País exporta +12,02% de carne bovina em 2018
7 de janeiro de 2019
Marfrig anuncia Gustavo Kahl como novo CEO da Quickfood
7 de janeiro de 2019

O açougue dos Wessel mudou de escala

“Telefone e internet ainda não funcionam. Mas já tem produção de hambúrguer”. Às 10 horas daquela quarta-feira, a situação parecia mais calma, para alívio de István e Daniel Wessel. Para todos os efeitos, o coração do negócio que fez dos açougueiros húngaros famosos no Brasil já estava em ordem.

Poucas horas antes, pai e filho acordavam aturdidos. Por um erro da concessionária de energia elétrica, os motores das linhas de produção da moderna fábrica da família Wessel giravam ao contrário. Nada era produzido. O contratempo, que só seria solucionado ao longo do dia, mostra que manter o estado da arte da operação nem sempre é fácil.

De um pequeno açougue fundado no bairro paulistano do Bixiga, em 1958, a Wessel, resultado de cinco gerações dedicadas à carne, cresceu consistentemente até se tornar referência. Em 2014, com a inauguração da unidade de Araçariguama (SP), multiplicou por dez seu tamanho e se sofisticou. Agora, até a produção de carpaccio demanda cuidados novos. “A máquina é muito rápida. Se ela descalibra a espessura da fatia, temos que descartar o produto”, explicou István.

Ao deixarem a sede original, no Bixiga, os Wessel também tiveram de ajustar sua rotina – e delegar tarefas. Afinal, a dívida de R$ 25 milhões contraída para erguer a unidade precisava ser paga. A companhia tinha que prospectar clientes para ocupar a nova capacidade.

Em 2017, Cleberson de Souza, ex-assessor da presidência da Marfrig, se juntou aos húngaros para liderar a reformulação da diretoria comercial. “Quando você é dono do negócio, sua preocupação é tudo”, disse István, justificando a necessidade de reforçar a diretoria comercial.

Com a chegada de Souza, Daniel, de 44 anos, o mais velho dos três filhos de István, foi promovido da diretoria comercial para a presidência. Mas, aos 71 anos, István segue ativo no dia a dia – bem mais do que sugere o papel de “coadjuvante qualificado” com a qual se apresenta.

Em dezembro, quando a reportagem visitou a fábrica da Wessel, István estava de partida para Dubai, onde lideraria um esforço para ampliar as exportações, ainda tímidas, de cortes de carne bovina porcionada e hambúrgueres para o Oriente Médio. No médio prazo, entre 5% a 10% da produção da empresa poderá ser exportada.

Mas é no mercado doméstico, sobretudo em São Paulo e no Rio, que está a base da Wessel. E foi para impulsionar as vendas no país, também de itens tradicionais como o medalhão de filé mignon, que Souza revisou a área comercial, contratando gerentes especializados nas áreas de varejo, food service e distribuição. Antes, apenas uma gerente era responsável por todos os canais.

Gradualmente, os resultados apareceram. Desde que inaugurou a fábrica, na primeira semana de 2014, a produção de hambúrguer, responsável por 70% do faturamento da empresa, mais que dobrou, para as atuais 450 toneladas por mês.

A expansão da produção se traduziu no faturamento. István, Daniel e Souza guardam os números a sete chaves. No mercado, estima-se que as vendas já chegaram a R$ 150 milhões no ano passado e poderão atingir R$ 200 milhões em 2019.

Ao Valor, o presidente da Wessel só tratou de percentuais. Segundo ele, o faturamento cresceu 70% desde a inauguração da fábrica e ainda há muito espaço para crescer. “A gente quer triplicar de tamanho”, disse, sem citar o prazo.

De fato, o mercado brasileiro de hambúrguer já é grande e não para de crescer devido à febre das hamburguerias. Dados da consultoria Nielsen obtidos pela reportagem estimam que, apenas no varejo e no atacarejo, o negócio gira 82,4 mil toneladas por ano, ou R$ 1,1 bilhão.

No food service, responsável por dois terços das vendas da Wessel, o mercado de hambúrguer é ainda maior. Conforme a consultoria Euromonitor, nessa frente o mercado de hambúrguer supera US$ 3 bilhões. Segundo Souza, apenas as grandes redes de fast food, como McDonald’s e Burger King, comercializam 7 mil toneladas por mês.

Para a Wessel aproveitar esse grande mercado e manter a trajetória de crescimento, os investimentos necessários são pequenos, afirmou Daniel. O principal é ampliar a área para estocagem de produtos. As obras de alvenaria do espaço foram feitas na construção da fábrica, mas ficou pendente a adequação da área com equipamentos de refrigeração.

Também haverá uma ampliação de turnos. Hoje, a maior parte dos 185 funcionários trabalha em um turno. A ideia é que um segundo seja aberto. Para 2019, a Wessel ampliará o quadro de funcionários em 10%.

Afora esses investimentos, uma expansão da capacidade de produção também está nos planos de longo prazo. Ao lado da fábrica, a companhia tem um terreno de 2 mil metros quadrados onde pode construir outra planta. A compra do terreno, maior que o necessário para abrigar a fábrica inaugurada em 2014, visava a aplacar um “trauma” de István.

No Bixiga, o açougue fundado há 60 anos se transformou em um emaranhado de escadas e rampas, com seis prédios “puxadinhos”. “Viemos um pouco mais longe para poder comprar uma área maior. Temos a possibilidade de dobrar ou quase triplicar a produção”, contou ele.

A expansão, porém, só será feita se a Wessel mantiver os elevados níveis de rentabilidade alcançados em 2018. Segundo Daniel, a margem de lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) atingiu 21% no ano passado e, se tudo der certo, poderá chegar a 23% em 2019. “O custo fixo não cresce na proporção do faturamento”, justificou o empresário.

Nos últimos anos, essa rentabilidade “gourmet” da Wessel representou um desafio na relação com os bancos. Costumeiramente, a empresa era comparada a frigoríficos, que reportam margens que poucas vezes ultrapassam os 10%. Para se livrar do rótulo de “frigorífico” – de fato, a Wessel não abate animais, apenas processa carne -, a companhia contratou em 2017 a firma de auditoria RSM. Com isso, os números apresentados passaram a ser mais palatáveis aos bancos. “Os custos de captação melhoraram muito”, disse Daniel.

Diante da boa fase, ele não nega que a Wessel seja frequentemente abordada por investidores interessados em comprar ao menos uma participação na companhia, ainda que, em geral, sejam oferecidos múltiplos pouco interessantes. “A gente só vende essa empresa pelo preço que ela não vale. E não com alegria”, afirmou István. Além disso, não há problemas de sucessão. “Uma empresa é vendida por falta de família ou excesso de família. Aqui não temos sócio nem sobrinho”, brincou.

Fonte: Valor Econômico.

Os comentários estão encerrados.

plugins premium WordPress