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Conheça Edward Green, produtor de gado de corte na Inglaterra e sua opinião sobre o Brasil, a comercialização e mercado da carne na Inglaterra

Na sexta-feira passada (12/04), recebemos no BeefPoint o produtor de gado de corte Edward Green, proprietário de uma fazenda em Somerset, no sudeste da Inglaterra. Edward faz parte de um programa de bolsas de estudo da instituição Nuffield Farming Scholarships e esteve no Brasil para conhecer melhor o mercado da carne no país. O principal objetivo de seu estudo é analisar como o mercado da carne pode se adaptar às mudanças na cultura alimentar no mundo. Na última quarta-feira (10/04), Edward foi um dos participantes do Workshop BeefPoint – Como melhorar sua comercialização no abate.

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Ed Green no escritório do BeefPoint, entregando um souvenir da região onde mora na Inglaterra.

A Nuffield Farming Scholarships é uma organização do Reino Unido que oferece a oportunidade de viajar para outros países, com o objetivo de desenvolver líderes do setor agrícola e pessoas inovadoras. A Nuffield financia e patrocina viagens ao exterior, através de parceria com outras empresas. No caso de Edward, seus estudos foram patrocinados pela associação The Worshipful Company of Butchers. Para se candidatar às bolsas de estudo, a pessoa deve residir no Reino Unido, ter entre 22 e 45 anos, e trabalhar em àreas relacionadas a agricultura. A organização possui um site, com informações sobre as bolsas de estudo.

Edward é proprietário de uma fazenda de 900 hectares em Somerset, no sudeste da Inglaterra. Metade de sua propriedade é usada para agricultura (trigo, cevada, milho) e a outra metade para pastagens. Cerca de mil animais são terminados todos os anos, dois terços desses animais são da raça Angus. Edward vende seu gado com prêmios de preço pela qualidade e padrão. Além das atividades relacionadas à fazenda, Edward participa de vários grupos relacionados ao mercado da carne no Reino Unido. Dentro de um período de 14 meses, Edward intercalou diversas viagens, num período de 16 semanas. Suas viagens incluiram outros países além do Brasil. No dia seguinte da entrevista, Edward embarcou para o Uruguai.

Em novembro, a instituição Nuffield Farming Scholarships organiza uma conferência na Inglaterra, para que os participantes da bolsa de estudos apresentem palestras, mostrando tudo o que viram em suas viagens ao redor do mundo. Confira abaixo a entrevista com Edward Green, onde ele fala sobre a comercialização do gado em sua propriedade, sua opinião sobre o mercado no Brasil e o sucesso das farm shops no Reino Unido.

BeefPoint: Fale um pouco mais sobre a conferência. Depois das viagens, você vai apresentar suas perspectivas através de uma palestra?

Edward Green: Sim. Essa conferência será em novembro. Temos essa conferência todos os anos. É nessa conferência que cada participante apresenta uma palestra sobre tudo o que viu durante as viagens. No ano passado, tivemos dois brasileiros participando, um do Mato Grosso e outro de São Paulo.

BeefPoint: Você é produtor, você é dono de uma fazenda. É interessante imaginar a maneira como você vai ver a sua propriedade e o mercado da carne bovina depois dessa experiência. Depois de viajar conhecendo a pecuária de corte em 10 países diferentes do mundo. A perspectiva sobre o seu negócio será totalmente diferente.

Edward Green: Com certeza essa foi uma oportunidade incrível, uma troca de experiências. É difícil ter essa visão, se você só fica dentro de casa, na sua propriedade ou no seu próprio país. Eu acredito que a única maneira de realmente conhecer uma nova cultura é viajando. Quando eu viajo, isso faz com que eu tenha uma outra visão do meu negócio, me dá uma visão de futuro e me posiciona no mundo. Eu acredito que a tendência é que as fronteiras internacionais se tornem cada vez menores.

BeefPoint: Fale um pouco mais sobre a sua fazenda.

Edward Green: Minha fazenda tem 900 hectares, metade da propriedade é usada para pastagens e a outra metade para agricultura. No momento, eu tenho cerca de 700 animais da raça Aberdeen-Angus. Nós vendemos esses animais para supermercados de classe alta, como o Waitrose.

BeefPoint: Você compra bezerros?

Edward Green: Sim, eu compro eles com a idade entre 5 e 12 meses, pesando 200kg. Nós abatemos esse animal quando ele está com 18 meses, pesando 600kg.

BeefPoint: Como você alimenta esses animais?

Edward Green: Normalmente nós alimentamos os animais em pastagens. No sudeste da Inglaterra nós temos bons períodos de chuva, então temos uma boa pastagem.

BeefPoint: Você disse que vende sua carne para um grande supermercado na Inglaterra.

Edward Green: É isso mesmo, eu vendo minha carne para o supermercado Waitrose. Eles possuem uma marca de carne e só vendem carne de qualidade. Eu tenho um contrato com esse supermercado, vendo minha carne diretamente para eles. A marca Angus é muito famosa no mundo, está presente em vários países.

BeefPoint: Você tem um contrato com o supermercado Waitrose? Como isso funciona, você tem normas a serem cumpridas?

Edward Green: Sim, o pai desse animal deve ser registrado, deve ser da raça Angus. Ou seja, é preciso confirmar por registros e certificados que o gado que estou oferecendo a esse varejista é pelo menos 50% Angus. Todos os animais devem estar no peso ideal e isso é checado antes do abate. Testes de DNA são feitos periodicamente. Esse supermercado, por exemplo, não se envolveu no escândalo da carne de cavalo. É uma rede que vende produtos mais caros, de alta qualidade.

BeefPoint: Me fale mais sobre os animais que você produz. Você tem normas a cumprir, certo?

Edward Green: Sim, todos os anos eu recebo umas 40 inspeções diferentes na minha fazenda, relacionadas ao meio ambiente, à saúde do animal, rastreabilidade, à segurança dos funcionários. Tenho também uma inspeção do supermercado Waitrose, que é feita anualmente.

Temos uma inspeção chamada “farm assurance”, que garante a qualidade da carne, através do selo de qualidade Red Tractor. Esse selo é a garantia de que eu faço um bom trabalho e estou dentro dos padrões de qualidade, referentes a saúde e bem estar do animal, proteção ao meio ambiente. É isso que garante a qualidade de uma fazenda, garante que ela segue princípios básicos.

Se uma fazenda no Reino Unido possui todas essas caraterísticas, significa que o animal produzido será de excelente qualidade. Os animais devem estar com o peso ideal, quando o animal vai para o abatedouro, ele passará por uma outra inspeção. Essa inspeção vai avaliar o peso do animal. Se ele estiver muito acima ou muito abaixo do peso ideal, o produtor é penalizado.

BeefPoint: Qual é a faixa de peso ideal?

Edward Green: A faixa de peso permitido é entre 260 e 400kg de peso de carcaça. Além do peso, há uma classificação de carcaça, com requerimentos de acabamento de carcaça.

BeefPoint: Qual é o supermercado de maior qualidade no Reino Unido?

Edward Green: O supermercado Waitrose. Depois dele, temos rede de supermercados como o Tesco, Audi, açougues locais e também farm shops, que estão se tornando cada vez mais populares.

BeefPoint: O que seriam farm shops?

Edward Green: São lojas de produtos agrícolas, gerenciadas por produtores. Essas fazendas ficam mais próximas de àreas urbanas. Um exemplo é a Darts Farm. Essa loja é mantida pelo proprietário da fazenda e oferece produtos frescos, todos produzidos na fazenda e de excelente qualidade.

É um conceito que está se tornando cada vez mais popular no Reino Unido. Um outro exemplo é a farm shop da fazenda Farrington’s, que vende diversos produtos e possui um açougue, que vende a carne que eles produzem. A loja da Farrington’s fica próxima da região onde eu moro, no sudeste da Inglaterra.

É algo que vem se desenvolvendo muito nos últimos 10 anos e funciona bem. As fazendas devem se diversificar mais, não devem produzir alimentos apenas como commodity. Isso é importante porque gera lucro e é uma forma de aproximar o produtor do consumidor, pois ele precisa ir até a fazenda para comprar os produtos. Essas fazendas também promovem um trabalho educacional muito importante, recebendo visitantes e excursões escolares.

BeefPoint: Qual a visão geral que você teve do Brasil?

Edward Green: Acho que dos 10 países que eu visitei, o Brasil foi o que mais me chamou a atenção quando se fala em produção. Vocês tem boas condições para produzir. O Brasil tem vários fatores que contribuem para uma boa produção. Vocês tem terra de qualidade, períodos de chuva, a temperatura é agradável. Vocês tem auto-suficiência, possuem boas hidrelétricas. O Brasil e os Estados Unidos são os maiores exportadores de carne do mundo. Se analisarmos outros países, o Brasil possui características que não encontramos em outros lugares. A Austrália e a Nova Zelândia sofrem com a seca, os Estados Unidos tem problemas com o clima e com a mão de obra. Eu acho que a produção no Brasil poderia ser ainda melhor, se analisarmos todos esses fatores. Se eu tivesse que escolher outro lugar para produzir, eu escolheria o Brasil. O problema de vocês, que eu vi, é logística.

BeefPoint: O que você viu de diferente no Brasil? É importante ter essa visão de alguém de fora. Quando nós estamos em uma situação, não conseguimos enxergar o que estamos fazendo de errado. O que você viu que mais te chamou atenção? Algo que não faz sentido ou que está errado para você.

Edward Green: Eu acho que quando notamos algo diferente ou estranho em um lugar, sem ter mais conhecimento sobre aquilo, é importante lembrar que há algum motivo para aquilo estar sendo feito. O que mais me chamou a atenção foi a questão da infra-estrutura, as estradas.

Se eu tivesse que pensar em algo que eu faria diferente, eu exportaria para o outro lado do mundo, para o oceano pacífico. Eu faria um acordo com o Peru, investiria mais em ferrovias e não no transporte através de rodovias, eu acho isso mais caro. Eu investiria mais no transporte marítimo. O grande mercado vai ser a China, vai ser a Ásia. Vocês precisam de uma forma eficiente de chegar a Ásia. E a melhor forma de fazer isso seria uma ferrovia até o Chile, e depois exportar por via marítima. Seria muito eficiente, rápido e barato. Muito melhor do que dar a volta ao sul da América do Sul, ou usar o Canal do Panamá.

Comentário BeefPoint: conheça abaixo mais sobre os pontos mais interessantes que Ed Green comentou na entrevista. Veja como os produtos são vendidos no site do supermercado.

Perceba que ele tem uma relação comercial muito especial, que seria um sonho no Brasil – contrato anual, sobre-preço por qualidade, relacionamento direto com o varejo e não com o frigorífico. Mas também tem muitas exigências, em relação a qualidade, padrão, certificações e rastreabilidade.

Outro ponto muito interessante é o trabalho do selo Red Tractor, que é uma iniciativa de identificar e valorizar produtos de qualidade do país. Para obter o selo é preciso ser feito na Inglaterra e precisa atender uma série de requisitos de qualidade, inclusive sustentabilidade.

Ficamos interessados também em conhecer mais sobre essa tendência das farm shops, ou lojas de produtores. Uma iniciativa muito bacana de gerar valor para os produtores e também aproximar o campo da cidade, que é um dos grandes desafios atuais do nosso setor.

Durante a conversa, falamos (e rimos) sobre a questão da sustentabilidade na europa e no Brasil. Brincamos que o Brasil é atacado por ambientalistas por ter “demorado muito para derrubar suas matas”, e ele comentou: “é isso mesmo, na Inglaterra, derrubamos todas as matas há mais de 400 anos”…

Página do supermercado Waitrose, na seção de carnes:

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Fotos retiradas do Facebook da Fazenda Farrington’s:

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Fotos retiradas do Facebook da Fazenda Darts Farm:

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Clique aqui para acessar o blog de Edward Green, no site da Instituição Nuffield Farming Scholarships.

Essa entrevista foi baseada numa conversa de Ed Green com Miguel Cavalcanti, com a participação de Alien Santos e Marina Saito, ambas do BeefPoint.

4 Comments

  1. Fabiano Pagliarini Santos disse:

    Parabéns ao Sr. Edward Green, pelo seu empenho pessoal de conhecer outros mercados e também pela diferenciação que tem sua produção, e vamos aproveitar o conselho dele, pois esta coberto de razão quando se fala em logística no nosso país.

    Precisamos reduzir o custo de transporte de todas as nossas commodities, só falta os eleitos no congresso e do executivo do país, parar de torrar dinheiro em despesas e investir em educação, saúde, segurança e infraestrutura.

    Abraço a todos e muito boa a matéria.

  2. Joao Paulo S Silva disse:

    Se tanto recurso canalizado pra a Copa fosse para aperfeicoar nossa infraestrutura de escoamento e comercializacao da nossa producao………..
    Sonho dos produtores que infelizmente nao tem representantes politicos em quantidade e qualidade para mudar este panorama de investimentos em pacotes populistas !
    Kaju
    Diretor comercial Gap Genetica

  3. Jorge Acosta Soto disse:

    Estimado Miguel:

    Una buena nota al amigo Ed, a quien acompañamos por la gira que realizó acá en Uruguay.
    Sin dudas se lleva una experiencia increíble de su recorrida pero nos brindó su su visión que todos sabremos aprovechar desde donde nos toque jugar el partido.

    Abrazo grande a la distancia y nos estaremos viendo seguramente pronto.

    Ing. Agr. Jorge Acosta Soto
    Jefe Area Informaciones
    DIAE-INAC

    • Miguel da Rocha Cavalcanti disse:

      Olá Jorge, muito obrigado pelo contato e participação.
      Em agosto vamos fazer uma viagem técnica do BeefPoint ao Uruguai. Queremos visitar o INAC.
      Um abraço, Miguel

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