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Dieta, carnes e câncer – parte 1/2

O pesquisador Dominik D. Alexander, PhD, MSPH, epidemiologista sênior da Health Sciences Practice, Exponent, Inc., elaborou um relatório técnico sumarizando as atuais evidências epidemiológicas relacionadas ao consumo de carnes vermelhas e carnes processadas e o câncer. Esse relatório não teve a intenção de incluir sistematicamente todos os componentes de causa, como dose-resposta ou possibilidade biológica, entre as carnes vermelhas e processadas e tipos específicos de câncer. A ideia do trabalho foi sintetizar informações científicas relacionadas aos tipos de câncer com os quais o consumo de carne foi avaliado e recapitular algumas das associações estatísticas observadas entre a ingestão de carnes vermelhas e processadas e o câncer. Esse artigo traz uma tradução adaptada desse relatório.

Introdução

O pesquisador Dominik D. Alexander, PhD, MSPH, epidemiologista sênior da Health Sciences Practice, Exponent, Inc., elaborou um relatório técnico sumarizando as atuais evidências epidemiológicas relacionadas ao consumo de carnes vermelhas e carnes processadas e o câncer. Esse relatório não teve a intenção de incluir sistematicamente todos os componentes de causa, como dose-resposta ou possibilidade biológica, entre as carnes vermelhas e processadas e tipos específicos de câncer. A ideia do trabalho foi sintetizar informações científicas relacionadas aos tipos de câncer com os quais o consumo de carne foi avaliado e recapitular algumas das associações estatísticas observadas entre a ingestão de carnes vermelhas e processadas e o câncer.

Esse artigo traz uma tradução adaptada desse relatório, publicado no site www.beefresearch.org.

Câncer

Aproximadamente um em cada três norte-americanos será diagnosticado com câncer durante sua vida e uma em cada quatro mortes nos Estados Unidos é atribuída ao câncer (1). O câncer vem depois das doenças cardíacas como principal causa de morte nos Estados Unidos. O câncer, que pode se originar a partir de virtualmente qualquer tipo de célula no corpo, é uma família diversa de doenças consistindo mais de 100 formas (2).

Apesar da diversidade, várias características são comuns em todos os cânceres, incluindo: proliferação irrestrita de células, alteração do controle do ciclo celular, crescimento sem sinais apropriados, ausência de efeitos da morte celular programada, interações alteradas entre as células e o ambiente que a cerca, evasão da erradicação mediada pelo sistema imune e marca de malignidade, que é a invasão do tecido normal (3).

Apesar da etiologia específica da maioria dos casos de câncer ainda não ter sido identificada, é bem conhecido que a causa do câncer é multifatorial, envolvendo uma complexa interação de genética, estilo de vida, infecção e fatores ambientais. A progressão do câncer comumente leva vários anos desde o início da doença até seu diagnóstico, aumentando, dessa forma, a dificuldade de identificar fatores fundamentais envolvidos na carcinogênese.

Em 2008, um total de 1.437.180 novos casos de câncer e 565.650 mortes por câncer foram projetados para ocorrer nos Estados Unidos (1). Durante a última década, as taxas de incidência de câncer nos Estados Unidos permaneceram relativamente estáveis, enquanto as taxas de morte pela doença declinaram (1). O câncer de próstata e o de mama são os mais comumente diagnosticados entre os homens e mulheres norte-americanos, respectivamente, enquanto o câncer de pulmão e cólon-retal estão em segundo e terceiro lugares. O câncer de pulmão, entretanto, é responsável por aproximadamente um terço de todas as mortes por cânceres entre homens e um quarto de todas as mortes por cânceres entre as mulheres (1), estatística em grande parte atribuída ao fumo de cigarro.

Tabela 1. Dez tipos principais de cânceres nos Estados Unidos, 2008

Dieta e câncer

O papel que a dieta pode ter no câncer humano tem recebido grande atenção nas últimas décadas, levando alguns pesquisadores a sugerirem que 35% a até 70% de todas as mortes por câncer podem ser atribuídas a fatores dietéticos (4,5). Apesar de a proporção exata dos cânceres atribuídos à dieta permanecer incerta, existe consenso científico de que a relação entre dieta e câncer é uma questão relevante de saúde pública.

As primeiras avaliações de populações migrantes revelaram que a adoção de certas características comportamentais e de estilo de vida levava a maiores riscos de alguns tipos de câncer, ou seja, percebeu-se que os fatores genéticos não são os únicos responsáveis pela ocorrência da doença. Por exemplo, os imigrantes do Japão, uma nação com altas taxas de câncer de estômago, que foram viver nos Estados Unidos apresentaram redução nas taxas desse tipo de câncer, que começaram a alcançar as taxas dos Estados Unidos, após duas gerações de pessoas vivendo nos Estados Unidos (6). Apesar de fatores genéticos terem um papel possivelmente mais importante no desenvolvimento do câncer, observações de mudanças seculares que resultaram na modificação das taxas de câncer sugerem que a dieta pode influenciar no risco de câncer. A hipótese de que a dieta pode contribuir para a causa do câncer começou a tomar forma na década de setenta e foi sustentada por evidências experimentais e epidemiológicas no começo da década de oitenta. Historicamente, estudos nutricionais em animais levaram à hipótese de que alguns processos biológicos ocorrem em humanos e modelos animais preliminares suportaram a teoria de que variações dietéticas afetam o desenvolvimento de cânceres.

Entre as primeiras teorias envolvendo dieta e risco de câncer esteve a de que a ingestão de gordura pode estar envolvida na carcinogênese. Por exemplo, Tannenbaum e Silverstone demonstraram em 1953 (7) que a maior ingestão de gordura dietética em roedores aumentou a taxa de tumores mamários. Subsequentemente, estudos epidemiológicos ecológicos de populações humanas foram conduzidas para avaliar a correlação entre o consumo per capita de certos grupos de alimentos e as taxas de câncer por país. Como resultado, descobriu-se que os países com maiores níveis de consumo de gordura na dieta tendiam a ter maiores taxas de alguns tipos comuns de câncer, como de mama e cólon-retal (8,9). Somente a partir da década de oitenta é que a maioria dos estudos epidemiológicos mais rigorosamente delineados, como estudos de coorte e de caso-controle, foram iniciados para avaliar as potenciais relações causais entre dieta e câncer. O consumo de gordura continuou sendo incriminado como um causador de câncer, bem como foi implicado como um fator que contribui para doenças cardiovasculares. Outras hipóteses emergentes incluíram um possível papel do consumo de frutas e vegetais na prevenção do câncer.

Durante as duas últimas décadas, melhoras nos delineamentos experimentais, metodologias de pesquisas e técnicas analíticas permitiram que os pesquisadores investigassem nutrientes específicos, alimentos, grupos de alimentos e padrões dietéticos, enquanto mediram melhor a ingestão e os componentes nutricionais das dietas. Apesar de vários avanços científicos, não existem evidências conclusivas relacionadas a papéis específicos de grupos de alimentos e de alimentos individuais na causa de câncer. De fato, o que se pensava ser uma associação forte e “convincente” entre o consumo de frutas e vegetais e a redução no câncer, particularmente do câncer cólon-retal, foi um pouco enfraquecida por estudos mais recentes, grandes, bem conduzidos e prospectivos e as evidências científicas foram diluídas (10). Isso não significa dizer que a ingestão de frutas e vegetais não reduz os riscos de alguns tipos de cânceres, entre outras consequências para a saúde, mas sim, que as evidências científicas disponíveis não estão tão claras hoje como se pensava há 10 ou 20 anos. O mesmo pode ser dito com relação ao consumo de gordura; pesquisas epidemiológicas de larga escala de estudos prospectivos, como por exemplo, meta-análises, não suportaram as associações positivas entre o consumo de gordura e alguns dos tipos mais comuns de câncer (11-14).

Talvez os cientistas precisem de ferramentas e métodos de avaliação da dieta melhores, como biomarcadores dietéticos, para identificar subgrupos específicos da população para a qual fatores dietéticos podem modificar os riscos de câncer. Por outro lado, certos fatores dietéticos que já foram citados como causadores de aumento ou redução no risco de câncer podem não estar diretamente envolvidos na carcinogênese. Outro fator que confunde o pensamento moderno sobre dieta e câncer é a incerteza sobre o estágio da carcinogênese no qual os fatores dietéticos podem agir e se esse possível risco é dose dependente (15).

Vale notar que, juntamente com avaliações sobre dieta e nutrição, houve avaliações epidemiológicas sobre índice de massa corpórea, gordura corporal, prática de exercícios e risco de câncer. Apesar das descobertas de pesquisas epidemiológicas desses fatores com relação ao câncer nem sempre terem sido consistentes, está cada vez mais claro que a obesidade e a prática de atividade física são fatores modificáveis que são essenciais na redução dos riscos de muitos tipos de câncer. De fato, isso é reconhecido em escala global, à medida que tem sido dada mais ênfase na infra-estrutura de saúde pública para tornar o peso corpóreo e a prática de atividades físicas uma prioridade fundamental na prevenção do câncer (16). Assim, as descobertas e sumários epidemiológicos apresentados nesse trabalho devem ser interpretados com o entendimento de que a avaliação de fatores de risco para desenvolvimento de câncer envolve uma abordagem multi-facetada, segundo a qual vários fatores de risco podem estar misturados.

Referências bibliográficas

1. Jemal A, Siegel R, Ward E, et al. Cancer statistics, 2008. CA Cancer J Clin 2008;58(2):71-96.

2. Ecsedy J, Hunter D. The origin of cancer. 2nd ed. In: Adami H-O, Hunter D, Trichopoulos D, ed(s). Textbook of Cancer Epidemiology. New York: Oxford University Press, 2008:61-85.

3. Hanahan D, Weinberg RA. The hallmarks of cancer. Cell 2000;100:57-70.

4. Doll R, Peto R. The causes of cancer: quantitative estimates of avoidable risks of cancer in the United States today. J Natl Cancer Inst 1981;66(6):1191-308.

5. Willett WC. Diet and Nutrition. 3rd ed. In: Schottenfeld D, Fraumeni JF, ed(s). Cancer Epidemiology and Prevention. New York: Oxford University Press, 2006:405-21.

6. Haenszel W, Kurihara M. Studies of Japanese migrants I. Mortality from cancer and other disease among Japanese in the United States. J Natl Aner Inst 1968;40:43-68.

7. Tannenbaum A, Silverstone H. Nutrition in relation to cancer. Adv Cancer Res 1953;1:451-501.

8. Carroll KK. Experimental evidence of dietary factors and hormone-dependent cancers. Cancer Res 1975;35(11 Pt. 2):3374-83.

9. Armstrong B, Doll R. Environmental factors and cancer incidence and mortality in different countries, with special reference to dietary practices. Int J Cancer 1975;15(4):617-31.

10. Boyle P, Boffetta P, Autier P. Diet, nutrition and cancer: public, media and scientific confusion. Ann Oncol 2008;19:1665-7.

11. Smith-Warner SA, Spiegelman D, Adami HO, et al. Types of Dietary Fat and Breast Cancer: a Pooled Analysis of Cohort Studies. Int J Cancer 2001;92(5):767-74.

12. Alexander DD, Cushing CA, Lowe KA, Sceurman B, Roberts MA. Meta-analysis of animal fat or animal protein intake and colorectal cancer. Am J Clin Nutr 2009;89(5):1402-9.

13. Alexander DD, Cushing CA. Quantitative assessment of red meat or processed meat consumption and kidney cancer. Cancer Detect Prev 2009;32(5-6):340-51.

14. Alexander DD, Cushing CA. A meta-analysis of red or processed meat intake and prostate cancer. Society for Epidemiologic Research, Anaheim, CA, 2009.

15. Miller AB, Linseisen J. Achievements and future of nutritional cancer epidemiology. [published online ahead of print October 28, 2009]. Int J Cancer 2009. http://www3.interscience.wiley.com/journal/122666343/abstract?CRETRY=1&SRETRY=0.

16. World Health Organization (WHO). Global Strategy on Diet, Physical Activity and Health. 2004. http://www.who.int/dietphysicalactivity/strategy/eb11344/strategy_english_web.pdf. Accessed: 09/07/2009.

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