Encarado como um embrião para amenizar problemas causados pelo endividamento agrícola, o governo estuda criar um “Fundo de Aval Solidário” para viabilizar um renegociação de dívidas de até R$ 5 bilhões do setor rural com bancos e fornecedores. A iniciativa, em um primeiro momento, busca facilitar o acesso de produtores rurais ao ” BNDES Pro-CDD AGRO”, linha criada em 2018 com aporte do mesmo montante.
Até agora, essa linha teve baixa adesão por conta da percepção de risco elevado pelos bancos repassadores e também pelo fato de os produtores consideraram os juros altos.
O fundo ainda precisa ser finalizado pelo governo, mas a ideia é futuramente massificar o modelo para todo o setor agrícola, que é considerado uma atividade de alto risco.
Se for bem sucedida, a iniciativa dará maior poder de negociação para os produtores rurais com seus credores, avaliou o subsecretário de Política Agrícola e Meio Ambiente da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, Rogério Boueri, em entrevista ao Valor.
Além disso, explicou o secretário, será um passo no desenvolvimento de um sistema de financiamento ao agronegócio mais calçado no mercado, com juros livres mais baixos e menor risco.
Boueri vem negociando a criação do fundo com representantes de cadeias produtivas do agronegócio. Ele afirmou que recebeu sinal positivo de interlocutores, inclusive da cadeia de fornecedores. A proposta já foi apresentada à bancada ruralista, a entidades de produtores e também ao Ministério da Agricultura.
A linha para renegociação de dívida do BNDES tem juros de TLP mais 4,5% ao ano (1,5% do BNDES e 3% do banco operador). Até hoje, essa linha teve apenas um contrato de financiamento, no valor de R$ 30 milhões. Ela não conta com equalização do Tesouro, prevê 12 anos para pagamento e carência de três anos.
A ideia do fundo de aval é estimular a criação de consórcios com até dez produtores que possam oferecer aos bancos um grande “colchão” com três camadas de garantias, equivalentes a 10% do valor total do financiamento. Enquanto os agricultores depositariam 4% do valor do financiamento almejado, seus fornecedores (bancos, tradings, agroindústrias) entrariam com outros 4% e o BNDES com mais 2%.
A ideia é que as garantias sejam executadas de forma progressiva em caso de inadimplência, ou seja, a segunda camada só seria acionada se a inadimplência demandasse execução de mais de 4% do valor depositado de garantias.
“Com o fundo oferecendo uma garantia a mais, os produtores conseguiriam reduzir riscos e os bancos vão olhar com outros olhos para a operação”, disse Boueri. “É uma inovação que pode depois ser estendida para outras operações de crédito rural que não sejam de renegociação de dívidas. Estamos também buscando soluções para o crédito rural aproveitando a taxa Selic baixa e as novas diretrizes de governo. Achamos o fundo interessante”, afirmou.
Atualmente, quando há frustrações de safra por conta de intempéries, o Tesouro socorre os produtores injetando dinheiro nas operações de renegociação de dívidas contraídas com crédito rural a juros controlados. Essa é uma realidade que a equipe de Paulo Guedes quer combater.
Mas a criação do fundo não será uma tarefa fácil, sobretudo porque prevê a participação dos “credores” dos produtores. “Já acionamos elos da cadeia produtiva agrícola. Nenhum deles afirmou que vai entrar, mas todos gostaram da ideia”, afirmou o secretário do ministério.
Na visão da Secretaria de Política Econômica, o sistema de aval sobrecarrega menos os bancos em termos de exigência de provisões e capital. Isso abriria espaço para uma redução da taxa de juros que os bancos repassadores cobram na linha do BNDES, num primeiro momento.
Essa expectativa é a que mais agradou segmentos do setor agropecuário. A Aprosoja Brasil, associação que representa os produtores de soja, e a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) se manifestaram a favor. “Com o fundo, a ideia é que a linha do BNDES possa até ser ampliada. Com esse recurso, o produtor pode quitar seus credores e se habilitar para tomar crédito novo”, disse o deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS), coordenador da comissão de endividamento agrícola da FPA.
Fonte: Valor Econômico.