Por Carlos Antônio de Carvalho Fernandes1; Eduardo Ramos de Oliveira2;Thales Discini Vasconcelos2
Introdução
A eficiência em rebanhos de corte pode ser traduzida pelo número de bezerros nascidos, em relação ao número de matrizes num determinado período, o intervalo de partos pode traduzir esta eficiência. Dividindo-se 365 pelo intervalo de partos, em dias e multiplicando esta razão por 100, obtém-se o percentual de fêmeas de um rebanho que chegam a parir anualmente. Este índice é global e reflete a condição geral da situação reprodutiva da propriedade. Depende de duas variáveis, que seriam a duração do período do parto ao reinicio da atividade reprodutiva (intervalo parto-1o estro), e também do tempo gasto para que se estabeleça uma nova gestação (número de serviços/concepção). Como a duração da gestação não pode ser alterada, para melhorar os índices reprodutivos de um plantel é necessário que as vacas retornem à atividade reprodutiva rapidamente após o parto e que tenham condições ótimas de concepção, ou seja, boa fertilidade.
Para a vaca, puerpério tem sido definido como o período que vai do parto até o aparecimento do primeiro estro no qual nova gestação possa ser estabelecida, o que implica em completa involução uterina e retorno da atividade endócrina, com plena reativação e sincronia do eixo hipotálamo-hipófise-ovário, que permita crescimento folicular, estro, ovulação, concepção, desenvolvimento do corpo lúteo e gestação.
Para a o retorno à atividade reprodutiva, é importante uma involução uterina rápida. Existe uma grande correlação entre a involução uterina e o retorno á atividade ovariana pós-parto. Estes autores afirmam que o retardo na involução uterina pode atrasar a presença de atividade funcional nos ovários, retardando o início do 1o cio pós-parto. Os animais que apresentaram involução uterina mais rápida apresentam menos problemas reprodutivos no pós parto, como infecções uterinas, além de maior fertilidade, traduzida pelo número de serviços por concepção.
O período puerperal é dos mais importantes no contexto do manejo, por representar o período de maior vulnerabilidade do animal a problemas que afetam a fertilidade futura e a eficiência reprodutiva. A vaca tem um tipo de involução do útero bastante complexa, em parte devido ao tipo de placenta presente nesta espécie. Após a parição, os cotilédones fetais se separam das carúnculas maternas. As carúnculas e o restante da parede uterina sofrem um processo semelhante a um processo inflamatório. A massa uterina logo após o parto normal pesa aproximadamente 10kg, caindo para 0,7-0,8 kg até a 6a semana após o parto, quando ocorre uma involução total. Assim, no período logo após o parto observa-se uma mudança na massa do tecido uterino de mais de 10 vezes o seu tamanho.
O processo de involução envolve modificações na camada interna de revestimento e também a atividade contrátil do miométrio, para expulsão do conteúdo remanescente pós-parto e também redução do tamanho do útero. A involução uterina pode ser comparada a um processo de reação inflamatória.
Como nos casos de inflamação, na involução uterina, as prostaglandinas exercem importante função. Além de acelerar o processo de involução, a prostaglandina F2alfa (PGF2alfa) estimula a atividade da camada muscular uterina (miométrio) após o parto. Esta substância é normalmente produzida pelo útero sendo responsável pela correta involução uterina pós-parto, em tempo normal.
Os análogos sintéticos da PGF2alfa têm sido amplamente utilizados para controlar a atividade funcional do corpo lúteo, e também no pós-parto em bovinos. Vacas leiteiras que receberam cloprostenol sódico no pós-parto imediato apresentaram involução uterina mais rápida, menor número de serviços por concepção e menor incidência de problemas pós-parto em relação aos animais do grupo controle.
Assim, também em gado de corte, principalmente vacas zebuínas, que compõem a maior parte do efetivo de matrizes do rebanho nacional, seria de se esperar que a aplicação dos análogos da PGF2alfa, um efeito em relação à estimulação da involução uterina mais rápida, em animais com parto normal. Este efeito poderia ser refletido num intervalo parto-1o estro menor, e por conseqüência uma melhoria na performance reprodutiva.
Material e métodos
O trabalho foi realizado entre setembro de 2002 e março de 2003 em duas propriedades no Sul de Minas Gerais. Os rebanhos possuíam fêmeas zebuínas basicamente da raça Nelore com idades entre 30 e 90 meses. Durante a fase experimental o manejo dos animais ficou sob a orientação e supervisão de um mesmo técnico. Nestas propriedades os animais foram manejados em sistema extensivo. As pastagens são compostas de capim Brachiária e os animais receberam suplementação mineral comercial ad libitum durante todo o período experimental.
Para se evitar influencia de outras variáveis, como manejo e aspectos climáticos e nutricionais, o experimento foi conduzido avaliando os três grupos simultaneamente. Foram avaliadas 232 vacas, sendo 113 primíparas (1o parto) e 119 multíparas (2o ao 5o parto). Somente foram considerados animais apresentando parto normal. Após o parto estes animais foram divididos aleatoriamente em 3 grupos de tratamento conforme descrito na Tabela 1. Assim, o primeiro animal foi incluído no grupo 1, o segundo no grupo 2, o terceiro no grupo 3, o quarto no grupo 1 e assim sucessivamente.
Tabela 1: Esquema de tratamento dos animais após o parto.
A partir de duas semanas após o parto as fêmeas foram colocadas na presença de rufiões preparados pela técnica de aderência do pênis. A observação visual de estro foi feita duas vezes ao dia, por pelo menos 30 minutos cada período de observação. O sêmen utilizado foi de um mesmo touro de uma mesma partida para todos os animais de cada propriedade.
Após o tratamento, todos os animais dos três grupos foram avaliados com relação aos seguintes aspectos (tabela 2).
Tabela 2. Variáveis mensuradas nos diferentes grupos de tratamento.
Resultados e discussão
As análises estatísticas demonstraram que as primíparas exibem pior performance reprodutiva, quando comparadas às multíparas num mesmo grupo de tratamento (p<0,05). Considerando primíparas e multíparas em conjunto, nos diferentes grupos de tratamento, esta última categoria revelou melhor performance reprodutiva (figuras 1 e 2). Figura 1: Índices reprodutivos em primíparas da raça nelore recebendo ou não prostaglandina no pós-parto.
A prostaglandina é uma das substâncias mais importantes na involução uterina da vaca. Os análogos sintéticos, no caso o cloprostenol, podem atuar de forma semelhante e benéfica, neste processo. O retorno á atividade ovariana pós-parto foi menor no grupo de primíparas que recebeu duas doses de cloprostenol. Em média, as primíparas do grupo 3 exibiram intervalo parto-1o estro menor em relação aos grupos 1 e 2. Para multíparas embora seja observada diferenças entre os animais dos grupos controle e tratados esta diferença não foi estatisticamente significativa.
Figura 2: Índices reprodutivos em multíparas da raça nelore recebendo ou não prostaglandina no pós-parto.
A aplicação de duas doses de Ciosin no pós parto de primíparas (vacas de 1a cria) acelera o retorno á atividade ovariana pós-parto e a próxima concepção.
Não foram observadas alterações na fertilidade, pela avaliação do número de serviços/concepção, tanto em primíparas quanto multíparas.
Em multíparas, embora possa ser observada uma tendência de melhores índices nos animais que receberam 2 doses de Ciosin, os resultados não foram estatisticamente diferentes.
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1Carlos Antônio de Carvalho Fernandes é diretor Técnico – Biotran e professor da Unifenas, 2Eduardo Ramos de Oliveira e Thales Discini Vasconcelos são médico-veterinários da Biotran LTDA.