Mercados Futuros – 17/05/07
17 de maio de 2007
Gastroenterite verminótica em bovinos (parte I)
21 de maio de 2007

Leucose enzoótica bovina

A Leucose Enzoótica Bovina é uma doença infecto-contagiosa de caráter crônico causada por um retrovirus, que possui um período de incubação de dois a cinco anos, levando ao desenvolvimento de tumores em uma pequena porcentagem dos animais infectados. Atualmente, a LEB está presente em praticamente todos os países do mundo, com exceção de alguns países europeus, que possuem rebanhos pouco numerosos e decidiram erradicá-la.

A Leucose Enzoótica Bovina (LEB) é uma doença infecto-contagiosa de caráter crônico causada por um retrovirus, que possui um período de incubação de dois a cinco anos, levando ao desenvolvimento de tumores em uma pequena porcentagem dos animais infectados.

Apesar de alguns relatos sobre leucose em bovinos na literatura alemã do século XIX (Leisering, 1871, citado por Johnson e Kaneene, 1992), a doença e o agente viral só foram descritos no final da década de 60, nos Estados Unidos (Miller, 1969). A difusão do vírus ocorreu devido a introdução de animais europeus infectados em países livres da doença. No Brasil, a doença foi descrita pela primeira vez por Rangel e Machado (1943), que realizaram um levantamento sobre a freqüência de neoplasias nos animais domésticos, no estado de Minas Gerais, e assinalaram a ocorrência de linfossarcomas em bovinos.

Todavia, relato publicado por Merckt et al. (1959), no Rio Grande do Sul, parece registrar oficialmente o primeiro diagnóstico clínico da doença em rebanhos criados no Brasil. Atualmente, a LEB está presente em praticamente todos os países do mundo, com exceção de alguns países europeus, que possuem rebanhos pouco numerosos e decidiram erradicá-la.

Etiologia

A Leucose Enzoótica Bovina (LEB) é causada por um vírus pertencente ao gênero Deltaretrovírus, família Retroviridae, que infecta preferencialmente linfócitos B, mas também é capaz de infectar células T, monócitos e granulócitos (Schwartz et al., 1994).

Epidemiologia

A trasmissão é resultante, principalmente, da transferência de material contaminado com sangue de animais infectados aos animais livres da doença, sendo necessário uma quantidade muito pequena de sangue, cerca de 0,0005 ml, quando inoculado pelas vias subcutânea, intradérmica, intramuscular ou intravenosa. A utilização de agulhas, instrumental cirúrgico, a marcação de animais, as luvas utilizadas para palpação retal, a premunição contra babesiose e anaplasmose, a ação mecânica de tabanídeos, contato com saliva contaminada e a alimentação com leite ou colostro provenientes de vacas infectadas são as principais causas de infecção (Johnson e Kaneene, 1992).

A transmissão via colostro é difícil de ocorrer, pois o vírus é possivelmente neutralizado pelos anticorpos colostrais e também devido à impermeabilidade da mucosa intestinal aos linfócitos, após 24 a 36 horas do nascimento.

O sêmen, que apresenta grande número de leucócitos é um material com potencial na transmissão da LEB, principalmente na monta natural, pois quando o sêmen utilizado na inseminação artificial é procedente de uma empresa que utiliza um controle de qualidade rígido, normalmente não apresenta leucócitos.

A transmissão transplacentária ocorre em aproximadamente 3 a 6% das gestações de vacas soropositivas (Hübner et al., 1997).

A transferência de embriões de vacas infectadas para vacas não infectadas, desde que precedida de lavagens, não está associada à transmissão do vírus (Lucas, 1992).

A LEB possui distribuição global, porém a situação da doença em diferentes países difere grandemente e dentro de um país a prevalência varia de rebanho a rebanho (Johnson e Kaneene, 1992). A maioria dos países reporta uma maior incidência em rebanhos de leite do que nos de corte. No Brasil, encontra-se amplamente difundido, conforme pode ser visto na Tabela 1, onde está demonstrada a freqüência de anticorpos para o vírus da LEB em vários estados brasileiros.

Tabela 1. Freqüência da leucose enzoótica bovina em diversos estados brasileiros


O fator que mais influencia na variação das freqüências observadas acima é a aglomeração de animais, quanto maior a aglomeração, maior será a freqüência de animais soropositivos. A realização de compras de animais é também um fator que influencia, porém em menor grau. É na bovinocultura de leite que se concentra o maior número de infectados, isto ocorre devido ao manejo a que os animais são submetidos, geralmente de forma intensiva ou semi-intensiva, sendo, portanto, submetidos com freqüência a situações que favorecem a transmissão da doença, como premunições, vacinações, vermifugações, colocação de brincos, descornas, cirurgias e palpações retais. Nos rebanhos manejados de maneira extensiva, como na maioria das propriedades de bovinos de corte brasileiros, a difusão do vírus ocorre de forma limitada (D´Angelino et al., 1998a).

Em um trabalho realizado no estado de Minas Gerais, recentemente, observou-se uma maior porcentagem de animais soropositivos em propriedades produtoras de leite e uma pequena proporção de bovinos de corte infectados; e uma elevação da soropositividade com o aumento da idade dos animais (Figura 1) (Camargos et al., trabalho submetido, 2001).

Figura 1. Freqüência de bovinos soropositivos para o vírus da leucose enzoótica bovina em rebanhos de leite C, leite A/B e corte do estado de Minas Gerais, de acordo com a faixa etária


Lesões e sintomas

A infecção pelo vírus leva ao aparecimento de linfocitose persistente em aproximadamente 30% dos animais infectados, que clinicamente não apresentam nenhum sintoma ou apresenta-se na forma tumoral, indo de 0,5 a 5,0% dos bovinos com mais de quatro anos de idade. Os tumores ocorrem com maior freqüência no útero, linfonodos mesentéricos, retrobulbares, pré-escapular e sub-ilíaco, coração, abomaso e no canal medular. As massas tumorais apresentam aspecto firme e coloração branca amarelada. A sintomatologia apresentada depende do local de aparecimento dos linfossarcomas (Toma et al., 1990). Quando os tumores estão localizados em órgãos internos os sinais são mal definidos. Como, por exemplo, se no coração, insuficiência cardíaca, estase venosa e pulso venoso positivo; caso seja no abomaso, indigestão, timpanismo, diarréia e constipação; nos tecidos perimedulares, paralisia dos membros posteriores; nos tecidos retrobulbares, exoftalmia uni ou bilateral.

Diagnóstico

Clínico

Os animais apresentam emagrecimento progressivo, anorexia, exoftalmia, paralisia progressiva dos membros posteriores e formações tumorais nos linfonodos superficiais. À necropsia são encontradas formações tumorais em tecidos linfóides, no átrio direito do coração, na parede do abomaso e útero, linfonodos aumentados com tecido neoplásico firme e branco, muitas vezes circundando um foco necrótico translúcido e amarelado (Lucas, 1992). Ocasionalmente, os rins e ureteres são afetados (Sparling, 2000).

Laboratorial

Histopatológico: observa-se infiltrações nodulares ou difusas de células linfóides nos órgãos atingidos. Com base na morfologia celular o linfossarcoma é classificado como um tumor de células redondas. Neste grupo, as células não possuem junções intercelulares, dispondo-se isoladamente. As células neoplásicas malignas exibem uma ou mais das seguintes características: aumento da relação núcleo/citoplasma, cromatina frouxa, presença de macronúcleo (usualmente múltiplos), homogeneidade morfológica, pleomorfismo (presença de células em um mesmo estágio de desenvolvimento, apresentando diferentes formas), vacuolização intranuclear, anisocitose (presença de células em diferentes tamanhos) e anisocariose (presença de células com núcleos de diferentes tamanhos) (Oliveira et al., 1999). Deve-se coletar os órgãos que apresentarem tumorações e enviar o material em formalina a 10%.

Exame de sangue: observa-se linfocitose persistente em aproximadamente 30% dos bovinos infectados. A linfocitose persistente é definida como um aumento no número de linfócitos, de três ou mais desvios padrões da média de determinada raça e em determinada faixa etária, que perdure por mais de três meses (Modena, 1984, Radostitis, 1994).

Sorológico: deve-se enviar o soro de animais com mais de sete meses de idade, para evitar a detecção de anticorpos colostrais. Vacas no período de pré ou pós-parto, 30 dias antes ou depois do parto, que apresentarem resultado negativo nos testes sorológicos devem ser retestadas, pois ocorre declínio nos títulos de anticorpos. Os testes rotineiramente usados são a imunodifusão em gel de agar (IDGA) e os ensaios imunoenzimáticos (ELISAs) (Reichel et al., 1998). A interpretação dos resultados de exames sorológicos encontra-se na Tabela 2.

Tabela 2. Interpretação dos resultados de exames sorológicos para a leucose enzoótica bovina


Diagnóstico diferencial

Uma enfermidade com sintomas semelhantes aos da LEB, é a Leucose Esporádica Bovina, que apresenta-se sob três formas. A juvenil que afeta bezerros com menos de seis meses de idade, envolvendo os linfonodos, fígado, baço e medula óssea. A forma tímica atinge animais com seis a 30 meses de idade, ocorre formações tumorais massivas no timo e linfonodos do pescoço e tórax. A forma cutânea é rara e ocorre em bovinos com 18 a 36 meses de idade, nos quais podem ser visualizados nódulos linfocíticos com 1 a 2 cm de diâmetro na pele.

Normalmente, animais com a leucose esporádica, não apresentam anticorpos, mas em alguns casos já foram encontrados animais positivos nas provas sorológicas e na PCR (Jacobs et al., 1992). Deve-se fazer diagnóstico diferencial também com tuberculose, paratuberculose (nos casos de aumento nos linfonodos e na forma digestiva), raiva (quando ocorre acometimento do sistema nervoso periférico) e com pericardite e endocardite, quando o coração é acometido (Radostitis, 1994).

Prevenção e controle

O controle da doença é difícil devido à sua grande disseminação, principalmente, nos rebanhos leiteiros, por evoluir lentamente apresentando grande número de animais assintomáticos, devido à inexistência de um programa de controle oficial e por não ter-se quantificado a sua importância econômica.

Manutenção de rebanhos livres

Se o rebanho é livre da doença, deve-se evitar a introdução de animais infectados. Se houver introdução de bovinos provenientes de rebanho soronegativo, deve-se manter os animais separados do restante do rebanho por 30 dias e testá-los antes da entrada e ao final do período de isolamento. Se forem provenientes de rebanho soropositivo, mantê-los isolados por três meses e em seguida testá-los. O veterinário não deve utilizar instrumental cirúrgico ou agulhas que foram utilizados em outro rebanho. Manter os animais a pelo menos 150 metros de distância de rebanhos infectados (Johnson e Kaneene, 1992).

Rebanhos infectados

Devem ser implantados dois tipos de medidas:

a) Medidas profiláticas para limitar a disseminação do vírus no rebanho:
• injeções, agulhas e instrumentos: usar agulhas descartáveis para evitar a infecção dos animais negativos. Os instrumentos devem ser desinfetados quando do procedimento em animais diferentes;

• utilizar uma luva por palpação retal;

• instituir programa de controle de mosquitos hematófagos;

• colostro: permitir que o bezerro mame o colostro de vaca soropositiva.

b) Controle para erradicação:

• eliminação dos animais positivos através da sorologia em todo o rebanho nos animais com mais de sete meses com intervalo de três a seis meses, e isolamento e sacrifício dos animais soropositivos.

O rebanho é considerado negativo quando todos os animais forem sorologicamente negativos, em duas sorologias, com intervalo de seis meses. Esse esquema não é viável em rebanhos altamente infectados, o que representa a realidade para a maioria das fazendas leiteiras no Brasil.

• segregação de animais infectados

A criação de rebanho não infectado, a partir de outro infectado tem dado certo, segregando os bezerros saudáveis do resto do rebanho. A dificuldade é com relação ao manejo, pois os animais infectados, com já dito anteriormente, devem ficar a pelo menos 150 metros de distância dos não infectados. O rebanho negativo deve ser testado a cada três meses e os bezerros após os seis meses de idade. Pode-se permitir que bezerros de vacas soropositivas mamem o colostro mas é necessário testá-los aos sete meses de idade (Toma et al., 1990).

Tratamento e vacinação

Até o momento não existem tratamentos ou vacinas eficientes disponíveis.

Conclusão

A LEB é uma doença que está amplamente difundida nos rebanhos leiteiros brasileiros, que apresenta importância econômica desconhecida, e que portanto, carece de mais estudos no nosso país.

Referências bibliográficas

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2 Comments

  1. Horácio Lemos Albertini disse:

    Parabéns pelo trabalho desenvolvido pelos colegas do Mapa, de Pedro Leopoldo.

    A leucose se espalha silenciosamente e é preciso chamar a atenção dos profissionais e dos produtores. Que os colegas, Ronnie e Marcelo, se sintam abençoados, por um exemplar colega de trabalho no Mapa, aí em Pedro Leopoldo, que é o “Cândido” Chico Xavier.

  2. Fabricio Xavier Baier disse:

    Esta patologia possui uma grande vantagem ela é silenciosa o que pode levar a uma contaminação generalizada, levando assim a um prejuízo imenso. Isso serve de alerta para toda a classe da pecuária.

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