Aumento da alíquota do IR sobre o Ganho de Capital e o impacto para o produtor rural
16 de outubro de 2015
McDonald’s do Japão anuncia lançamento de hambúrgueres mais baratos
16 de outubro de 2015

Como os projetos da Temple Grandin reformaram a indústria de carnes

“Haveria carne que caiu no chão, na sujeira e na serragem, onde os trabalhadores tinham pisado e cuspido bilhões de germes. Haveria carne armazenada em grandes pilhas em quartos; e a água de goteiras pingariam sobre elas, e milhares de ratos correriam sobre elas”. Felizmente, muita coisa mudou desde que Upton Sinclair publicou o livro “The Jungle”, que foi campeão de vendas expondo as condições insalubres, as práticas de trabalho e manejo animal nos currais de Chicago no início do século passado. O livro de Sinclair ajudou a levar à existência, em 1906, da Lei de Alimentos e Drogas Puros e a Lei Federal de Inspeção de Carnes, as primeiras de uma série de leis sanitárias e de proteção do consumidor. Chicago continuou sendo a capital de abates da América até os anos cinquenta, quando os abatedouros mudaram de lugar porque era mais barato e mais eficiente colocá-los próximos às fazendas e, então, enviar as carnes para todo o país em caminhões refrigerados.

thejungle

À medida que a indústria se desenvolvia, o bem-estar animal continuava sendo uma preocupação secundária. Recentemente, nos anos noventa, as condições dos abatedouros de bovinos eram muito ruins, disse Temple Grandin, da Universidade do Estado do Colorado. Em 1996, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) descobriu que somente três em cada dez eram capazes de insensibilizar 95% de seus animais com um único tiro. As coisas começaram a mudar em 1999, quando, sob pressão de ativistas e do público geral, o McDonald’s, então maior rede de restaurantes do mundo, começou a monitorar o bem-estar animal de seus fornecedores de carne. Wendy’s e Burger King, duas outras redes de fast food, seguiram o exemplo.

Grandin teve uma grande participação nessa mudança. Ela é uma estrela em dois firmamentos aparentemente separados: bem-estar animal e entendimento de autismo. Metade dos bovinos nos Estados Unidos e no Canadá hoje são abatidos em equipamentos para contenção designados por Grandin e cerca de 35% de todos os bovinos nos Estados Unidos são manejados em seu projeto de rampa e curral curvos. Ela treinou trabalhadores em mais de 200 abatedouros em todo o mundo. Ao mesmo tempo, ela se tornou uma palestrante procurada e uma escritora sobre autismo, condição que ela mesma tem. “Eu era autista severa quando criança”, disse Grandin, que diz que foi sua mãe que a estimulou a levar uma vida o mais normal possível e usar seus talentos, que incluem uma facilidade incomum de ler desenhos em três dimensões.

grafico

À medida que o autismo passou a ser diagnosticado com mais frequência no mundo desenvolvido, Grandin passou a receber mais demanda que nunca em conferências e simpósios. Ela tenta usar o máximo de tempo possível em bem-estar dos animais, com o que ela se preocupa profundamente. A planta Fort Morgan, da Cargill, um dos maiores abatedouros dos Estados Unidos, usa equipamentos que ela projetou. Ela levou a The Economist para fazer uma visita.

“Eu acreditava que havia uma solução de engenharia para todos os problemas de manejo animal e insensibilização”, disse ela. No entanto, ela rapidamente aprendeu que o melhor equipamento do mundo é inútil, a menos que seja operado corretamente. Uma pistola de insensibilização, por exemplo, precisa ser manejada “como o melhor rifle de caça” e limpa todos os dias; caso contrário, sua pressão pode cair e ela pode falhar em matar o animal instantaneamente.

A planta Fort Morgan emprega 2.100 pessoas e abate 4.600 bovinos todos os dias. A planta produz 1,13 milhão de quilos de carne bovina terminada diariamente, o suficiente para fornecer um hambúrguer para cada habitante de Nova Jersey, disse Allen Boelter, gerente da planta. A visita começa na parte de trás, onde a carne bovina é selada a vácuo, colocada em caixas e carregadas em enormes caminhões refrigerados. A higiene é uma preocupação constante: a planta tem dois turnos de oito horas para abate e um de cinco horas no final do dia, quando todo o local é limpo e desinfetado.

Embora máquinas sofisticadas sejam responsáveis por grande parte das tarefas no frigorífico e na parte de encaixotamento da planta, os trabalhadores com capacetes e macacões (com roupas quentes por baixo, já que a temperatura está perto de zero) fazem a maioria das tarefas na área de abate. Eles removem o couro do animal, retiram seus órgãos internos e amarram seu reto e esôfago. A remoção do estômago e dos intestinos é um trabalho especialmente importante, à medida que um corte errado pode resultar nos conteúdos intestinais sendo derramados sobre as carcaças, o que pode estragar a carne. Como último passo, toda a carcaça é limpa e pendurada na enganosamente chamada “caixa quente” (que é ainda mais fria do que a sala de abate), onde é resfriada por três dias antes de ser cortada em pedaços e peças Tudo isso é um trabalho físico duro e sangrento, que envolve o manejo de facas que são continuamente afiadas. Alguns funcionários vestem casacos feitos de cota de malha [entrelaçamentos de pequenas argolas de metal] para se proteger das lâminas.

Depois da visita da “linha de desmontagem”, vem a parte do abatedouro que foi melhorada pelos projetos de Grandin. Uma rampa de muros altos, suavemente curva, onde os animais caminham em fila única, leva à caixa de contenção. Quando eles saem da contenção são abatidos, instantaneamente, com um parafuso entrando em seu cérebro através de pistolas de ar comprimido. Eles caem em uma correia transportadora, uma corrente é enrolada em torno de uma perna, e o enorme animal é levantado para ser pendurado de cabeça para baixo, ainda chutando de forma reflexa.

A rampa curva com os muros altos, explica Grandin, evita que os animais vejam o que tem ao redor deles ou vislumbrem o que está no fim de sua caminhada. Além disso, isso funciona também por sua tendência natural de andar em círculo e retornar de onde veio. Uma luz é instalada na caixa de contenção, porque os bovinos não gostam de caminhas no escuro. Piso antiderrapante é colocado dentro e na entrada da rampa, já que os animais entram em pânico quando escorregam seus pés. Mais importante ainda, disse Grandin, é que não deve haver distrações, em particular, vozes ou gritos agudos ou itens estranhos que poderiam abalar os animais. Além de causar medo e ansiedade desnecessária nos animais, um aumento na adrenalina um pouco antes do abate tornaria sua carne dura.

Durante a visita, vários animais estavam agitados e “vocalizando”, jargão que quer dizer mugidos e berros. Um animal até tenta pular para fora da caixa antes de ser insensibilizado. Isso incomoda Grandin. Depois de visitar os currais, onde os animais ficam reunidos por várias horas depois que chegam em caminhões para se acalmar antes de serem abatidos, ela para visando ouvir um pouco em frente à construção com a rampa curvada. Nenhum som surge.

temple

Exemplo de um dos projetos de Temple Grandin. Fonte: http://www.grandinlivestockhandlingsystems.com/packing.html.

 

Os animais sabem que estão caminhando para a morte? Grandin acha que não. Eles se comportam exatamente da mesma forma quando caminham pela rampa curva para serem vacinados. Alguns ficam agitados, mas a maioria apenas caminha. Para ela, os abates feitos de forma adequada são menos cruéis do que a morte natural pelas mandíbulas de lobos.

A visita termina na sala de controle, uma inovação também de defendida por Grandin, onde um funcionário monitora um vídeo em tempo real sobre o que está acontecendo na planta. Uma companhia não conectada com a Cargil assiste às filmagens. A professora fica satisfeita ao ver que a insensibilização dos animais é feita de forma calma na tela, aparentemente sem o animal sentir medo ou premonição – como deveria ser.

Fonte: The Economist, traduzida pela Equipe BeefPoint.

2 Comments

  1. RUBENS MENDES VELOSO JÚNIOR disse:

    Interessantíssimo. É impressionante o que essa professora enxerga, no que se refere à ALMA DOS ANIMAIS.

  2. Rodrigo Bonilha Botelho disse:

    Ele é uma pessoa iluminada e referencia mundial em comportamento Animal. Excelente matéria.

plugins premium WordPress