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Impacto de ‘Brexit’ deve ser limitado; setor agrícola pode ter impactos importantes

Diferentemente das recentes crises nos mercados globais, o Brasil deve sofrer um impacto mais limitado decorrente da vitória dos votos pela saída do Reino Unido da União Europeia no referendo da semana passada – evento conhecido como “Brexit”.

A avaliação de analistas é que o país está hoje menos vulnerável a choques externos quando comparado com os pares emergentes, com a redução do déficit em conta corrente (1,70% do PIB em 12 meses), elevada taxa de juros, de 14,25% ao ano, participação menor dos estrangeiros na dívida pública e o maior nível de reservas internacionais da América Latina, com US$ 377 bilhões.

Nesse cenário, analistas de mercados emergentes veem o real no meio do caminho entre as divisas mais vulneráveis ao “Brexit”. Mas, apesar do “carry trade” alto (ganho com diferencial de taxa de juros) ser um fator que pode atrair investimentos externos em um cenário de estímulos monetários, isso vai depender da redução das incertezas políticas e melhora dos fundamentos domésticos.

A reação dos mercados locais na sexta, após o referendo no Reino Unido, refletiu essa perspectiva. O contrato DI (Depósito Interfinanceiro) para janeiro de 2021 subiu de 12,41% para 12,44% na BM&F. Já o dólar subiu 1,04%, para R$ 3,3782. Mas a queda do real foi bem menor que a de outros emergentes na sexta, como o peso mexicano (-3,47%) e o rand sul-africano (-5,05%).

Embora existam muitas dúvidas sobre os impactos políticos e econômicos do “Brexit”, o chefe de pesquisa de mercados emergentes do Deutsche Bank, Drausio Giacomelli, avalia que moedas de países emergentes da Europa, que têm ligações comerciais e bancárias com a UE, devem ser mais afetadas. Analistas citam o zloty, da Polônia, como uma das mais afetadas. No cenário de aversão a risco, divisas de países com alto déficit em conta corrente também são vistas como mais vulneráveis. Nesses grupo estão o rand sul-africano, a lira turca e o peso colombiano.

O chefe de estratégia para mercados emergentes do Société Générale, Guy Stear, cita também o peso mexicano como uma das divisas mais afetadas, porque tem maior liquidez e está exposta ao risco do candidato republicano, Donald Trump, ganhar a eleição presidencial nos Estados Unidos.

No caso do real, alta taxa de juros no Brasil pode limitar o impacto para a moeda, especialmente diante da expectativa de que bancos centrais globais podem voltar a afrouxar suas políticas monetárias para fazer frente à desaceleração da atividade econômica.

O referendo no Reino Unido pode levar o banco central americano a postergar a alta de juros nos EUA, o que poderia ser positivo para emergentes como o Brasil. Mas isso vai depender do crescimento da economia global e também da redução das incertezas no mercado local, como a conclusão do impeachment de Dilma Rousseff, esperado para agosto. “O real é razoavelmente vulnerável nesse cenário de aversão a risco, mas a moeda é mais afetada por questões locais”, diz Stear, do Société.

Giacomelli, do Deutsche, afirma que a atração de recursos para portfólio vai depender do Brasil melhorar os fundamentos e colocar a dívida em trajetória sustentável. Isso inclui, segundo ele, a aprovação de medidas fiscais, como a que limita os gastos do governo à inflação do ano anterior, e a reforma da Previdência.

“O Brasil tem capacidade de gerar retorno em renda fixa e pode ter um rali mais forte em um cenário positivo para mercados emergentes.” O banco está com visão “overweight” para Brasil (acima da média do mercado), mas menos positiva que no início do ano. Já em relação ao real, o Deutsche valia que é um ativo menos interessante, com o Banco Central podendo tolerar uma depreciação maior do câmbio.

Para a Capital Economics, a nova diretoria do BC deve ter uma postura menos intervencionista, mas pode voltar a atuar para suavizar movimentos de alta volatilidade do real. “Acredito que o BC deve seguir reduzindo o estoque de contratos de swap cambial tradicional”, diz. A Capital prevê dólar a R$ 3,70 no fim do ano.

O economista-chefe para América Latina do ING, Gustavo Rangel, também diz acreditar que o BC deve ser mais tolerante com a valorização do real. Ele vê espaço para o real se valorizar, “talvez a R$ 3,30, R$ 3,20”, até o fim deste ano.

Por ora, os profissionais evitam mudar o cenário-base para a evolução do câmbio e dos juros no Brasil. Mas admitem que uma desaceleração da economia global após o “Brexit” pode abrir espaço para o BC eventualmente antecipar cortes da Selic, especialmente se o dólar não experimentar nova rodada de ganhos ante o real.

O sócio do banco Brasil Plural e ex-diretor de política econômica do BC, Mário Mesquita, afirma que o “Brexit” é um choque de confiança negativo para a economia global, que pode retardar a saída da recessão e as autoridades aqui têm que levar isso em consideração na definição da política econômica.

O instrumento disponível para lidar com esse quadro, diz Mesquita, é a política monetária. “O BC vai decidir o que fazer após analisar os modelos e o impacto desse evento, mas a antecipação do corte de juros é uma possibilidade. A resposta tende a ser monetária, porque não temos hoje capacidade de fazer uma política fiscal contracíclica, nem uma política de crédito via bancos públicos”, diz.

Setor agrícola

Um estudo realizado pela União Nacional dos Fazendeiros do Reino Unido, em parceria com a Universidade Wageningen, indica que o Reino Unido contribuiu com 4,1 bilhões de euros ao CAP em 2015. Com a separação, os britânicos deverão perder subsídios agrícolas oferecidos pelo CAP, enquanto a compensação do governo britânico aos produtores locais deverá ser menor.

O Reino Unido também contribuiu com reformas para redução de subsídios que provocavam excesso de produção, afirma Wyn Grant, professor da Universidade de Warwick. Uma eventual retomada de políticas protecionistas poderia causar um excesso de oferta, pesando sobre as cotações e reduzindo a renda dos produtores.

Já a consultoria BMI Research aponta que a saída britânica do bloco deverá ter um impacto “substancial” nas exportações agrícolas do Reino Unido. “Em relação ao comércio bilateral, a União Europeia é a principal parceira do setor agrícola britânico, e o Reino Unido deverá perder o livre acesso ao mercado único quando a saída for consumada oficialmente”, indica a consultoria. As importações também deverão subir, provocando um maior pressão inflacionária.

A BMI ainda afirma que os preços de terras agrícolas deverão ter impacto negativo pela decisão de saída, com queda nos investimentos. “Além da retração dos subsídios, o ‘Brexit’ tem o potencial de provocar uma consolidação do setor agrícola britânico, já que a receita e valor das terras deverá cair, expondo as operações mais vulneráveis financeiramente. O custo de contratação de trabalhadores rurais, a maioria do leste europeu, também deverá subir com novas políticas migratórias, indica a BMI.

Fonte: Valor Econômico e Estadão, adaptada pela Equipe BeefPoint.

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