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O que foi discutido no encontro secreto da Amazon com os produtores de carne a pasto?

Outro dia, outro sinal dos ambiciosos planos da Amazon para abalar o sistema alimentar americano. A Reuters informou que na quarta-feira, representantes do gigante do comércio eletrônico se encontrarão com um grupo pequeno e influente de produtores rurais especializados em carne bovina orgânica e produzida a pasto.

É um movimento revelador e uma pista sobre o tipo de empresa que a Amazon pretende ser – se e quando sua aquisição, em andamento, da Whole Foods for realizada. A Amazon provavelmente não vai se afastar da infraestrutura existente da empresa de alimentos, não que alguém esperasse isso – não é o estilo do CEO, Jeff Bezos, deixar bem o suficiente sozinho. Mas as reuniões no nível de produtor só pode significar uma coisa: a empresa pretende forjar novas cadeias de fornecimento, encontrando novas maneiras de obter alimentos da fazenda à mesa.

O que exatamente a Amazon tem em mente? Isso é difícil de dizer. O processo em torno da reunião foi tão secreto que até mesmo os produtores que participariam da reunião – 12 pessoas, de acordo com a Reuters – tinham pouca ideia do que estava na agenda. Isso de acordo com Don Davis, pecuarista texano que faz parte do conselho de administração da American Grassfed Association.

Se a cadeia de fornecimento de carne a pasto da Amazon acabar ficando tão fora do alcance quanto os centros de dados, isso não será um sinal animador para o futuro da agricultura.

“Eu não acho que alguém saiba”, disse ele. “Até onde eu sei agora, não acredito que ninguém conheça o propósito da reunião, ou o que realmente será discutido”.

Na verdade, ele pareceu bastante surpreso por eu ter ouvido falar sobre isso.

“Achei que seria uma reunião secreta – foi-me dito para não discutir isso com ninguém”, ele riu.

Davis inicialmente não disse onde a reunião seria realizada, embora mais tarde ele tenha menciado que um amigo dele – que ia participar – tinha acabado de sair do avião na Geórgia. Nosso melhor palpite, então, é que ocorreria no White Oak Pastures em Bluffton, GA, um dos mais célebres produtores nacionais de carne a pasto certificada.

Em março, a Reuters informou que os representantes da Amazon visitaram a White Oak para se encontrar com o dono, William Harris III – uma grande figura no movimento de produção de gado a pasto e meio que uma celebridade para as pessoas que se preocupam com essas coisas. (O Kim Severson do The New York Times, pelo seu valor, o chamou de Justin Bieber do movimento orgânico no sul americano.) Harris parece ser uma espécie de intermediário entre a Amazon e a comunidade de produtores de gado a pasto em geral.

Will Harris é o dono do White Oak em Bluffton, na Geórgia, onde ele cria gado a pasto.

Acompanharemos para descobrir o que pudermos sobre o que está na agenda da reunião. Mas já sabemos o suficiente para levantar algumas hipóteses.

Uma rápida atualização: nos Estados Unidos, a grande maioria dos gados são criados no pasto, mas enviados para confinamentos para serem “terminados” – engordados com milho e depois abatidos (geralmente em grandes instalações pertencentes aos quatro grandes frigoríficos multinacionais de carne, que controlam mais de 80% da indústria e processam milhares de animais por dia).

Mas um número cada vez maior de americanos – graças, em parte, ao agora famoso perfil de 2002 de Michael Pollan, descrevendo a jornada de um único confinamento, mais tarde apresentado no livro The Omnivore’s Dilemma – mostram interesse se afastar do sistema convencional. Sejam defensores do bem-estar dos animais, ambientalistas ou libertários, uma proporção significativa de americanos quer comer carne de animais que passaram sua vida inteira no pasto.

A demanda por carne produzida a pasto está crescendo. O que já era um nicho comercial de US$ 5 milhões no final da década de 1990 cresceu formando uma indústria no valor estimado de US$ 4 bilhões até 2016, de acordo com um estudo de 2017 do Stone Barns Center for Food and Agriculture, em colaboração com as empresas de consultoria de investimentos Armonia LLC, Bonterra Partners e SLM Partners.

O mesmo estudo apontou que, com base nos dados do Nielsen, as vendas de carne bovina rotulada como carne fresca produzida a pasto dobraram a cada ano entre 2012 e 2016, passando de US$ 17 milhões em vendas para US$ 272 milhões. Esse é um ritmo de tirar o fôlego em comparação com o mercado geral de carne bovina, cujas estimativas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) são de crescimento de 2,3% em 2018.

Considerando tudo isso, entrar no mercado de carne a pasto é uma jogada muito inteligente para a Amazon. Não só porque a imagem de bem-estar do gado feliz no pasto poderia percorrer um longo caminho visando diminuir a imagem corporativa da empresa. E não só porque empresa está tentando aumentar o seu serviço AmazonFresh com ofertas além do ramen e Chef Boyardee.

O movimento da Amazon em direção à carne a pasto está dentro do padrão da indústria de tecnologia: identificar uma indústria que está com dificuldades, lutando com o gargalo da demanda e usar tecnologia transformadora para levar às pessoas mais do que elas querem.

A Amazon poderia usar sua sofisticação logística e recursos financeiros enormes para construir uma cadeia de fornecimento de carne a pasto a partir do zero.

Apesar do crescente interesse dos consumidores, a carne bovina produzida a pasto americana ainda não é tão fácil de encontrar. Pode ser difícil encontrar matadouros “customizados” menores, dispostos a trabalhar com produtores individualmente – sem mencionar mais caros.

“O processamento e a distribuição continuam sendo grandes desafios para a cadeia de fornecimento de carne a pasto”, escreveram os autores do relatório Stone Barns. “A maioria dos produtores de carne a pasto e programas de marca são muito pequenos para ter acesso às grandes e eficientes plantas de processamento. Em vez disso, eles precisam usar plantas regionais menores que cobram US$ 150-300 por cabeça para programas maiores de marca e até US$ 400-800 por cabeça para pequenos produtores.”

É por isso que o mercado está cheio de carne a pasto mais barata de países como Nova Zelândia e Uruguai, onde os padrões não são tão rigorosos quanto os promovidos pela American Grassfed Association, mas que têm mais chances de competir com a carne produzida a partir de animais alimentados com milho no preço. De acordo com o relatório Stone Barns, 75% da carne a pasto vendida nos Estados Unidos, em valor, é importada.

Esta é uma grande oportunidade para a Amazon, que poderia usar sua sofisticação logística e recursos financeiros enormes para construir a partir do zero a cadeia de fornecimento que os produtores de gado a pasto precisam. Como seria isso? É difícil dizer. Mas você pode apostar que eles discutiram isso na reunião.

Davis gosta da ideia de construir enormes estabelecimentos de criação de gado a pasto (grass-based feedlots), embora ele não goste desse termo. (Talvez “grasslots”). Se houvesse grandes pastagens em torno de matadouros focados em carnes bovinas especiais, os produtores de gado a pasto poderiam aproveitar o tipo de infraestrutura centralizada que os produtores convencionais desfrutam atualmente. Davis pensa que isso ajudaria muitos pequenos produtores, “caras de dez vacas”, a entrar no jogo de forma financeiramente viável. De qualquer forma, é um projeto digno de uma empresa com os recursos da Amazon.

Mas os céticos têm o direito de se preocupar também. Os valores da produção regenerativa são compatíveis com o titã tecnológico? E o que diz respeito à questão cultural: os produtores rurais, direcionados por missões podem realmente fazer uma parceria com os negociantes do Vale do Silício?

O segredo em torno da reunião é impressionante e não está de acordo com os valores do movimento alimentar de abertura e transparência. Embora um certo grau de discrição em torno da reunião seja compreensível, essa reunião é tão secreta que até mesmo os participantes não sabem o que está na agenda.

Será que a reunião de quarta-feira na Geórgia marcará um novo começo para os produtores independentes do país? Fique atento.

Fonte: Artigo de Joe Fassler, editor sênior da New Food Economy, publicado em 25/07/17.

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