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Márcio Ribeiro Silva: o desenvolvimento de um relacionamento pró-ativo com o comprador é importante na pecuária de cria

Workshop BeefPoint – Estudos de caso sobre pecuária de cria será realizado no dia 18 de junho, em São Paulo, SP. O BeefPoint preparou uma série de entrevistas com cada um dos palestrantes. Confira abaixo a entrevista com Márcio Ribeiro Silva.

Marcio Ribeiro Silva

Márcio Ribeiro Silva é médico veterinário pela UFRRJ, com mestrado em reprodução animal pela UFV. Após concluir o mestrado, atuou por cinco anos como gerente de produção da Ema Pantanal, de Corumbá-MS e participou na coordenação do projeto de pecuária de cria da empresa. Em 2005, foi transferido para Jaboticabal-SP, onde cursou doutorado em melhoramento genético na UNESP de Jaboticabal e iniciou seus trabalhos à frente da Melhore Animal Consultoria.

Desde então, atua como consultor técnico de projetos de pecuária de cria, com ênfase em gestão reprodutiva associada ao melhoramento genético em empresas que exploram a pecuária seletiva e comercial no país e exterior. Atualmente, está morando em Piracicaba-SP, onde sua esposa realiza seu treinamento de pós-doutorado em nutrição e reprodução na ESALQ.

O tema de sua palestra será Investimento em genética certificada: Principais aprendizados, erros, acertos e experiência da EMA Agropecuária no Pantanal do Mato Grosso do Sul.

BeefPoint: O que você considera mais importante em uma fazenda de pecuária de cria?

Márcio Ribeiro Silva: Ter foco no tipo de produto de maior liquidez e agregação de valor no mercado local, atuar com profissionalismo na gestão dos custos de produção e na viabilidade econômica e operacional das tecnologias a serem empregadas, e, em especial, ter um time de campo e escritório capacitado e motivado para a adoção correta das práticas de manejo, escrituração zootécnica e gerenciamento da fazenda.

BeefPoint: Qual o exemplo de pecuária do futuro na cria, no Brasil hoje? Quem você admira por fazer um excelente trabalho?

Márcio Ribeiro Silva: No Brasil temos muitos e exemplares criatórios muito bem conduzidos e assessorados por pessoas competentes que realizam excelentes trabalhos em diferentes regiões, como a Agropecuária CFM nas fazendas da Bahia, São Paulo e Mato Grosso do Sul; a Katayama Pecuária nas fazendas do Mato Grosso do Sul; o primoroso trabalho desenvolvido nas fazendas Cifrão e Gaivota pelo Dr. Edson Crochiquia e Edson Filho no Mato Grosso e o singular projeto desenvolvido na Ema Agropecuária no pantanal sul-mato-grossense.

Todos estes se destacam pela eficiência econômica e produtiva graças ao profissionalismo com que exercem a atividade de cria, cada qual com suas particularidades mercadológicas e de sistema de produção. Particularmente, tenho enorme admiração pelo bem sucedido projeto desenvolvido na Ema Pantanal, do qual participo como um dos coordenadores há mais de 13 anos, no qual exercemos ativamente nossa capacidade de inovação na adaptação de tecnologias frente às grandes dificuldades logísticas, limitação qualitativa e quantitativa de forragens e, sobretudo, ao desafio imposto pelo período de cheias no pantanal.

Este projeto foi e é um grande desafio técnico, todavia, diante dos resultados apurados após anos de trabalho considero um modelo para a região na produção em grande escala de bezerros de ótimo potencial genético para produção de carne de qualidade, com sustentabilidade econômica, ambiental e social.

BeefPoint: Qual o maior desafio da pecuária de cria no Brasil hoje?

Márcio Ribeiro Silva: De forma genérica, o maior desafio da pecuária de cria está no reconhecimento pela indústria frigorífica de que criador não é um mero produtor de gado de reposição, mas sim um fornecedor de carne de qualidade e saudável.

É um conceito de integração dos elos produtores da cadeia da carne, no qual muitos pecuaristas de cria também têm que se dar conta, pois acredito que evoluiríamos para um ciclo virtuoso em que a produção de bezerros bem criados, saudáveis e de ótima genética seria estimulada pela agregação de valor verdadeiramente reconhecida pelo mercado.

Os frigoríficos sinalizariam qual “tipo” de bezerro deveríamos produzir, para qual mercado estaríamos produzindo e quanto pagariam por essa carne. Afinal, produzir bons bezerros, sem agredir o meio ambiente, requer investimentos, dá muito trabalho e os custos não são baixos. Se a carne destes animais for destinada a mercados que pagam mais pela sua qualidade, obviamente que estes deverão valer mais.

BeefPoint: Em relação a pecuária de cria, qual inovação / novidade na pecuária de corte você mais gostou dos últimos anos? O que estamos precisando em inovação?

Márcio Ribeiro Silva: Nos últimos anos, tivemos importantes novidades de alto impacto na pecuária de cria, como os avanços no desenvolvimento de protocolos hormonais direcionados à inseminação artificial em tempo fixo (IATF), inclusive com uso de sêmen sexado, que proporcionaram índices reprodutivos satisfatórios com custo-benefício favorável, alavancando o crescimento da inseminação artificial no país.

Outros avanços também se deram na área de nutrição animal, como o uso de aditivos para melhor aproveitamento dos nutrientes da pastagem, inclusive na pecuária de cria, e no melhoramento genético com o avanço metodológico para o emprego da genômica nas avaliações genéticas, resultando em maiores acurácias nas estimativas das DEPs, minimizando os riscos genéticos com a utilização de animais jovens e aumentando o ganho genético anual.

Também, outras iniciativas como a parceria das Federações de Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Mato Grosso (Famato), Mato Grosso do Sul (Famasul) e Pará (Faepa) com a Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F/Bovespa) e Bolsa Brasileira de Mercadorias (BBM) deverá contribuir para o crescimento das transações de compra e venda de contratos futuros de Boi Gordo na BMF, visto que juntos esses quatro estados representam mais de 50% do rebanho bovino do país.

Precisamos, e muito, evoluir na capacitação e gestão das pessoas envolvidas na produção e gerenciamento das fazendas e modernizar a grade curricular nas universidades, aproximando o futuro profissional de todos os segmentos que compõem a cadeia produtiva, bem como da gestão de empreendimentos pecuários. Em muitas regiões, o cenário é preocupante diante da falta de gente capacitada e do significativo êxodo de empregados para o setor agrícola e florestal. Soma-se a isto a carência de visão administrativa em muitas propriedades.

BeefPoint: O que você implementou de diferente na sua pecuária de cria em 2012? O que você fez em 2012 que te trouxe mais resultados?

Márcio Ribeiro Silva: Desde o ano passado, nas propriedades que assessoramos, passamos a fazer ajustes finos para melhoria dos nossos resultados. Dentre as inovações implementadas, está o emprego de análises estatísticas aplicadas ao nosso banco de dados para aferição dos pontos críticos das informações reprodutivas e desempenho dos animais.

Assim, quando identificamos diferenças estatísticas significativas, tomamos as decisões cabíveis, como indicação de treinamento de reciclagem para inseminadores de menor eficiência, reavaliação e/ou exclusão de partidas de sêmen do programa de IATF, ajustes no protocolo hormonal e de manejo no programa de IATF, identificação e descarte de matrizes menos produtivas, animais inferiores, etc.

Outra inovação que nos trouxe um bom resultado foi o emprego do uso de sêmen refrigerado de touros de alto mérito genético na IATF, sob coordenação da Dra. Juliana Corrêa Borges Silva, pós-doutoranda da ESALQ/USP, que contribuiu para obtenção de índices acima da média com viabilidade econômica dentro destes criatórios. Implantamos programas de reprodutivos, especialmente com IATF, não só com foco na eficiência reprodutiva, mas customizados aos objetivos de produção e seleção de cada caso, ou seja, aumentamos a freqüência dos genes desejáveis para produzirmos as progênies com potencial genético almejado, tanto na seleção quanto em cruzamentos.

BeefPoint: O que você pretende fazer de diferente em 2013, em pecuária de cria? E porque?

Márcio Ribeiro Silva: Em 2013 pretendemos ampliar nossos investimentos em treinamento e na gestão de pessoas, pois vivenciamos uma crescente carência de mão-de-obra qualificada e valorizada em todas as regiões. Para que as tecnologias sejam corretamente empregadas, precisamos de um bom time capacitado e motivado.

Ainda, vislumbramos o emprego da genômica nas avaliações genéticas para a seleção de touros jovens para a próxima estação de monta, permitindo maior intensidade de uso destes, aumentando o progresso genético e minimizando os custos na inseminação artificial.

Certamente, ambas as iniciativas se reverterão em ganhos em produtividade nos projetos pecuários que participamos.

BeefPoint: Como tornar a comercialização do bezerro mais eficiente? O que falta no Brasil?

Márcio Ribeiro Silva: A comercialização é um desafio para as diferentes praças de gado de reposição no país, em que algumas iniciativas têm colaborado para melhor ajustamento dos preços tanto para o vendedor como para o comprador, como o pagamento pelo kg de peso vivo com transparência no manejo pré-desmama dado aos animais. Acredito que esta seria a forma mais democrática atualmente em remunerar o investimento em genética feito pelo criador. Estamos vivenciando aumentos de custos de produção não acompanhados pelos aumentos dos preços da arroba de boi, refletindo na baixa rentabilidade da atividade.

Precisamos expandir e copiar as iniciativas bem sucedidas de grupos isolados, e migrarmos para o conceito de integração dos elos produtivos da cadeia, ou seja, de que o criador não produz apenas animais, mas sim carne e subprodutos de qualidade para a indústria frigorífica. Temos que nos profissionalizar em produzir bezerros que atenderiam às exigências dos mercados consolidados pela indústria, com a valorização concedente às especificações qualitativas da carne, couro, etc.

O desenvolvimento de um relacionamento pró-ativo com o comprador é muito importante. Por fim, o mercado futuro e de opções é uma importante ferramenta que está disponível e que deve fazer parte do dia-dia dos nossos pecuaristas, especialmente os confinadores, para que possam comercializar eletronicamente o boi gordo no mercado físico e ter segurança de recebimento pela matéria-prima entregue à indústria.

BeefPoint: O que o setor poderia / deveria fazer para aumentar a competitividade da pecuária de cria no Brasil?

Márcio Ribeiro Silva: A questão técnica está bem encaminhada, a cada dia temos tecnologias disponíveis validadas econômica e operacionalmente para produzirmos animais de boa qualidade genética e de darmos condições para que estes produtos expressem todo este cumulativo potencial.

Basta, portanto, adaptarmos as tecnologias disponíveis a cada realidade de sistema de produção e mercado local. Por exemplo, há criadores que obterão melhores resultados econômicos produzindo bezerros e touros provados em monta natural do que por IATF, por não ter condições estruturais de adoção desta biotécnica. Isto vale para a tomada de decisão na implementação de qualquer tecnologia, pois nem sempre a mudança de índices reprodutivos e zootécnicos resulta em melhoria da rentabilidade da atividade.

Dentro da porteira, se conseguíssemos que todos tivessem acesso à assistência técnica e fizessem o simples, pois ainda há muitos criadores que não se atentam com questões básicas, como a adoção de estação de monta com bases técnicas, condição corporal da vaca ao parto, descarte de vacas pouco produtivas ou improdutivas, uso de touros com genética certificada, manejo de pastagens e suplementação mineral do rebanho. Tirar estes produtores da marginalidade tecnológica e do empirismo aumentaria sobremaneira a competitividade da nossa pecuária.

Fora da porteira, iniciativas como o enfatizado conceito de integração, alianças mercadológicas e políticas de linhas de crédito para adoção de tecnologias se reverterão em maior rentabilidade e competitividade ao setor.

BeefPoint: Qual seu recado para produtores de gado de corte, em especial criadores?

Márcio Ribeiro Silva: O Brasil indiscutivelmente é o país da pecuária do futuro, não só pela potencialidade em podermos atender competitivamente em grande escala qualquer nicho de mercado interno e externo, mas temos gente com perfil e talento para produzir.

Contamos com excelentes técnicos, cientistas, lideranças executivas e de classe, e as principais empresas mundiais de insumos e frigoríficos estão aqui instaladas. Todavia, pecamos na nossa baixa capacidade de agir coletivamente.

Há muito tempo que a pecuária não é mais atividade extensiva. Exige profissionalismo, regras de mercado transparente, debate e união entre os elos da cadeia produtiva em prol de políticas públicas que garantam um ambiente de crescimento e segurança jurídica para o setor. A pecuária do futuro do presente está aqui. Do nosso trabalho e otimismo depende o país, afinal representamos quase 8% do PIB.

Clique aqui para ver a programação completa do Workshop BeefPoint – Estudos de caso sobre pecuária de cria.

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