirem os negócios — quebrando barreiras machistas ainda presentes. 

É o caso da estudante Silvia Kanigoski, 17 anos, de Viadutos, no norte do Estado. Cursando técnico em agricultura, ela pretende continuar trabalhando na produção de leite e de grãos em 18 hectares. Os dois irmãos, ambos mais velhos, já deixaram a propriedade da família para trabalhar na cidade. 

— Meus pais sempre me incentivaram a ficar, a dar continuidade. Eu vejo meu futuro aqui — conta Silvia, que leva quase três horas por dia para ir estudar na cidade e retornar para casa.

Quando concluir o Ensino Médio, a jovem pretende cursar Zootecnia. Para isso, terá de passar um tempo fora da propriedade.

— Mas depois vou querer voltar — garante Silvia. 

O mesmo caminho é trilhado por Ana Gabriela Zorzan, 18 anos. Filha de produtores rurais de Getúlio Vargas, no norte do Estado, mora durante a semana em um internato em Sertão, onde cursa técnico em agropecuária no IFRS. Nos finais de semana, ajuda os pais na produção de leite e de grãos e também na gestão da propriedade de 32 hectares.

— Sou eu que faço os orçamentos para compra de insumos, como farelo para alimentação das vacas — conta Ana Gabriela, que sente-se inserida no negócio da família.

E, embora tenha gosto natural pela pecuária, confessa que hoje está dividida entre seguir os estudos na Veterinária ou na Agronomia. 

— Gosto das duas áreas na verdade, mas acho que a parte vegetal está em vantagem — revela a jovem, que tem uma irmã de 20 anos cursando Veterinária na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

Os dois irmãos, mais velhos, não seguiram a atividade agrícola.

— Acho que sobrará para as mulheres da casa — brinca Ana Gabriela. 

Fatores de Influência

Entre os que decidiram ficar:

• Quantidade de terra que os pais têm

• Boa remuneração das atividades

• Investimentos feitos pelos pais na propriedade (tecnologia e melhorias em geral)

• Incentivo de políticas públicas

• Autonomia dada pelos pais para participar das decisões

• Relações de confiança com vizinhos e comunidades

• Possibilidade de alimentação e moradia barata

Entre os que decidiram sair:

• Baixo investimento dos pais na propriedade (tecnologia e melhorias em geral)

• Vergonha de ser agricultor

• Falta de incentivo de políticas públicas

• A ideia de que a agricultura não dá dinheiro

• Presenciar reclamações constantes dos pais sobre a atividade

• Não gostar da agricultura, não se identificar com a profissão

Herdeiros precisam se profissionalizar

No caminho para a troca ou compartilhamento de bastão no meio rural, um ponto é visto como chave entre especialistas: a necessidade de profissionalizar os sucessores para enfrentarem um mercado global cada vez mais competitivo.

— É fundamental que os pais e os filhos tenham essa consciência. Não pode se acomodar por ser proprietário. É preciso desenvolver os jovens como profissionais, para que estejam em constante atualização e modernização em questões de mercado e tecnologia — explica Teresa Roscoe, professora da Fundação Dom Cabral. 

A informalidade do campo, alerta Teresa, não pode ser confundida com a falta de necessidade de adotar práticas comuns do mundo empresarial: 

— É preciso construir um alinhamento entre os membros da família, com propósito e visão de futuro. A transmissão da cultura e do conhecimento são essenciais. 

A hora certa para os pais começarem a falar sobre sucessão dependerá da maturidade de cada filho, mas pequenos detalhes na infância já podem conduzir o processo, segundo Luis Fernando Cavalheiro Pires, assessor do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-RS):

— As crianças e os jovens precisam ser ensinados a valorizar o trabalho da família, como a importância da produção de alimentos. 

E, mesmo quando os herdeiros não têm pretensão de participar das atividades imediatamente, eles precisam ser inseridos no planejamento sucessório da propriedade. 

— Um dia, os herdeiros, querendo ou não, farão parte do negócio. Então, o melhor é que sejam preparados para quando esse dia chegar — destaca o assessor do Senar-RS. 

Busca de conhecimento

Neto de produtor rural, Conrado Pereira Zanferari, 19 anos, está se preparando para assumir os negócios da família. Estudante de Administração na Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS), o jovem pretende buscar o máximo de conhecimento para contribuir com a produção de grãos e a criação de gado de corte. No total, a propriedade da família soma cerca de 12 mil hectares.

— Quero me formar, ficar um tempo nos Estados Unidos e, depois, me inserir efetivamente nos negócios da família — afirma Zanferari.

Natural de Bagé, mudou-se para Porto Alegre ainda criança. Mas nunca perdeu os laços com o Interior e com a agropecuária.

— Cresci em cima de um trator, andando pela fazenda com meu avô e com meu tio, que é também meu padrinho. Estou me preparando para compartilhar com eles técnicas para aprimoramento da gestão rural — projeta Zanferari, neto mais velho de Gedeão Pereira, presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). 

Fonte: Zero Hora.

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