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Eficiência do florfenicol para tratamento sistêmico de infecções uterinas agudas em bovinos

Introdução

A infecção uterina puerperal é de elevada ocorrência em bovinos, principalmente após algum distúrbio de parto. É descrita principalmente em vacas leiteiras, porém também ocorrem em vacas de corte.

Os efeitos na performance reprodutiva futura dos animais acometidos são descritos em vários trabalhos, e incluem retardo no reinício da atividade ovariana cíclica e involução uterina, redução no escore corporal, maior incidência de infecções uterinas pós-puerperais, e aumento no número de serviços por concepção.

Os principais efeitos deletérios causados por esta condição dizem respeito a um retardo na involução e uma maior contaminação uterina, ambas condições decorrentes da permanência dos anexos fetais por períodos acima dos normais no interior do útero, cérvix e vagina.

A retenção de placenta normalmente é o principal distúrbio pós-parto que acarreta e infecção uterina puerperal. Quando a placenta não é expulsa dentro de 48 horas, esta sofre uma progressiva putrefação e um processo de liquefação. Estes processos predispõem a multiplicação das bactérias que juntamente com a putrefação dos anexos fetais diminuem a atividade do miométrio, levando á inércia uterina. O processo normal de involução uterina pode ocorrer mesmo na presença de bactérias, que em condições normais, são eliminadas dentro de 2 a 3 semanas quando a contaminação não é exagerada.

A proliferação excessiva de bactérias nos casos de retenção de placenta leva a infecção retardando a involução do útero, que é imprescindível para o restabelecimento dos ciclos estrais. Um fator agravante é que o principal mecanismo de defesa uterina, a fagocitose bacteriana, está diminuído em casos de retenção de placenta.

Animais que tiveram problemas de parto são mais acometidos de outros problemas pós-parto em relação aos animais com parto normal. Considerando tal afirmação, o tratamento deveria combater além da excessiva proliferação bacteriana, estimular a involução uterina. A eficiência dos tratamentos poderia ser mensurada pela fertilidade futura dos animais, visto que as condições decorrentes da infecção uterina puerperal poderiam interferir na vida reprodutiva futura dos animais afetados.

Um bom tratamento deveria controlar a proliferação bacteriana, evitando sinais sistêmicos de infecção e dando condições para que a involução uterina se processe sem maiores anormalidades, auxiliando com isto na remoção do material contaminado. As drogas para tratamento desta condição, ou seja, uma infecção de curso agudo, causada por uma flora mista, e que depende de tratamento rápido e eficiente, devem apresentar amplo espectro de ação, formação de níveis circulatórios da droga rapidamente após a aplicação, e difícil aparecimento de cepas resistentes.

O florfenicol é uma droga utilizada recentemente em medicina veterinária. Trata-se de um antibiótico da família dos fenicóis, da qual também faz parte o cloranfenicol. O primeiro apresenta uma grande vantagem sobre o último principalmente pela ausência comprovada de efeitos indesejáveis, principalmente a anemia aplásica. O florfenicol possui estrutura semelhante ao cloranfenicol, obtido pela substituição do radical nitro pelo metil sulfonil, e também pela substituição de um radical hidroxila por um flúor. Esta molécula formada, além de mais segura, apresenta menos problemas de resistência. Trata-se de uma droga de amplo espectro de ação, agindo especificamente na síntese protéica bacteriana, na fração 70s do ribossomo bacteriano.

O presente trabalho objetivou a verificação da eficiência do Florfenicol no tratamento de infecções uterinas puerperais, além de mensurar a eficiência reprodutiva futura dos animais tratados.

Material e métodos

O trabalho foi desenvolvido na região em 2 fazendas de gado de corte localizadas no Sudoeste do Estado de Minas Gerais, no período de outubro de 2003 a março de 2004. Durante este período foram avaliadas e identificadas 60 vacas (nelore ou aneloradas) apresentando a condição de infecção puerperal, determinada pelo histórico, exame clínico geral e especial (palpação retal e vaginoscopia). Os animais afetados receberam dose única de 40 mg de Florfenicol (Nuflor-Schering Plough-Coopers) /Kg de peso vivo (2 mL do produto para cada 15 Kg de peso vivo), em dose única via subcutânea, divididos em dois locais de aplicação, no dia em que foi caracterizada a condição de infecção puerperal.

Foram avaliadas as seguintes variáveis: Incidência de infecção uterina pós-puerperal, aos 30 dias pós-parto, via vaginoscopia. Na data deste exame foi determinada por inspeção visual o escore corporal dos animais, classificando-se os mesmos numa escala de 1 a 5. Posteriormente, para cada animal foram calculados os seguintes índices de performance reprodutiva: número de dias do parto ao 1o estro, numero de dias até a concepção e o número necessário de serviços por concepção.

Resultados e discussão

Não foram observados óbitos nem presença de sintomatologia sistêmica de infecção, como febre, anorexia ou prostração, em nenhum animal após a aplicação do produto. Estes achados demonstram primariamente um efeito benéfico da droga utilizada em combater a proliferação bacteriana excessiva e seus efeitos, geralmente encontrada em animais com infecção puerperal. O aparecimento de sinais sistêmicos de infecção não é raro, devido a grande capacidade absortiva do útero durante a fase puerperal, onde facilmente os produtos pirogênicos e mesmo as toxinas bacterianas ganhariam facilmente a circulação sanguínea do animal. Os resultados relativos à cura clínica e a performance reprodutiva futura estão expressos na tabela 1.

Tabela 1. Eficiência do Florfenicol e Ceftiofur Sódico para tratamento de infecções uterinas puerperais em vacas de corte e índices de performance reprodutiva posterior.


Os resultados demonstram que o produto é eficiente no tratamento da infecção puerperal em vacas de corte. Como não foram registrados problemas relativos a sinais sistêmicos de infecção pode-se definir que a dose e o esquema de aplicação também foram apropriados.

Os índices relacionados ao período de anestro pós-parto e escore corporal médio 30 dias pós-parto mostram que mesmo quando presente, a infecção uterina remanescente ao tratamento não prejudicou de forma mais intensa a involução uterina e o desempenho reprodutivo do animal.

Os efeitos na performance reprodutiva futura dos animais acometidos são descritos em vários trabalhos, e incluem retardo no reinicio da atividade ovariana cíclica e involução uterina, redução no escore corporal, maior incidência de infecções uterinas pós-puerperais, e aumento no número de serviços por concepção. A proliferação bacteriana, em ambos os grupos, assim como as lesões uterinas, provavelmente não foram tão grandes, a julgar pelo intervalo ao reinício da atividade ovariana pós-parto e o número médio de serviços/concepção posterior, que se encontra dentro de limites aceitáveis.

Embora os animais tratados não exibam uma performance reprodutiva ideal, estes resultados demonstram uma eficiência razoável para vacas acometidas com este tipo de patologia. Desta forma, o custo mais elevado destas drogas poderia ser compensado pelo seu maior benefício, no sentido de uma maior atenuação dos efeitos danosos da infecção uterina puerperal.

Conclusões

A droga utilizada é eficiente para tratamento via parenteral da condição de infecção uterina puerperal em vacas de corte.

A posologia executada é capaz de prevenir o aparecimento de sintomas sistêmicos de infecção nos animais tratados.

A eficiência do medicamento, mensurada pela performance reprodutiva futura dos animais poderia compensar seu custo mais elevado.

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0 Comments

  1. Charles André Souza Bispo disse:

    Caro Dr. Carlos,

    Gostaria de entender melhor a eficiência do tratamento com Florfenicol, uma vez que no artigo não foi mostrado nenhuma comparação com um tratamento controle, nem quanto a via de aplicação. Obrigado pela atenção.

    Resposta do autor:

    Caro Charles

    A eficiência está relacionada a baixa ocorrência de sintomatologia sistêmica e de problemas reprodutivos futuras, como pode ser observado no artigo. É de conhecimento pleno e amplamente divulgado na literatura, que além de levarem a risco de vida ao animal, as infecções puerperais em gado de leite levam a uma séria de sintomatologias que vão deste hipertermia, passando por anorexia, distúrbios alimentares e prostação. Concordo que o grupo controle poderia fornecer alguma informação adicional, porém num trabalho como este, que lidamos com uma patologia que coloca de forma concreta em risco a vida do animal, além de impossível na prática (os proprietários não iriam admitir) seria no mínimo irresponsável, em condições de campo, deixar de tratar algum animal.

    Por outro lado, não foi nosso objetivo, neste trabalho em questão, comparar com outro tratamento.

    Um abraço

  2. João Daniel Kreling Chibiaque disse:

    Prezado Dr Carlos,

    Sei que não é o objetivo do presente trabalho mas, qual a eficiência do Florfenicol no tratamento de infecções uterinas crônicas?

    Obrigado!

    Resposta do autor:

    Caro João Daniel,

    Não temos dados precisos sobre isto. Quando você se refere a infecções crônicas fala de útero já involuído? Se for este o caso, pode ser usado o florfenicol por via local na dosagem de 3g por infusão uterina num volume de 50 a 60 ml. Procure diluir o produto em água destilada, pois em salina ele tende a precipitar. Evite produtos combinados com anti-inflamatórios

    Um abraço,

    Carlos

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