Síntese Agropecuária BM&F – 07/08/03
7 de agosto de 2003
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11 de agosto de 2003

Hormônios na reprodução de gado de corte

Uma visão geral dos hormônios

O produtor e o técnico têm assistido, nos últimos anos, uma verdadeira avalanche de novos produtos veterinários. De fato, nosso arsenal terapêutico melhorou sensivelmente na última década. Dentre vários, são novas classes de antibióticos, de última geração, antiinflamatórios potentes, mais seguros, uma gama de novos antiparasitários e substâncias hormonais.

Com relação aos hormônios, a revolução foi ainda maior. Vários tipos de produtos que há bem pouco tempo eram disponíveis apenas no mercado internacional, hoje têm representantes no Brasil ou são produzidos por aqui. Esta palavra “hormônio” geralmente não é bem vista pela maioria das pessoas. Este temor deve-se principalmente pelo fato que pessoas com pouca informação tendem a pensar que se tratam de substâncias que produzem efeitos adversos ou colaterais e que colocam em risco a saúde dos animais e da população. Isto ocorre porque, quando se fala de hormônio, vem à mente das pessoas alguma das substâncias utilizada para promover ganho adicional em bovinos. De fato, algumas destas substâncias, que inclusive têm seu uso proibido no Brasil podem levar a reações indesejáveis nos animais e humanos que consumam a carne.

Embora entendendo a que exista esta restrição contra as substâncias hormonais, o temor pelo uso destas, de forma generalizada, não é justificável. Existe uma grande quantidade de produtos que contem substâncias hormonais, que são amplamente utilizados, na maioria das vezes sem que se saiba que se trata de um hormônio.

Os hormônios, de forma geral, são substâncias extremamente seguras, que tem um mecanismo de ação específico no organismo. Os produtos hormonais possuem substâncias iguais ou semelhantes a outras existentes no organismo do animal. Portanto, os hormônios já existem, pois são produzidos pelas próprias células do corpo. É classificado como hormônio qualquer substância que seja produzida por um tipo de célula e age de alguma forma em outra célula. No nosso organismo e também dos animais existem dezenas, centenas de hormônios, se exercem as mais diferentes funções, coordenando o correto andamento das atividades vitais.

Para qualquer hormônio exercer seu efeito, é preciso que ele “se encaixe” na célula onde ele vai atuar, num local conhecido como “receptor”. Portanto, para que a ação de qualquer hormônio ocorra, é necessário que existam receptores nas células onde ele vai atuar. Geralmente, do local de produção, ao local de atuação, o hormônio é levado pela corrente sangüínea.

Hormônios da reprodução

O funcionamento sistema reprodutivo tanto da fêmea como do macho é coordenado pela ação de vários hormônios. Somente na fêmea se conhece dezenas de substâncias hormonais, produzidas por diferentes órgãos, que agem sobre o sistema reprodutivo, num esquema complexo de inter-relações.

Como é regido por hormônios, alguns distúrbios do aparelho reprodutivo da fêmea podem e devem ser tratados com produtos que contenham estas substâncias. Além disto, pode-se utilizar algumas substâncias para alterar, de forma benéfica a manifestação de cio, no sentido de melhorar a eficiência reprodutiva.

Como já mencionado, os hormônios são substâncias que agem de forma muito específica. A indicação do uso adequado deles depende de um profundo conhecimento sobre a fisiologia reprodutiva e de um exame detalhado do animal que vai receber a medicação. Alguns hormônios afetam a produção ou atividade de outros, e quando não corretamente utilizados podem além de não levar ao resultado esperado, causar outros problemas.

Por esta característica de cada hormônio ser indicado para determinadas situações, não é concebível o uso de qualquer um deles de forma generalizada. A indicação é muito específica e o animal deve ser cuidadosamente avaliado, para que se saiba se realmente o produto irá fornecer os resultados desejados. Da mesma forma, não se recomenda a utilização de hormônios para corrigir falhas de manejo, como problemas nutricionais, falha de detecção de cio e outras. Assim, relacionados á reprodução, não existem hormônios recomendados para utilização em todos os animais do rebanho, de uma única vez. Deve-se avaliar quais os animais que realmente necessitam de tratamento, pois desta forma a economia é substancial, visto que o preço destes produtos é relativamente elevado.

Terapia hormonal em reprodução de fêmeas bovinas

São vários os problemas reprodutivos que acometem as fêmeas bovinas. Todos eles porém, basicamente levam à manifestação de um dos sintomas a seguir: a fêmea não manifesta cio ou apresenta o cio e não fica gestante. Generalizando, ou a fêmea não apresenta cio (situação conhecida como anestro) ou apresenta cios demasiadamente (por não ficar gestante). Ambas situações podem ser decorrentes de uma gama de problemas. Cabe ao Veterinário descobrir a origem da situação anormal que ocorre em cada animal.

Vamos discutir algumas possibilidades de tratamento com hormônios destas situações acima.

As vacas em anestro (não manifestam cio), ou seja, que não manifestam cio, são facilmente encontradas em qualquer rebanho. Geralmente ocorre em animais em lactação. A principal causa está relacionada a problemas nutricionais. Como é de conhecimento geral, vaca magra não manifesta cio. Quando é esta a causa do problema, nenhuma terapia hormonal pode ajudar. Por se tratar de uma falha de manejo, a resolução do problema deve ser feita diretamente na causa, ou seja, correção da nutrição dos animais. A utilização de medicamentos para corrigir esta situação, onde o problema é nutricional, apresenta péssimos resultados, além de um custo bem mais elevado que a correção da causa, no caso a nutrição.


Outra situação que leva a uma situação de anestro é a falha na observação de cio. Pode parecer estranho, mas é uma causa importante de perda de eficiência reprodutiva, principalmente em propriedades que utilizar a inseminação artificial. Vários estudos demonstram que não se observa (se perde) cerca de 30% dos cios. Em rebanhos que não são bem manejados a perda é maior. Nestes casos é possível a utilização de hormônios. Um seria a prostaglandina e o outro os implantes de progesterona, que são utilizados para sincronizar o cio do animal. Sincronizar o cio seria fazer o animal manifestar estro em um período desejado. Note que isto é possível pois o animal já está em atividade reprodutiva (já deu cio antes), o que ocorre é que não está sendo observado. Cabe novamente ao veterinário indicar quais são estes animais e prescrever o tratamento. Simultaneamente deve-se corrigir a observação de cios, pois caso contrário, o cio sincronizado pode não ser observado.



Quando existe alguma patologia no útero do animal que prejudique a manifestação do cio, também é indicada a prostaglandina. Nestes casos, o problema uterino está prejudicando a produção normal desta substância, que é importante para os ciclos estrais.

É imprescindível um exame ginecológico prévio do animal, antes de se optar pelo tratamento. Animais com problemas nutricionais graves não respondem, á terapia hormonal, como já dito. Além do mais, caso exista uma gestação não conhecida, que por sinal é uma causa de anestro, estes produtos certamente vão causar aborto.

Os cistos ovarianos também podem ser causa de não manifestação de cio. Esta patologia é mais encontrada em vacas leiteiras e ocorre devido a um distúrbio hormonal que leva a uma falha na ovulação, impedindo a ocorrência da gestação. Nestes casos, quando diagnosticado, o cisto pode ser tratado de duas formas. É indicada a aplicação de um produto á base de um hormônio chamado GnRH (ou análogos sintéticos) ou de implantes de progesterona.


Considera-se eficiente o tratamento que conseguiu retornar o animal à manifestação de cio em intervalos normais (de 18 a 23 dias). Algumas vezes, em situações mais graves, os cistos ovarianos podem levar á alteração de comportamento das fêmeas. Um dos distúrbios é conhecido como ninfomania. Nestes casos, a vaca exibe sinais de cio em períodos irregulares (menos de 21 dias) e geralmente fica um dia inteiro ou até mais aceitando a monta.

Uma outra alteração de comportamento decorrente dos cistos ovarianos é a chamada masculinização. As vacas com este sintoma apresentam comportamento tipicamente masculino. Além do comportamento, tendem a ficar mais agressivas, raspar o chão com os membros dianteiros e mugir como um macho. Quando os sinais persistem por um tempo razoável é possível inclusive notar alterações no corpo da fêmea, que gradativamente vai assumindo aspectos de touro. Os membros anteriores e pescoço tendem a aumentar a massa muscular. Embora estas últimas manifestações referentes aos cistos ovarianos sejam mais perceptíveis, na maioria das vezes, as fêmeas com esta patologia manifestam anestro, como já mencionado.

Além destas situações discutidas, existem muitas outras onde a terapia hormonal é benéfica ou necessária. Em todos os casos, ela deve ser prescrita por um profissional competente para tal. Para simplificar, faremos um quadro das indicações potenciais, limitações e restrição de uso de alguns dos principais produtos hormonais disponíveis em veterinária.


Bibliografia Consultada

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FERNANDES, C.A.C. Alternativas para tratamento de retenção de placenta em gado de leite. A Hora Veterinária, v.111, p.67-69, 1999.

FERNANDES, C.A.C. FIGUEIREDO, A.C.S. doses e vias de aplicação de cloprostenol sódico* para sincronização de estro em novilhas. Viçosa, MG, 2000. In: XXXVII REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA. Anais… Revista Brasileira de Zootecnia, 2000, p.161.

1 Comment

  1. Luiz Henrique Celani disse:

    Parabenizo o Prof. Carlos Fernandes pelo excelente artigo, uma vez que muitos técnicos e produtores desconhecem esta técnica de fundamental importância para aumentar a eficiência reprodutiva.

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