Embrapa e ABHB promovem curso de Julgamento de bovinos
7 de abril de 2005
BeefPoint realiza pesquisa sobre castração com 770 pecuaristas
11 de abril de 2005

O manejo nutricional de bezerros afeta o processo de marmorização

A busca de maior satisfação do consumidor exige estudos e técnicas cada vez mais avançadas no aprimoramento da qualidade da carne. Como o grau de marmoreio está diretamente relacionado com a palatabilidade da carne – influenciando na suculência, maciez e sabor – os principais sistemas de classificação de carcaça internacionais (Canadá, EUA e Austrália) têm pago um preço diferenciado por animais superiores nessa característica, incentivando uma produção de carne que atenda às exigências do consumidor. No Brasil, o marmoreio ainda não é avaliado nas carcaças, porém poderemos em breve usar essa ferramenta para desenvolver um produto que conquiste nichos específicos de mercado.

Para aumentar a quantidade de animais produzidos com melhor marmoreio, diversos estudos têm enfocado o mecanismo pelo qual acontece o acúmulo da gordura entremeada às fibras musculares. O aumento no nível de deposição de gordura intramuscular, sem elevar a deposição de gordura subcutânea, pode produzir uma carne com melhor marmorização. Estudos recentes têm mostrado que animais jovens quando alimentados com dietas ricas em amido até o abate desenvolvem melhor grau de marmoreio que animais alimentados com grãos somente mais tarde, já no período de confinamento.

Por exemplo, Myers et al. (1999) observaram que animais desmamados aos 117 dias de idade imediatamente colocados em uma dieta com alta quantidade de milho, e depois terminados em confinamento, obtiveram melhor classificação em termos de marmorização do que outro grupo de animais desmamados no mesmo período, porém colocados em sistema de pastejo por 82 dias, e só depois alimentados com grãos em regime de confinamento. Os dados desse experimento, assim como os resultados de diversos outros realizados nos últimos anos, sugerem que o manejo nutricional de bezerros afeta a qualidade da carne.

Porém, seria esse melhor marmoreio apenas uma resposta à alta densidade calórica da dieta consumida por um período longo, ou será que realmente existe uma diferença em termos de síntese de diferentes tipos de gordura dependente do tipo de alimento fornecido?

Em ruminantes, o alimento chega ao rúmen e então é convertido em compostos intermediários chamados ácidos graxos voláteis (AGVs). Em dietas baseadas em forragens, os AGVs estão presentes usualmente nas seguintes proporções: 65-70% acetato, 15-25% propionato, e 5-0% butirato. Dietas contendo alto teor de energia, compostas basicamente de grãos, produzem menos acetato e mais propionato (50-60% acetato, 35-45% propionato, e 5-10% butirato). Em ruminantes o acetato é o maior precursor para síntese de gorduras. Ruminantes usam acetato ao invés de glicose como o maior substrato para armazenamento de energia e oxidação e são quase que totalmente dependentes da gliconeogênese para produção de glicose.

Bovinos alimentados com dietas ricas em amido têm uma maior produção de propionato no rúmen. Na presença desse precursor glicogênico, há elevada produção de glicose e um consequente aumento na concentração sérica de insulina. Com essa elevação nos níveis séricos de insulina, há um aumento no uso de glicose usada para o desenvolvimento do tecido adiposo intramuscular, o que acarreta um melhor marmoreio. Em um experimento realizado recentemente, bezerros desmamados e alimentados “ad libitum” de 119 a 218 dias de idade com dietas possuindo alto teor de grãos apresentaram elevados níveis de insulina, quando comparados com bezerros alimentados com uma dieta concentrada mas com consumo limitado ou quando comparados a bezerros em sistema de pastagens (Schoonmaker et al., 2003). Esse aumento na concentração sérica de insulina pode ter levado a uma elevação na utilização de glicose pelas células dos tecidos periféricos, o que resultou no melhor marmoreio verificado através de ultrassonografia aos 218 dias (Schoonmaker et al., 2003).

Mas porque esse aumento nos níveis de insulina não pode causar também um aumento no uso de glicose pelos outros tecidos gordurosos, assim como ocorre com o tecido gorduroso intramuscular?

Existem evidências de que os adipócitos do tecido intramuscular têm preferência por glicose enquanto que os adipócitos do tecido subcutâneo têm preferência por acetato. Em um trabalho clássico na área de marmorização, Smith and Crouse (1984) não observaram diferenças na avaliação de marmoreio de dois grupos de animais desmamados e tratados “ad libitum” de 16 a 18 meses de idade com silagem de milho ou com milho grão. Não houveram diferenças também em termos de atividade enzimática, diâmetro de adipócitos ou células por grama. Porém, foi observado que o acetato colaborou com 70 a 80% dos carbonos utilizados para síntese de adipócitos do tecido subcutâneo, e com apenas 10 a 25% em adipócitos do tecido intramuscular. A maior parte dos carbonos usados na síntese de tecido adiposo intramuscular (50 a 75%) foi proveniente da glicose (Smith and Crouse, 1984).

Logo, a alimentação de bezerros com dietas contendo grãos, a consequente produção de propionato, o aumento na produção de glicose e a elevação na concentração sérica de insulina podem estar relacionados com uma melhor marmorização.

Bibliografia consultada

Myers, S.E., D. B. Faulkner, T. G. Nash, L. L. Berger, D. F. Parrett, and F. K. McKeith. 1999. Performance and carcass traits of early-weaned steers receiving either a pasture growing period or a finishing diet at weaning. J. Anim Sci. 77: 311-322.

Schoonmaker, J. P., M. J. Cecava, D. B. Faulkner, F. L. Fluharty, H. N. Zerby, and S. C. Loerch. 2003. Effect of source of energy and rate of growth on performance, carcass characteristics, ruminal fermentation, and serum glucose and insulin of early-weaned steers. J. Anim. Sci. 81:843-855.

Smith, S. B., and J. D. Crouse. 1984. Relative contributions of acetate, lactate and glucose to lipogenesis in bovine intramuscular and subcutaneous adipose tissue. J. Nutr. 114:792-800

0 Comments

  1. Louis Pascal de Geer disse:

    Olá Judson, Gostei muito do seu artigo sobre o manejo nutricional de bezerros que parece afetar o processo de marmorização.

    1. Quero perguntar se podemos chegar no ponto de ter um tipo de DEP para os niveis séricos de insulina que daria indicações de marmoreio?

    2. Será que é possível que a docilidade e bem estar nutricional do animal, permitam uma maior produção de propionato no rúmen?

  2. Enrique D. Beccar Varela disse:

    “Em dietas baseadas em forragens, os AGVs estão presentes usualmente nas seguintes proporções: 65-70% acetato, 15-25% propionato, e 5-0% butirato. Dietas contendo alto teor de energia, compostas basicamente de grãos, produzem menos acetato e mais propionato (50-60% acetato, 35-45% propionato, e 5-10% butirato). Em ruminantes o acetato é o maior precursor para síntese de gorduras.”

    Lo anterior es una copia de parte del articulo del epígrafe. ¿No hay un error de escritura? ¿No es el propionico el precursor de la grasa de los rumiantes? La dieta alta en granos (almidón) que cambia la partición a un menor porcentaje de acético y una mayor proporción de propiónico – como bien comenta el artículo – siempre pensé que era la que favorecia el engrasamiento o terminación de los novillos. ¿Que es lo cierto?

    Gracias
    Ing. Agr. Enrique D. Beccar Varela

  3. Judson Vasconcelos disse:

    Olá Sr. Enrique,

    Em primeiro lugar, muito obrigado pela pergunta e por favor entre em contato caso necessite de maiores informações.

    O que acontece em ruminantes é que o propionato é o maior precursor da glicose – produzindo grande quantidade de energia disponível para o animal. O acetato diretamente não é precursor de glicose. Para ruminantes, o acetato é o maior substrato para armazenamento de energia e oxidação, diferente do que acontece conosco (humanos) que usamos glicose para isso. Portanto em ruminantes, quanto mais propionato é produzido, maior é a energia disponível.

    Um exemplo clássico é o uso de ionóforos. Produtos como a monensina, por exemplo, aumentam a proporção de propionato produzido no rúmen, diminuindo a quantidade de acetato produzida, o que acarreta a produção de maior quantidade de energia para o animal.

    Espero que tenha ajudado,

    Judson

  4. Judson Vasconcelos disse:

    Olá Sr. Louis,

    Acredito que os dados que temos em termos de quais seriam os níveis ótimos de insulina para os efeitos no marmoreio da carne ainda são limitadas. Essa é uma teoria nova e ainda há muito a ser estudado quanto a isso. Atualmente está sendo usada a DEP para marmoreio, porém o uso de animais superiores com base em níveis séricos desse hormônio e resposta ao marmoreio é algo que acredito que pode até vir a acontecer, mas em um futuro distante.

    Não conheço informações quanto a produção de propionato relacionada à docilidade do animal. Dados de pesquisa mostram sim que animais menos dóceis têm pior desempenho. Animais mais dóceis apresentaram melhor consumo e melhor conversão alimentar.

    Espero que tenha ajudado,

    Judson

plugins premium WordPress