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A evolução do mercado de carnes de qualidade é um trabalho de muitas mãos – Paulo Whately

Paulo Whately, leitor do BeefPoint, comentou o artigo Alguma ligação entre esses 4 acontecimentos da pecuária?, de Miguel Cavalcanti.

Confira o comentário abaixo:

Oi Miguel,

Parabéns pelo seu trabalho no BeefPoint!!

Sempre fui ligado à pecuária de alguma forma, mas há pouco mais de um ano acompanho de perto os trabalhos da Vila Beef em Ribeirão Preto-SP onde estamos na ponta mais próxima ao consumidor comercializando carnes nobres de projeto gerenciado pela Beef&Veal.

Nestes 15 meses de comercialização de carnes, identificamos 2 reclamações de carnes com cheiro forte que foram trocadas aos clientes após a comunicação. Poderão existir outros clientes que eventualmente não tenham reclamado (o que é muito pior, pois provavelmente não voltarão a comprar) e não ficamos sabendo, mas de qualquer forma considero um índice muito baixo de problemas, considerando um produto perecível e com muitas variáveis em sua produção.

Não conseguimos identificar quais os motivos do problema mas acredito que neste caso, sendo os produtos fornecidos com o controle da Beef &Veal, podemos estar diante de alguma falha no processo, alguma carcaça que não seguiu o fluxo de sua produção adequadamente. Pelo pouco que conheço da cadeia da carne, com certeza em nosso país não podemos generalizar ou classificar nossa produção face à sua heterogeneidade.

Das regiões mais distantes do centro sul (nordeste, centro-leste) em locais mais afastados pude observar a comercialização da carne de forma muito rudimentar, carcaças sendo transportadas em veículos abertos, exposição em feiras a céu aberto por várias horas sem nenhuma refrigeração, mas que atendem às necessidades do consumidor local, até a Feed em São Paulo a distância é muito grande.

A mesma distância podemos observar na produção da carne desde carcaças sem nenhuma identificação de raça até os mais desenvolvidos conceitos de genética e produção, industrialização e comercialização. Poderia dizer que nosso consumidor de carne também tem extremos de exigências mesmo que participando do mesmo mercado e da mesma classe social. Se compararmos a cadeia da carne com a cadeia do café sempre ouvimos dizer que a do café é muito mais evoluída, já existem uma grande variedade de tipos de café, sabores diferenciados etc etc , e que a carne deverá seguir o mesmo caminho, sem falar na cadeia do vinho.

Hoje vejo que esta evolução na carne de qualidade no Brasil será muito lenta, pois toda a cadeia deverá ser recriada. A pouca disponibilidade de carne de qualidade, o pequeno número de projetos de carnes premium consistentes em nosso país e a cultura da carne de qualidade pelo lado do consumidor exigirá muito trabalho e tempo de educação e informação a este consumidor.

Mostro abaixo algumas observações feitas nestes 15 meses de acompanhamento no varejo de carnes nobres em Ribeirão Preto, uma cidade que pode representar uma amostragem de um mercado evoluído do país em função de sua cultura e poder aquisitivo da população:

– Conheci pessoas que são apreciadores de carnes, que são conhecidas por fazerem um bom churrasco, consomem carne bem acima da média, mas não são fiéis à marca, à procedência, desconhecem a cadeia da carne e não se interessam por ela. Foram poucas vezes à loja e outros já ouviram falar, mas nunca foram fazer uma visita. Procuram oportunidades, promoções em supermercados e não estão muito preocupados com a qualidade. De vez em quando erram e comem carne ruim. Voltando ao café, posso me incluir neste tipo de consumidor, sou apreciador de café, consumo uma quantidade razoável, leio sobre o assunto, mas não tenho motivação para comprar um café de custo e qualidade superior. Então me pergunto o que é preciso fazer para que eu possa vir a ser um consumidor gourmet de café? Acredito que será mais fácil meu filho ser um apreciador de café gourmet. 

– Por outro lado se compararmos o mercado de carne bovina gourmet com um eventual mercado de carne de frango gourmet, acredito muito mais no mercado bovino, pela nossa cultura de consumo.

– Com relação ao consumo de carne do dia a dia de qualidade, poderia dizer que este mercado também é muito complexo. A loja Vila Beef se localiza em frente a dois condomínios de alto poder aquisitivo onde as famílias com certeza devem consumir uma boa quantidade de carne e não se importariam em pagar um pouco mais por muita qualidade. Muito poucos moradores tiveram a curiosidade de ir conhecer a loja de forma espontânea, não há interesse. Em muitas casas as compras de mantimentos são feitas por funcionários e não pelos consumidores dos produtos. Neste caso, a abertura do mercado exige um direcionamento diferente, um trabalho focalizado nos proprietários das casas e em seus funcionários, não só de divulgação mas também de informação e conscientização. Se preocupam, sim, quando vão fazer um churrasco e têm a necessidade de agradar ou surpreender seus convidados.

– A força do hábito: ” … Olha , uma hora eu passo lá para conhecer, mas já compro há 10 anos no açougue do Zezinho, ele já sabe o que eu consumo na semana e nem preciso ir até lá…” O Zezinho presta um bom serviço, mas não se sabe de onde vem sua carne.

– Em um restaurante de bom nível da cidade, após uma entrega de alguns produtos enquanto esperava pelo cheque de pagamento ouvi do comprador o comentário:  “sua carne não é proveniente de Minas, né? Porque não compro carne de gado de Minas, tem muita montanha e a carne é muito dura, pois o boi faz muita força para caminhar, a não ser filé mignon, que é igual em qualquer boi”. Como enfrentar tamanho desconhecimento?

– Em outro restaurante, em conversa com o chef que é reconhecido nacionalmente e deve comprar somente de fornecedores qualificados me foi perguntado sobre a procedência e qualidade do nosso filet mignon, pois a qualidade de seu tradicional fornecedor não tem um padrão, ” … Tenho recebido algumas remessas que não estão macias…” O mercado exige qualidade e padrão.

– Vejo clientes apreciadores de carne, comentam pratos de restaurantes, gostariam de saber fazer um churrasco, mas tem receio, não sabem cozinhar etc. Muitos destes só compram picanha. Falta educação, disponibilizar cursos, informações.

– Observo outros clientes qua já são fiéis, plenamente convencidos da qualidade da nossa carne e divulgadores da marca.

– Já fizemos neste início de operação aproximadamente 50 eventos na loja de degustação de carne com na média 10 a 15 pessoas cada um que nos levaria a dizer que 600 pessoas experimentaram nossas carnes, aprovaram a degustação mas muitas nunca retornaram à loja. (É o meu caso no mercado de café, se participar de um evento, vou gostar mas talvez não volte a comprar)

– Existe luz além da picanha: Hoje se me perguntassem na Vila Beef : “Escolha um kilo de carne de graça para fazer um churrasco amanhã ”, acho que escolheria o miolo do acém ou o miolo da paleta. A picanha seria a minha última opção. Demorou um tempo, mas hoje o corte mais vendido em peso na loja é o miolo do acém. Novos clientes afirmam que vão levar para experimentar fazer carne de panela, um pecado, mas quem experimenta na grelha dificilmente deixa de voltar a levar. Educação, informação e experiência é o caminho.

Poderia aqui me alongar e discorrer sobre quais as possibilidades de sucesso para uma loja de carnes de qualidade no momento atual, mas fica para uma outra oportunidade.

Se compararmos nosso mercado de carne de qualidade com sua diversidade e peculiaridades com mercados mais desenvolvidos de outros países, vejo que estamos engatinhando e levará muito tempo para conseguirmos evoluir a patamares de quantidades consideráveis.

A consistente campanha do Friboi em sua divulgação com foco na garantia de qualidade de sua carne, apesar de contribuir para a credibilidade do mercado em geral, não atinge o mercado gourmet, pois a marca tem produtos de diferentes qualidades. 

A evolução do mercado de carnes de qualidade é um trabalho de muitas mãos, a começar pelos produtores, indústria, governo, associações e varejo, um grande desafio!

O BeefPoint desempenha parte importante neste processo.

Abraços a todos

Clique no link abaixo e confira o artigo na íntegra e demais comentários:

Alguma ligação entre esses 4 acontecimentos da pecuária?

6 Comments

  1. Ricardo disse:

    Muito bom o comentário, inclusive me despertou o interesse em degustar ambas as partes (miolo do acem e da paleta).

  2. Rogerio Satoru Uenishi disse:

    Caro Paulo Whately, caro Migel Cavalcanti, em primeiro lugar gostaria de parabenizar os dois pelo empenho e excelente trabalho que desenvolvem na pecuaria bovina. Sabe Paulo, acho que tudo que voce descreve tem fundamento no dia a dia mas da mesma forma que muitas vezes compara a carne bovina ao café, a minha mãe que tem 75 anos e que sempre gostou de café mas por muitas decadas consumiu café comum hoje se nega a consumir café que não tenha procedencia e a procedencia na maioria das vezes está ligado a fazenda que produz seu proprio café e comercializa.
    Bom, nós abatemos e comercializamos carne de 6 a 8 bois wagyu 100% puro por mês e faturamos em média R$ 12.500,00/boi; comercializamos 30% do volume para restaurantes e 70% para consumidor final que vem comprar na nossa fazenda aonde temos uma “casa de carne” e posso afirmar que temos clientes que vem de fusca a clientes que vem com porche ou outras marcas de carro super luxo… Acho que muitos retornam para comprar novamente… CARNE DE QUALIDADE: Ainda temos muito a aprender e estamos longe do ideal mas tudo começa com escolha de genetica, acasalamento direcionado, mamada controlada, confinamento longo, tudo muito além da porteira do açougue…
    Abraço, Rogerio Satoru Uenishi

  3. Marcos José Silva disse:

    Muito boa a critica, mais esqueceu do fundamental que é sempre começar do começo. Até quando não parar de ver a carne só na gondola do supermercado, e sim começar a ver quando nasce o bezerro até o consumidor final vamos ficar só nisso em meras criticas…
    Um grande abraças a todos, Marcos José Silva fundador da empresa agrotec tecnologia para o agronegócio.

  4. José Tadeu Dantas Leite disse:

    Caros Paulo Whately e Miguel Cavalcanti. Excelente artigo e muita explanação sobre o assunto carne e valor agregado. Muito boa a comparação sobre o mercado da carne e do café. Realmente é muito difícil quebrar paradigmas.Existe pessoas que tem poder financeiro para pagar por qualidade, mas as vezes por comodismo, prefere permanecer adquirindo o seu produto ( carne, café, … ) no local onde foi habituado comprar sempre.
    É difícil mudar hábitos, porém, precisamos continuar desenvolvendo técnicas para fazer com que os produtos Premium tenham o seu verdadeiro lugar no processo mercadológico.

  5. Alisson disse:

    Excelente texto Paulo, venho acompanhando sua loja pelas redes sociais, moro em Bauru e vou me esforçar pra passar ai é prolongarmos esse papo! Abraços

  6. Carlos Dornellas disse:

    Parabéns pelo texto Paulo. Sou proprietário das lojas Del Ganado com consultoria da Beef & VeaL em Bauru e Jaú, e estamos tentando quebrar todos esses paradigmas por aqui e atrair cada vez mais clientes da carne de altíssima qualidade. Ja enxergo um feedback positivo por parte do consumidor e cada vez mais estamos conseguindo levar a nossa carne à casa de bauruenses e jauenses. Fica o convite á você Alisson para nos fazer uma visita e batermos um papo. Abraço

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