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O consumo de carne bovina pelos brasileiros

Miguel da Rocha Cavalcanti1

Seguindo a tendência de outos produtos alimentícios, a carne bovina, cada dia mais, está sendo comercializada em supermercados em substituição aos açougues. O consumidor prefere comprar em supermercados por vários motivos: preços convidativos, comodidade de encontrar todos os produtos que deseja, segurança, estacionamento, etc.

Pesquisa realizada pela APAS (Associação Brasileira de Supermercados) mostra que a carne é um alimento adquirido com elevada frequência por consumidores (veja gráfico 1).

Gráfico 1: Frequência de compra de alimentos em supermercados brasileiros

Outro ponto interessante é a importância que os consumidores dão à qualidade da carne bovina. Segundo o mesmo estudo da APAS, a qualidade da carne é o terceiro fator de maior importância no momento de se escolher um supermercado (veja gráfico 2).

Gráfico 2: Fatores importantes para escolha de um supermercado

Por esses motivos seria interessante ter um bom produto, pois se o cliente compra carne com freqüência e escolhe um supermercado devido à sua carne, existe a possibilidade desse supermercado receber freqüentes visitas, tendo assim várias oportunidades de efetuar venda de outros produtos.

No entanto, os supermercados em geral têm relutado em oferecer uma carne de melhor qualidade quando é necessário pagar um pouco a mais por isso. Por que isso acontece? A principal razão parece ser o fato dos supermercados acharem que carnes de menor custo possibilitam promoções para servir de chamariz para consumidores de baixa renda.

Os supermercados buscam atrair consumidores com essas ofertas tentadoras de carne bovina e conseguir vender outros produtos. Essa prática é atraente para as grandes cadeias de supermercados porque elas têm hoje enorme poder de negociação junto aos frigoríficos. Para atender a esse poder acima do racional das grandes cadeias, carnes de carcaças que deveriam ser industrializadas acabam indo para o mercado de carne fresca.

Em menor grau, a técnica de usar promoção de carne bovina para atrair clientes é usada também nos EUA, ocorrendo na maioria dos supermercados. Somente em estabelecimentos para uma clientela de maior renda esse tipo de estratégia não é muito adotada nas grocery stores americanas. Entretanto, lá as promoções costumam ser de cortes menos nobres, mas de carcaças que atendem um mínimo de qualidade de carne em termos de maturidade, pois existe um sistema de tipificação de carcaça funcionando.

Aqui no Brasil, até mesmo os supermercados que visam uma clientela de maior poder aquisitivo, geralmente ainda não conseguem manter uma disponibilidade constante de carne de qualidade uniforme. Entretanto, deve ser reconhecido que está havendo uma evolução e o tema qualidade de carne bovina tem sido amplamente abordado e discutido. Isso é muito bom, pois a carne bovina vem perdendo importância relativa na mesa do brasileiro. Apesar do nosso consumo per capita ser um dos maiores do mundo, aqui também o consumo de carne de frango cresceu bastante e praticamente já igualou com o consumo de carne bovina (gráfico 3).

Segundo a FAO, nos últimos 20 anos o consumo de carne no Brasil cresceu em média 2,7% ao ano, enquanto que o frango cresceu 6,4%. Nos últimos 10 anos, com elevada influência do Plano Real, a diferença aumentou mais ainda: 2,6% para a carne e 8,0% para o frango.

Gráfico 3: Evolução do consumo de carne bovina, suína e frango e renda per capita nos últimos 40 anos no Brasil.

Embora o consumo de carne bovina é muito influenciado pela renda da população, outros fatores também influenciam, e muito.

Os produtores têm sido o elo da cadeia que mais evolui em termos de produtividade e eficiência nos últimos anos. A redução na idade média de abate é um bom indicador dessa evolução. Além de aumentar a produtividade, a qualidade da carne produzida também é muito afetada no sentido positivo com a redução da idade de abate. Nosso setor de abate é um dos mais modernos do mundo em termos de equipamento. Entretanto, a interação entre os elos da cadeia tem deixado muito a desejar.

A cadeia da carne bovina não tem sido muito eficiente em divulgar os benefícios e características vantajosas de seus produtos, incluindo a carne. Também não temos conseguido lançar novos produtos de sucesso. Por tudo isso temos diminuído nossa participação na quantidade de proteína consumida pelos brasileiros.

É extremamente difícil aumentar o consumo de carne, principalmente em tempos de crise. A oferta de cortes de melhor qualidade de maior valor agregado e a oferta de novos produtos como pratos semiprontos preparados com carne de qualidade parecem ser alternativas quando se espera uma remuneração justa para os produtores de gado de corte brasileiros. Nessa linha, existem exemplos de sucesso em outros países, como EUA e Canadá, que têm conseguido reverter a tendência de queda na demanda per capita de carne bovina.

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1Miguel da Rocha Cavalcanti é engenheiro agrônomo pela ESALQ/USP e coordenador do BeefPoint.

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