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O Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose
18 de dezembro de 2003

Efeitos da presença de silagem deteriorada na alimentação de bovinos

Por Thiago Fernandes Bernardes1 e Gustavo Rezende Siqueira2

A baixa produção animal na maioria das situações tem sido associada à restrita qualidade do volumoso utilizado na alimentação. Segundo Collins & Fritz (2003), qualidade de forragem é relacionada com desempenho do animal e consumo de energia digestível. Entretanto, quando se trabalha com alimento conservado, como é o caso da silagem, além dos mecanismos de digestão e metabolismo, outros fatores como as interações entre as características químicas, fermentativas, microbiológicas e físicas da forragem devem ser consideradas na determinação da qualidade do volumoso.

A inobservância dos processos de oxidação de nutrientes pelos microrganismos aeróbios, e a conseqüente deterioração da silagem após a abertura do silo tem tido pouca importância na prática por se tratar na maioria das vezes de um problema “subclínico”. Pois, quando as silagens são expostas ao ar, microrganismos oportunistas iniciam atividade metabólica, produzindo calor e consumindo nutrientes, revelando o desabastecimento do silo e o fornecimento da silagem aos animais como um importante dreno de matéria seca e energia durante o processo de ensilagem.

Os estudos com deterioração aeróbia intensificaram-se nas décadas de 60 e 70 quando surgiram ensaios sobre utilização de aditivos (ácido fórmico, acético e propiônico) procurando controlar o crescimento de leveduras e de fungos. O alvo das pesquisas até os dias atuais sobre estabilidade aeróbia continua sendo a inclusão durante a ensilagem de ácidos, doses de amônia e uréia, emurchecimento e/ou adição de inoculante microbiano (bactérias homofermentativas), aditivos absorventes e disponibilizadores de substrato (polpa cítrica) e métodos de alteração da fermentação com a utilização de bactérias heteroláticas produtoras de acetato e propionato (Lactobacillus buchneri, Lactobacillus plantarum e Propionibacterium).

Nota-se que apesar de antigo e bem estudado, o problema instabilidade aeróbia de silagens tem sido freqüentemente relegado a segundo plano. Pois poucos são os trabalhos que estudaram a importância dos fatores inerentes ao manejo como, compactação, tempo de enchimento de silo e peso de compactação sobre as perdas após a abertura, e mais raros os que caracterizam o efeito da silagem deteriorada e de seus produtos sobre a ingestão e metabolismo dos animais como o de Bolsen et al. (2002).

Estudos realizados na Universidade de Kansas, EUA, Bolsen et al. (2002) demonstraram os impactos negativos que a presença de silagem deteriorada tem sobre a ingestão e digestibilidade em bovinos. Utilizando como fonte da dieta 90% de silagem de milho e 10% de concentrado (base na MS) os tratamentos foram distribuídos da seguinte forma: A) 100% de silagem normal, B) 75% normal: 25% deteriorada, C) 50% normal e 50% deteriorada e D) 25% normal e 75% deteriorada. Nota-se (Tabela 1) que quando houve maior participação de silagem deteriorada na dieta (tratamento D) ocorreu redução da ingestão em 17%, da digestibilidade da matéria orgânica em 10%, da digestibilidade da proteína bruta em 15% e a da digestibilidade da FDN em 16%, quando comparado ao tratamento A. Os resultados indicaram que a presença de silagem que sofreu degradação por microrganismos aeróbios causou alterações na qualidade da dieta, reduzindo o ganho de peso ou a produção de leite. E segundo os autores, as futuras pesquisas devem enfocar o controle de perdas após a abertura dos silos, como forma de melhorar os índices zootécnicos da fazenda.

Ressalta-se também, que além das perdas de nutrientes ocorridas devido à presença de microrganismos indesejáveis, a qualidade sanitária de silagens deve ganhar atenção nas pesquisas e nas propriedades rurais por se constituir numa das possíveis fontes de contaminação de produtos de origem animal (leite e carne), além dos riscos associados à saúde humana e animal.


Dentre os ruminantes as vacas leiteiras são altamente expostas à ação de micotoxinas devido à dependência de volumosos conservados como feno ou silagem. Assim sendo, é possível que no Brasil os prejuízos na bovinocultura, em razão da ingestão de alimentos contaminados, geralmente não identificados, representem um entrave para atingir-se alta produtividade no setor. Mas também bovinos de corte em regime de confinamento estão propensos a ingestão de alimentos contaminados com micotoxinas.

As micotoxinas originárias do fungo Fusarium, tal como, a Desoxinivalenol (DON), e a Zearalenona, em forragens conservadas está associada à menor ingestão de alimento, causando efeitos como: redução no ganho de peso, queda na produção de leite, maiores contagens de células somáticas, menor eficiência reprodutiva, além de uma ampla variedade de desordens no trato gastrointestinal, tais como vômitos, diarréia e inflamações. Também podem ocorrer abortos, hemorragias e através de um mecanismo complexo, surgem alterações no sistema imunológico. Além destas duas micotoxinas anteriormente citadas (DON e Zearalenona), não se deve deixar de comentar sobre a Toxina T-2, a qual está associada à recusa de alimento, redução da produção, gastroenterites, hemorragias intestinais, morte e imunossupressão em bezerros (Arcuri et al., 2003; Jobim & Gonçalves, 2003).

Todos esses fatos indicam que alguns pontos fundamentais da técnica de produção de silagens devem ser discutidos e divulgados, pois o conhecimento acumulado com o estudo sobre instabilidade aeróbia e seus efeitos sobre os animais ainda é superior ao que chega ao produtor, principalmente no nosso pais, apesar de existirem artigos de grande significância sobre o assunto.

Literatura consultada

ARCURI, P. B., CARNEIRO, J. C., LOPES, F. C. F. Microrganismos indesejáveis em forragens conservadas: Efeito sobre o metabolismo de ruminantes. In: VOLUMOSOS NA PRODUÇÃO DE RUMINANTES: VALOR ALIMENTÍCIO DE FORRAGENS. Jaboticabal:Funep, p. 51-70, 2003.

BOLSEN, K. K., WHITLOCK, L. A., URIARTE-ARCHUNDIA, M. E. Effect of surface spoilage on the nutritive value of maize silages diets. In: THE INTERNATIONAL SILAGE CONFERENCE, 13th, 2002, Auchincruive. Proceedings… Auchincruive, 2002, p.75-77.

COLLINS, M., FRITZ, J. O. Forage quality. In: FORAGES: NA INTRODUCTION TO GRASSLAND AGRICULTURE. 6th edition, Iowa: A Blackwell Publishing Company, 2003, p. 363-390.

JOBIM, C. C., GONÇALVES, G. D. Microbiologia de forragens conservadas. In: VOLUMOSOS NA PRODUÇÃO DE RUMINANTES: VALOR ALIMENTÍCIO DE FORRAGENS. Jaboticabal:Funep, p. 1-26, 2003.
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1Thiago Fernandes Bernardes é Doutorando em Zootecnia FCAV/UNESP

2Gustavo Rezende Siqueira é Mestrando em Zootecnia FCAV/UNESP

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