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23 de abril de 2007
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25 de abril de 2007

Importância do uso da estimulação elétrica e outros métodos na qualidade da carne

Processamento acelerado de carne é um termo amplo utilizado para descrever uma série de tecnologias desde o abate dos animais até a obtenção da carne, disponibilizando-a ao consumidor em curto espaço de tempo. A fim de encurtar alguns estágios de produção de carne fresca pode-se utilizar técnicas como a estimulação elétrica, que reduzem o tempo para o desenvolvimento da maciez desejável. Embora estas tecnologias estejam sendo discutidas há décadas, poucos países, as utilizam com eficácia.

Processamento acelerado de carne é um termo amplo utilizado para descrever uma série de tecnologias desde o abate dos animais até a obtenção da carne, ou produtos cárneos, disponibilizando-os ao consumidor em curto espaço de tempo (TAYLOR, 1987). A fim de encurtar alguns estágios de produção de carne fresca pode-se utilizar técnicas como a estimulação elétrica (EE) de carcaças, que permite um resfriamento rápido das carcaças ou dos cortes cárneos, com aumento da taxa de glicólise pós-morte a desossa a quente (DQ), que dinamiza a obtenção dos cortes, embalagem e resfriamento e altas temperaturas de condicionamento dos cortes, que reduzem o tempo para o desenvolvimento de uma maciez desejável. Embora estas tecnologias estejam sendo discutidas há décadas, poucos países, como a Nova Zelândia e a Austrália, as utilizam com eficácia (CARDOSO, 2005).

Por outro lado, a desossa a quente das carcaças, para se constituir num método acelerado de produção de carne, deveria ser seguida de resfriamento rápido e/ou congelamento dos cortes, condições que aumentariam o grau de encurtamento das fibras musculares, tanto para os cortes resfriados como para os descongelados, pois os músculos não teriam nenhuma restrição ao seu encolhimento. Com isso a carne seria tão dura que não poderia ser consumida da maneira usual, como por exemplo, na forma de bifes (CIA et al., 1982, citados por CARDOSO, 2005).

O interesse no uso da desossa quente têm aumentado devido à economia de espaço, energia, materiais, bem como alguns resultados demonstraram uma melhora funcional nas propriedades e na qualidade final dos produtos cárneos (Kaster, 1983, citado por White et al., 2003).

Nesse sentido, a utilização da estimulação elétrica em carcaças, a fim de evitar o encurtamento das fibras pelo frio possibilitou o uso da desossa pré-rigor minimizando ou evitando-se o endurecimento da carne.

Com o objetivo de reduzir a variabilidade na qualidade gustativa da carne, White et al. (2003) aplicou técnicas de estimulação, combinadas com a desossa a quente de carcaças. Os autores concluíram que a estimulação elétrica nas carcaças (90V, 3×60 seg e 14Hz) preveniu a dureza da carne, que poderia ocorrer devido a desossa a quente. A associação do resfriamento lento e da estimulação das carcaças foi mais efetiva no amaciamento da carne.

Já, CIA et al. (1982), estimularam carcaças, logo após a sangria. Meias carcaças foram desossadas após o resfriamento e os cortes do Longissimus (contrafilé), Semimembranosus (coxão mole) e Bíceps femoris (picanha) foram congelados (T1). As outras meias carcaças (lado correspondente) foram desossadas a quente e os cortes congelados (T2).

De acordo com os autores, os tratamentos não influenciaram os rendimentos em carne reaproveitável, retalhos magros e aparas de gordura. Ainda, a perda de peso durante o resfriamento do T1 foi de 1,86 ponto percentual maior do que T2 e a porcentagem de ossos foi de 1,65 ponto maior do que T1. Em relação ao atributo de cor, houve uma preferência pelos cortes T2. Porém, a cor do músculo Longissimus do T1 foi preferida à dos bifes do T2 e não houve diferenças dos tratamentos nos músculos do Semimembranosus. Também não foram verificadas diferenças na maciez objetiva e sensorial entre os tratamentos.

De acordo com Cardoso (2005), a desossa a quente imediatamente após a esfola e evisceração, e antes de qualquer resfriamento, é o meio mais efetivo de minimizar as perdas por evaporação e o tempo de resfriamento, mas é importante que a qualidade final de consumo não seja alterada devido ao endurecimento causado pelo encurtamento das fibras pelo frio.

A estimulação elétrica de carcaças tem sido utilizada com sucesso para melhorar a maciez e a qualidade da carne de bovinos, ovinos e perus. (JUDGE et al., 1989). Alguns mecanismos aparentemente trazem a produção de efeitos desejáveis. Além disso, combinando-se o resfriamento lento a utilização da estimulação elétrica, o efeito pode resultar em cortes mais macios (JUDGE et al., 1989).

Diante dessas afirmações, Cardoso (2005) estudou algumas condições de técnicas com o intuito de acelerar a conversão de músculo bovino em carne, particularmente a estimulação elétrica, o tipo de desossa e diferentes taxas de resfriamento e seu efeito sobre características físicas, sensoriais e bacteriológicas de músculos de importância econômica como Longissimus dorsi lumborum (LL-filé de lombo) e Semitendinosus (ST-lagarto).

A autora avaliou o efeito da desossa a quente e da temperatura de condicionamento na qualidade microbiológica da carne bovina embalada a vácuo, utilizando-se cortes desossados (grupo controle). Foi empregada a estimulação elétrica das carcaças após a sangria [diferença de potencial de 21V (rms), 0,25 A, 60Hz], alternando períodos de 5s com estimulação e 1s sem estimulação. Os músculos LL e ST, desossados a quente, foram embalados a vácuo e estocados por 10 horas a temperaturas de condicionamento de 15°C e 25°C.

Posteriormente, os cortes desossados a quente foram resfriados a 7°C e 3°C até a temperatura interna do músculo atingir 10°C e 5°C, respectivamente, seguindo-se estocagem a 0 ± 2°C por 14 dias para os cortes de lagarto e 35 dias para o contrafilé. Foram realizadas análises microbiológicas nos cortes de ST e LL, antes do acondicionamento a vácuo (tempo-0) e nos cortes maturados por 2, 7 e 14 dias a 0 ± 2°C.

Nos cortes de contrafilé dos tratamentos de desossa a quente, as análises também foram conduzidas 10 horas pós-morte e a 21, 28 e 35 dias a 0 ± 2°C. Foram avaliadas contagem total de bactérias psicrotróficas aeróbias, bactérias lácticas, coliformes totais, E. Coli, Pseudomonas sp., enterobactérias e clostrídios sulfito redutores. Os resultados deste estudo indicaram que carnes obtidas por meio de desossa a quente, realizada dentro de padrões rigorosos de higiene, não apresentaram características microbiológicas diferentes daquelas obtidas pela desossa convencional.

Cardoso, (2005) concluiu adicionalmente que a estimulação elétrica acelerou a glicólise do LL até a 8ª hora pós-morte, atingindo pH=6,0, muito antes de a sua temperatura chegar a 10°C. O tratamento com temperatura de condicionamento de 25°C resultou em LL com os maiores escores de maciez e menores forças de cisalhamento em todos os tempos avaliados (Tabela 01). No LL dos tratamentos empregando-se a estimulação elétrica, a maturação melhorou a maciez dos cortes. Para o músculo ST esse efeito foi muito menor, uma vez que todos os tratamentos resultaram em carnes mais duras.

Logo após a desossa, LL e ST desossados a quente, em geral, apresentaram-se mais escuros, quando comparados àqueles desossados a frio. O ST de carcaças estimuladas eletricamente e desossadas a frio foram mais claros que os dos demais tratamentos. Portanto, a desossa a quente, com ou sem condicionamento sob altas temperaturas, resultou em carnes com características sensoriais iguais ou superiores àquelas desossadas de forma convencional, com evidências de que o uso da estimulação elétrica foi imprescindível.

A carne de bovinos inteiros, em geral, é considerada mais dura, quando comparada a de bovinos castrados (FIELD, 1971). Assim, há uma atenção no sentido de melhorar especialmente o atributo de maciez de alguns cortes, utilizando-se técnicas, como a estimulação elétrica em carcaças.

Porém, não há um consenso observado, seguindo o uso da estimulação, tanto nas análises de maciez objetiva (força de cisalhamento), como nas análises subjetivas (painel sensorial). Tais disparidades poderiam ser explicadas pelas diferenças experimentais e pelo período de maturação. Embora menos freqüente, pesquisas de comparações realizadas 48 horas pós-morte e lados tratados e controle de bovinos inteiros e castrados têm apresentado resultados variados (CROUSE et al., 1985; VANDERWERT, 1986).

Além disso, têm sido encontradas diferenças entre a carne desses animais. Desde a década de 70, Valin et al. (1975) e Dumont (1974), citados por Gariépy et al. (1992), apresentaram resultados de alterações importantes na carne de bovinos jovens, ocorrendo já nos primeiros três dias de maturação. Também, não foi observada melhora na maciez dos cortes entre 8 e 16 dias, quando comparados a outros tipos de bovinos para o qual a carne foi cada vez mais macia. Ainda, Purchas (1972) observou que a carne de bovinos criptorquídeos teve melhor resposta a maturação, que a carne de novilhos. Este melhor efeito da maturação foi associado, segundo o autor, a uma maior circulação de testosterona, a qual poderia ter uma ação sobre as membranas lisossômicas.

Entretanto, Wu et al. (1985), observaram que a carne de novilhos apresentou um melhor efeito da maturação, que a carne de bovinos inteiros, baseando-se na maturação bioquímica, o qual se relaciona com a atividade de algumas catepsinas. O efeito da maturação também foi aumentado com o uso da estimulação elétrica. Posteriormente, Dutson et al. (1980) relataram que membranas lisossômicas de músculos de carcaças estimuladas eletricamente poderiam não ter sido rompidas, como evidenciou a distribuição das enzimas lisossômicas. Porém, a ausência do cold shortening, a não ruptura das fibras poderia ter sido um meio pelo qual a estimulação elétrica poderia ter amaciado a carne (MARSH, 1985, citados por GARIÉPY et al., 1992).

Nesse cenário, Gaspiépy et al. (1992), avaliaram algumas características (pH, atividade lisossômica, colágeno, cor, comprimento de sarcômero e maciez, dentre outras) de bovinos castrados e inteiros, submetidos à mesma dieta e abatidos com pesos similares. Um lado da carcaça foi estimulado (500V, 60Hz), enquanto o outro lado permaneceu sem estimulação (tratamento controle). Durante o estágio inicial de resfriamento das carcaças não foram constatadas diferenças no pH para as carcaças de bovinos inteiros e castrados.

Porém, durante o resfriamento, os lados estimulados tiveram menores valores de pH, quando comparados ao controle. Ainda, a estimulação elétrica reduziu a quantidade de enzimas lisossômicas. Foram encontradas diferenças entre sexo e estimulação para a característica de cor. Não houve diferenças de sexo e estimulação para a característica de comprimento do sarcômero. Por outro lado, a carne de novilhos apresentou menor força de cisalhamento (carnes mais macias), quando comparadas à carne de bovinos inteiros.

Contudo, não foram observadas diferenças na força de cisalhamento na carne de carcaças estimuladas e cortes maturados por 48 horas e no tratamento controle com cortes maturados por 6 dias. Assim, de modo geral, com base nas características de qualidade, os cortes maturados por 48 horas, de carcaças estimuladas, foram equivalentes àquelas carcaças não estimuladas com cortes maturados durante 6 dias.

Tabela 01. Médias e desvios padrões da força de cisalhamento do músculo Longissimus dorsi de bovinos no 2º, 7º e 14º dias pós-abate

Tabela 02. Médias e erros padrões de algumas características avaliadas de carcaças de bovinos castrados e inteiros estimuladas e cortes maturados 48 horas ou não estimulados e cortes maturados durante 6 dias


Considerações Finais

O emprego da estimulação elétrica em carcaças pode ser associado a desossa quente e ao condicionamento de cortes cárneos, consideradas técnicas aceleradoras da conversão do músculo em carne. Porém, deve-se considerar e respeitar as boas técnicas de fabricação na produção da carne.

A estimulação elétrica utilizada nas indústrias pode oferecer benefícios, inclusive econômicos, como redução do período de resfriamento das carcaças, do processo de maturação e melhora de alguns atributos de qualidade.

O uso da desossa a quente oferece benefícios em algumas propriedades funcionais da carne, benefícios à economia de espaço, energia, materiais, além da redução do tempo de obtenção da carne. Entretanto, assim como a estimulação elétrica, há necessidade de rigorosas práticas de higiene durante o processo de abate, desossa e acondicionamento dos produtos cárneos.

Referências bibliográficas

CARDOSO, S.C. Estimulação elétrica, tipo de desossa e taxas de resfriamento da carne bovina (MM. Longissimus lumborum e Semitendinosus): Efeitos em características físicas, físico-químicas, sensoriais e bacteriológicas. Tese (Doutorado). Faculdade de Engenharia de Alimentos, UNICAMP, Campinas, 2005.

CIA,G. et al. Desossa a quente da carcaça bovina estimulada: Efeitos sobre a qualidade da carne congelada. Coletânea do Instituto de Tecnologia de Alimentos, Campinas, SP, v.12, p.219-242, 1981/1982.

CROUSE, J.D.CROSS, H.R.; SEIDEMAN, S.C. Effects of sex condition, genotype, diet and carcass electrical stimulation on the collagen content and palatability of two bovine muscles. J.Anim Sci., v.60, p.1228-1234, 1985.

DUTSON, T. R. Relationship of pH and temperature to disruption of specific muscle proteins and activity of lysosomal proteases. J. Food Biochem., v. 7, p. 223-245, 1983.

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GARIÉPY, C. et al. Electrical Stimulation and 48 hours aging of bull and steer carcasses. J.Food Sci., v.57, n.3, p.541-544, 1992.

JUDGE, M.; ABERLE, E.D.; FORREST, J.C.; HEDRICK, H.B.; MERKEL, R.A. Principles of Meat Science. Dubuque: Kendall//Hunt, p.351, 1989.

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WU, F.Y. et al. Aging, index, lysossomal enzyme activities, and meat tenderness in muscles from electrically stimulated bull and steer carcasses. J.Food Sci., v.50, p.1025-1029, 1985.

WHITE, A. et al. Effect of electrical stimulation and temperature on hotboned beef. In: 49th International Congress of Meat Sience and Technology. Anais.Brasil, Campinas, p.159-160, 2003.

0 Comments

  1. Eduardo Pereira Dutra disse:

    Muito interessante este artigo Angélica.

    Um abraço

    Eduardo Pereira Dutra

  2. Bruno Ferrão da Silva Souza disse:

    Angélica seu artigo é excelente, fico feliz por ser seu colega de faculdade também sou formado na Unimar. Parabéns.

  3. Angela Aparecida De oliveira disse:

    Angélica, parabéns por ter realizado uma ótima pesquisa e apresentar um artigo muito bom.

  4. Aguinaldo Scheffer disse:

    Belo trabalho, parabéns Angélica.

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