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Conheça o negócio familiar mais antigo da Inglaterra: um açougue com mais de 500 anos

Butcher 1Richard Balson

A cada ano, cerca de 240.000 empresas britânicas entram em falência. Sobreviver além dos primeiros dois anos é uma conquista; comemorar 50 anos é notável. Mas para uma empresa, ser capaz de comemorar o 500º aniversário é motivo de uma grande festa – que foi  exatamente o que Richard Balson fez em setembro de 2015.

Acougue 2(Foto: Photo: SWNS)

Butcher 2

Balson é proprietário do açougue RJ Balson & Sons. Localizado na bela cidade de Bridport, Dorset, na Inglaterra, o açougue sobreviveu à Reforma Inglesa, à Guerra Civil Inglesa, ao início da Revolução Industrial, ao surgimento de motores a vapor em substituição aos cavalos, ao surgimento da Internet e a inúmeras recessões.

Acougue 3

E o tempo todo permaneceu dentro da mesma família, de modo que os especialistas a declararam agora como a empresa familiar mais antiga da Grã-Bretanha.

“É inacreditável,” ele concorda. Para marcar a ocasião, ele fez uma festa no prédio histórico de Bridport Town Hall, que não via uma reunião como essa desde que alguns rebeldes de Monmouth foram executados após os Bloody Assizes (julgamentos sangrentos) de 1685. Havia 300 convidados, muito vinho e canapés servidos por mulheres “vestidas como camponesas de Tudor”  (palavras de Balson).

A loja funciona em um estabelecimento bastante pequeno, que somente foi ocupado de forma fixa no século XIX; antes disso, o açougue era operado a partir de vários pubs locais (um método comum de distribuição para açougueiros na Inglaterra na era georgiana e vitoriana).

Acougue 4Richard e seu pai, Donald Balson, fora da loja (Andrew Crowley/Telegraph)

E antes disso, a família vendia carne em uma região comercial de Bridport designada justamente à venda de carnes. Sua função de açougue levou a região a ser conhecida como “The Shambles”, à medida que os açougueiros a utilizavam para abater animais, bem como vender carne.

Em 1534, o açougueiro local, John Balson, alugou um espaço vitalício nesse mercado. Em 1556, Thomas Balson obteve a posse de dois açougues na região.

Acougue 5Açougueiros em 1880 Bridport, Dorset (SWNS)

A prova da antiguidade do açougue repousa sobre um documento de setembro de 1515, que concedeu a Robert Balson o direito de operar dois açougues em troca de “cinco xelins de dinheiro legal a ser pago nas festas da Páscoa e São Miguel Arcanjo”.

À venda agora, há uma mistura de produtos novos e coisas à moda antiga. Pacotes de carne pingando compartilham espaço com chouriço fatiado. Há um congelador com alguns cortes de caça tradicionais, como carne de veado e coelho, alguns exóticos, como bisão, zebra, crocodilo, avestruz e canguru.

Acougue 6Foto: Andrew Crowley/Telegraph

Quando o negócio abriu, o canguru nem sequer tinha sido descoberto.

Balson diz: “Desde que eles começaram a ir para a selva e a comer coisas engraçadas na televisão, isso fez com que as pessoas começassem a fazer essas festas incomuns onde têm que adivinhar o que estão comendo. Recebo pessoas que vêm e compram muito dessas coisas. Não sei bem o que o meu avô faria”.

Mas não foi apenas acompanhar as tendências da TV que permitiu à empresa manter a cabeça acima da água em uma época em que muitos pequenos varejistas, especialmente peixarias, mercearias e açougueiros, faliram.

Acougue 7Foto: SWNS.

Desde o início da década de 1990 até meados da década de 2000, o número de açougues caiu de 15.000 para cerca de 6.000, uma queda de 60%, de acordo com o Meat Trades Journal, embora nos últimos anos os números tenham se estabilizado.

Balson está certo de que pode lutar contra os supermercados. “A principal coisa é o serviço pessoal. Quando você entra, recebe uma boa acolhida, dizemos: ‘Como está sua mãe?’, ‘Como está sua filha?'”. Ele explica que a maioria dos clientes vem de famílias cujos pais e avós já foram servidos pelo açougue, de forma que gostam desse interesse sobre sua família.

“Você não vai conseguir essa experiência pessoal em um supermercado. Quem quer fazer fila por 20 minutos antes mesmo de chegar ao caixa?”

De qualquer forma, se uma loja sobreviveu a 23 monarcas e 52 primeiros-ministros, provavelmente há uma chance de sobreviver à ascensão de redes como Tesco e Aldi.

Muitos argumentam que as empresas de gestão familiar são intrinsecamente mais bem-sucedidas do que as empresas públicas, precisamente porque o homem que está por trás da faca está mais interessado em construir um legado do que em fazer um dinheiro rápido.

Acougue 8Donald, pai de Richard, com 9 anos de idade, em 1931 (Andrew Crowley/Telegraph)

Mark Hastings, diretor do Instituto de Empresas Familiares, diz: “Eles não estão limitados pelo terror de resultados trimestrais ou anuais. Está em seu DNA passar algo melhor para a próxima geração. Eles não se preocupam apenas com seus filhos e filhas, mas com a geração além”.

Balson, 59, deixou a escola aos 17 anos para trabalhar com seu pai, como seu pai tinha feito antes dele. Mas seu filho, Billy, 36, é um banqueiro bem sucedido que vive em Manchester.

Acougue 9Foto: SWNS

Embora Balson Jr esteja ansioso para ajudar no negócio (ele criou seu site original), ele mostra pouca inclinação para se juntar ao seu pai nas vendas da loja. Balson admite que há uma enorme “pressão” para manter o negócio por mais tempo depois que ele se aposentar.

“Acho importante que haja um Balson atrás do balcão”, diz ele. “Mas não importa se ele pula uma geração ou vai para o filho do meu irmão”.

Butcher 3

Ele também está certo de que não importa como mudem nossas dietas, os açougues continuarão sendo centrais nas ruas da Inglaterra.

“Sobrevivemos a pragas, incêndios, inundações, guerras, recessões e medos alimentares. Há sempre algo ruim para você, mas se você ouvir tudo, não come nada. Você tem que aproveitar a vida ao invés de viver com nozes e ser infeliz”.

Ele disse: “Uma das razões pelas quais ainda estamos no negócio é que o mantivemos pequeno. A tentação é adicionar outra loja ou duas, mas você só pode realmente manter um olho em uma loja por vez. As pessoas entram e sabem que receberão um serviço amigável e pessoal. Nove em cada 10 vezes eu sei o que as pessoas querem antes de entrarem”.

Além das cerca de 1.000 encomendas por semana durante o período de pico de verão, a loja tem clientes distantes, em locais como a América comprando suas salsichas on-line.

Butcher 4

Mas eles ainda têm dois produtos feitos com receitas secretas da família que vendem desde os tempos da Dinastia Tudor – suas salsichas suínas inglesas e o faggot de receita própria (faggot é um prato semelhante a uma grande almôndega feita de vísceras como coração de porco e fígado).

Ele disse que as salsichas são ainda seu produto mais popular, com 20 variedades diferentes além da receita original da carne de porco.

“Poderíamos ser uma loja de salsicha, apenas, se quiséssemos. Nós tivemos que diversificar à medida que os estilos de vida mudaram e as pessoas hoje em dia querem cozinhar coisas que levam apenas 20 minutos. As pessoas estão tão ocupadas que salsichas, hambúrgueres e kebabs as atendem, já que são fáceis de cozinhar”.

“Estamos tão ocupados como sempre estivemos. No pico do verão, fazemos cerca de 1.000 vendas por semana. Isso mesmo com dois outros açougues em Bridport e com os supermercados”.

Butcher 5

A loja comemorou seu 500º aniversário em 12 de setembro de 2015 com uma festa que ajudou o Cancer Research, levantando £ 5.000 (cerca de R$ 19,5 mil). Balson também lançou um livro chamado “500 years behind the block” para marcar a data.

500-years-behind-the-block-bookLivro

Mas ele disse que não tem planos de se aposentar em breve – mesmo que já existam duas gerações que poderiam assumir a loja. “Eu tenho um filho e ele tem dois filhos, então temos a próxima geração esperando, mas não é algo que nos preocupa no momento. Ainda tenho 30 anos pela frente”.

O que mantém um açougue familiar nos negócios por 500 anos?

Apesar da fama de ser o negócio familiar mais antigo da Grã-Bretanha, Balson nunca tinha conseguido começar um projeto de levantar a história do negócio. A vida de um açougueiro é muito ocupada. Ele cresceu acima da loja e se lembra de seu pai alertando-o desde cedo que os Balson nunca ganharam o suficiente para uma aposentadoria. Assim, muito pouca informação lhe foi transmitida sobre as 28 gerações que trabalharam no negócio familiar antes dele.

No entanto, quando uma série da BBC chamada Four Britain’s Oldest Family Businesses ofereceu-lhe a oportunidade de descobrir sobre seus antepassados, em 2014, grande parte da história veio à tona. Foi necessária apenas uma rápida viagem ao arquivo local para Balson rastrear as origens de seu negócio para 20 anos antes do que tinha ele tinha pensado anteriormente que tinha sido o início (1935), para o ano de 1515.

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“Fantástico”, diz ele no documentário, seus olhos brilhando enquanto segura o contrato de locação manuscrito em latim para o açougue de Robert Balson em Bridport Shambles.

Cristóvão Colombo só tinha descoberto a América 23 anos antes e levaria mais 261 anos antes da declaração de independência dos Estados Unidos.

Balson descobriu que a loja, de maneira bastante milagrosa, sobreviveu a uma história bastante sangrenta. Um dos açougueiros Balson morava com uma mulher casada e “teve sua cabeça arrancada” por seu filho de 10 anos; outro foi enviado para um asilo vitoriano para tratamento com choque elétrico antes de cortar sua própria garganta. O que torna essas histórias mais assustadoras é que eles viviam e trabalhavam no mesmo espaço – assim como Balson fez com seu pai.

“Eu trabalhei com meu pai todos os dias durante 40 anos da minha vida”, disse Balson. “Tínhamos um vínculo especial”.

mrs-allison-balson-b870x1200Balson e filho. (Foto: http://www.pashley.co.uk).

Ele conta com carinho uma história típica sobre seu pai, que um dia ficou tão farto de um cliente que  cortou a gravata do pobre homem com a faca de açougueiro.

Há três episódios de uma hora de duração nessa série da BBC; os outros dois episódios são sobre a fabricante de uniformes, Toye e Co, e uma empresa de construção, R Durtnell e Sons. Uma coisa que todos as três empresas familiares nesta série têm em comum são os ancestrais fortes. É preciso mais do que cautela e bom senso para passar por 50 ou mais recessões, pela Revolução Industrial, pelas guerras mundiais e compras na Internet. É necessário também astúcia, sorte e um senso de orgulho familiar.

Histórico no site oficial do açougue

“COMEÇOU EM 1515…

… Apenas seis anos do reinado de Henrique VIII. No mesmo ano, Ana de Cleeves, a quarta esposa de Henrique, nasceu em Cleeves, na Alemanha, e Thomas Wolsey, arcebispo de York, foi nomeado cardeal. Este foi o ano antes do primeiro relato publicado da descoberta da América do Norte e 8 anos antes do grão de cacau ser introduzido na Espanha …

Desde então, dezenas de membros da família passaram suas habilidades de açougueiro através de 25 gerações, tornando-nos o mais antigo negócio familiar da Grã-Bretanha.

Nossos Açougueiros Mestre atuais são Richard Balson e o cunhado, Rudi Boulay, que se casou com Jane Boulay (nascida Balson).

Richard e Rudi foram treinados pelo mestre açougueiro Donald Balson, pai de Richard e Jane. Ele começou com a empresa em 1938 e sempre afirmou que sua primeira tarefa era ir para os campos para pegar o cavalo antes que ele pudesse começar as entregas do dia. Após 73 anos de serviço para a empresa, interrompido apenas pelo serviço à Marinha durante a década de 1940, Donald infelizmente faleceu em 2011.

A partir de 1880, até hoje, a nossa loja está em West Allington, Bridport, não muito longe da sua localização original e continuamos a lidar com carne de alta qualidade, aves e caça, fazer a nossa própria linha de alimentos especiais e oferecer um inigualável serviço à moda antiga”.

Veja abaixo dois vídeos (em inglês), um sobre a comemoração de 500 anos do açougue e outro falando sobre e mostrando o açougue:

Confira abaixo as 10 empresas familiares mais antigas do Reino Unido:

Captura de Tela 2017-01-16 às 18.21.59

Fontes: http://www.dailymail.co.uk, http://www.telegraph.co.uk, http://www.bridporttownhall.org e http://rjbalson.co.uk.

7 Comments

  1. Miguel da Rocha Cavalcanti disse:

    Uma história inspiradora para qualquer empresa familiar.

  2. Thaís Silva disse:

    Excelente matéria equipe BeefPoint!!!! Parabéns a família “RJ Balson & Sons”!!!! Exemplo de determinação!!

  3. Hernandes Medrado Filho disse:

    Fantástico uma Empresa durar tanto tempo em uma mesma Família. Somos aqui na região da Chapada Diamantina e Médio Paraguaçu uma das famílias mais antigas de Pecuaristas e a pouco tempo fui a uma das primeiras fazendas do meu Tataravô em Mucugê na Bahia , peguei um punhado de terra , coloquei em um frasco que decora a sala da fazenda secular construída por meu avô, onde moro atualmente. Isto tem um Grande valor para mim e curiosidade para quem a visita.Nos Orgulhamos de Termos TREZENTOS ANOS DE BRASIL, contados no livro do mesmo nome de Helena Medrado de Mucugê.

  4. Ilo Vicente C. M. Carvalho disse:

    Uma boa historia demonstrando o valor da dedicação e persistência.

  5. Diomar Roberto Barro disse:

    Excelente matéria…muito oportuna no momento pelo qual passam as empresas familiares no Brasil…Parabéns!

  6. CLEMENS BARBOSA DE N JR disse:

    Gostei da matéria.
    O que me chamou a atenção, foi ver que já tem 2 gerações “esperando”, sendo preparada para assumir a atividade.
    E, como diz um amigo aqui: “Gente também tem que ter raça.”
    Parabéns.!!!

  7. João Marcos Tostes Ribeiro disse:

    O povo inglês tem uma ligação forte com a tradição. A opção de manter um negócio da família é muito rentável quando se cria uma marca, quando se é uma referência.
    Interessante notar que cada geração enfrenta um desafio próprio da época e mantém o “trem na linha”.
    Enxergo como aspectos importantes para manter esse negócio em tempos atuais, a conexão com a evolução cultural e os meios de comunicação, atendimento diferenciado, produtos diferenciados, especialização, concentração e atenção aos detalhes em todos esses fatores, que não deixam o negócio ficar à margem do processo, quando se trata de competir com redes de supermercados, cujo negócio se baseia em escala e distribuição.

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