O processo de inovação exige, cada vez mais, interação entre academia e empresa, sem prescindir da presença do governo – Marcia Barcellos [Prêmio BeefPoint Sul]

No dia 4 de abril, será realizado o BeefSummit Sul, em Porto Alegre/RS. O evento será organizado pelo BeefPoint, em parceria com a Associação Brasileira de Hereford e Braford (ABHB). O BeefSummit Sul vai reunir nomes de sucesso do agronegócio para discutir e debater os rumos da pecuária de corte no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. A expectativa é de um público de 400 pessoas, entre produtores e investidores, tornando o BeefSummit uma excelente oportunidade de gerar novos negócios.

No dia do evento, o BeefPoint irá homenagear as pessoas que fazem a diferença e têm paixão pela pecuária de corte no Sul do Brasil com o Prêmio BeefPoint Edição Sul. Há vários finalistas, em 13 categorias diferentes.

O público irá escolher através de votação, o vencedor de cada categoria. Para conhecer melhor os indicados, o BeefPoint preparou uma entrevista com cada um deles.

Conheça  Marcia Dutra de Barcellos, finalista na categoria Professor/Pesquisador.

Marcia Dutra de Barcellos é formada em Medicina Veterinária pela UFRGS, mestre e doutora em Agronegócios pelo CEPAN-UFRGS, com doutorado realizado na Holanda (Universidade de Wageningen) e na Austrália (Universidade de New England).

Realizou seu pós-doutorado em Marketing de Alimentos no MAPP-CENTRE da Universidade de Aarhus, Dinamarca. Mora em Porto Alegre, é casada há 15 anos com Bernardo Todeschini, também veterinário e tem uma filha linda, Carolina .

Marcia Barcellos também adora viajar, andar de bicicleta, ir ao cinema, ouvir música, cozinhar e curtir a vida.

BeefPoint: Com base em suas pesquisas, o que você implementou de diferente na pecuária do Sul do Brasil, que levou você a ser um dos finalistas do Prêmio BeefPoint Edição Sul 2014?

Marcia Barcellos: Creio que fui indicada pela visão que eu tenho do futuro da pecuária: eu só acredito em qualidade e melhoria dos processos para produção de carnes diferenciadas, que possam realmente agregar valor à todos os elos da cadeia.

BeefPoint: A pesquisa está cada vez mais distante da prática vivenciada no campo, em sua opinião o que pode ser feito para diminuir esse problema em nosso país?

Marcia Barcellos: Precisamos de maior integração entre os elos das cadeias, uma governança efetiva, que possa atender aos interesses mais amplos do setor agro.

Acredito no conceito da Triple Helix ou Hélice Tripla, desenvolvido pelos pesquisadores Etzkowitz e Leydesdorff (1993, 1995), que diz que o processo de inovação exige, cada vez mais, da interação entre academia e empresa, sem prescindir da presença do governo, como principal agente financiador das transformações tecnológicas. Defbhnm Com isso se criam novos formatos sociais e institucionais para a produção, transferência e aplicação do conhecimento.

BeefPoint: Qual a missão, visão e valores que você considera ético e promissor no desenvolvimento de novas pesquisas? São aplicáveis de forma prática à rotina de uma fazenda?

Marcia Barcellos: Algo que aprendi na Holanda, na Universidade de Wageningen, é que devemos sempre pensar nos 3 Ps: people, planet e profit (lucro, ou seja, o lado financeiro). Ou seja, as pesquisas devem visar o bem-estar das pessoas (produtores, funcionários, da sociedade em geral), dos animais, da natureza (isto é, do nosso planeta), mas sem esquecer da viabilidade econômica dos projetos. Honestidade, ética e seriedade são fundamentais na pesquisa, em qualquer área.

BeefPoint: O que você faz para difundir suas pesquisas frente aos pecuaristas? O que ainda pode ser feito?

Marcia Barcellos: A extensão é fundamental. Assim, publico os resultados das minhas pesquisas em artigos científicos e revistas setoriais, e também creio que a internet seja uma fonte incrível para divulgação e informação ao público. Cada vez mais devemos buscar as novas tecnologias de comunicação para difundir o conhecimento gerado.

BeefPoint: O que te traz mais resultados?

Marcia Barcellos: O mais importante para se ter credibilidade no mercado é fazer pesquisas que sejam de utilidade para a cadeia produtiva, mas que tenham solidez teórica, uma base de conhecimento concreto e aplicável. É preciso estar sempre em busca de novas informações e atualizações.

BeefPoint: Todos sabemos que aprendemos mais com nossos erros. O que fez e deu errado? Você poderia nos contar?

Marcia Barcellos: Ninguém acerta sempre, mas aprendemos muito com a vida. Não digo que errei, mas aprendi a ter paciência com a cadeia produtiva da carne bovina. Às vezes, as coisas levam muito tempo para acontecer.

Eu costumava querer tudo para ontem, mas vi que precisamos ter calma. O setor vai amadurecendo aos poucos, mas por sorte, está indo longe. Veja o Programa Carne Angus Certificada, por exemplo. Eu participei como coordenadora e diretora desde o seu início em 2003. Foram mais de 10 anos até o Programa conseguir chegar onde chegou. E ainda há muito a percorrer!

BeefPoint: O que você considera mais importante na pecuária?

Marcia Barcellos: A ciência, o melhoramento genético, o atendimento às demandas do mercado e acima de tudo, o bem-estar animal. Os bovinos, esses seres fantásticos que convertem pasto em proteína nobre, merecem o nosso mais profundo respeito. Graças a eles é que conseguimos abastecer este imenso mercado interno e os nossos mercados externos, ambos cada vez demandantes de carne de qualidade.

BeefPoint: Qual o maior desafio da pecuária do Sul do Brasil hoje?

Marcia Barcellos: Produzir carne de qualidade usando as potencialidades que só se encontram nesta região de clima sub-temperado. A combinação de raças britânicas com pastagens de inverno traz um diferencial difícil de ser obtido em outras regiões do país. A agregação de valor deve sair do pasto, passar pela indústria e chegar à mesa dos consumidores mais exigentes.

BeefPoint: Qual inovação / novidade na pecuária de corte você mais gostou dos últimos anos? O que precisamos inovar?

Marcia Barcellos: Acho que o Brasil está acordando para a valorização da matéria-prima de qualidade. As carnes com marcas são um excelente exemplo do que vem ocorrendo. Mas ainda precisamos avançar muito na tipificação de carcaças, na remuneração ao produtor do que é realmente diferenciado e na oferta mais qualificada ao consumidor.

A parte de processamento de carne bovina melhorou, mas também precisa avançar muito. Na Europa e Austrália é comum encontrarmos no supermercado carne moída em embalagem com atmosfera modificada e indicação do teor de gordura (5 ou 15%). Aqui, ainda usamos um plástico filme simples e indicação de carne moída de primeira ou de segunda.

BeefPoint: O que você pretende fazer de diferente em 2014? E por quê?

Marcia Barcellos: Avançar as pesquisas para outras cadeias produtivas. É fundamental termos uma visão sistêmica da competitividade em diversos setores.

BeefPoint: Qual o exemplo de professor/ pesquisador no Sul do Brasil hoje? Quem você admira por fazer um excelente trabalho?

Marcia Barcellos: São muitos os colegas que merecem reconhecimento. Admiro muito o trabalho que vem sendo feito no Projeto “Produção Integrada de Sistemas Agropecuários” (PISA) com a produção leiteira na região das Missões do Rio Grande do Sul.

É um dos exemplos que comentei antes, que envolve a Hélice Tripla, ou seja, envolve universidades, propriedades rurais e governo. Ocorrem visitas periódicas aos produtores, na qual os mesmos são orientados tecnicamente em relação à condução dos sistemas de produção para boas práticas de gestão e manejo sustentável das áreas.

A parceria envolve MAPA-UFPR-UFRGS-SEBRAE-SAI-EMATER, entre outros agentes. A produção anual de leite nas propriedades participante aumentou em 21% graças a este programa, exemplo que teoria e prática podem trazer resultados.

BeefPoint: Em sua opinião, o que deve ser feito para aumentar o envolvimento dos jovens na agropecuária?

Marcia Barcellos: Os jovens de hoje são sedentos por inovação, tecnologia e conhecimento. A agropecuária precisa seguir essa tendência se quiser manter a juventude no campo.

BeefPoint: Qual seu recado para os pecuaristas?

Marcia Barcellos: É importante pensar além da porteira. Tudo o que se faz na fazenda, impacta fora dela. Respeito aos demais elos da cadeia, parceria e valorização da qualidade.

O produtor bem informado e que sabe efetivamente o que está produzindo, tem mais poder de barganha frente à indústria. E é sempre bom estar associado com mais produtores, que tenham um nível parecido de desenvolvimento.

Isso reforça o volume e permite uma melhor negociação. Meta e objetivos são fundamentais. Já dizia o pensador Sêneca, na Roma antiga: “Quando se navega sem destino, nenhum vento é favorável”.

Confira outra entrevista de Marcia Barcellos no BeefPoint:

Marcia Dutra de Barcellos: o desafio é se organizar para conseguir agregar valor ao que é produzido

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