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Boas perspectivas para um produtor confiável

Num momento em que a covid-19 ainda se espalha na América do Sul com a velocidade de uma nuvem de gafanhotos, é chover no molhado dizer que são muitos os desafios encarados pelo agronegócio brasileiro para manter os níveis de produção e garantir o abastecimento doméstico e as exportações de alimentos em meio à difícil tarefa de preservar a saúde das pessoas envolvidas nas mais distintas atividades do setor.

Mas, à medida em que a oferta interna é garantida a preços razoáveis e o fluxo de embarques avança, movidos por uma logística do campo às cidades e portos que até agora resiliente, o cenário de longo prazo para o campo parece cada vez mais positivo. Segundo especialistas, é como se fosse um teste no qual o Brasil, pelo menos até agora, está com resultados acima da média.

Acima da média, desde que as notas sanitárias continuem elevadas, também serão os avanços anuais de produção e exportações de algumas das principais cadeias do agronegócio do país na próxima década, como aponta o novo “Outlook Fiesp – Projeções para o Agronegócio Brasileiro 2029” (ver infográfico).

Crescimentos que, segundo o trabalho, feito pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo em parceria com a MB Agro poderão elevar a participação do Brasil nas exportações mundiais de soja de 47%, neste ano, para 53% em 2029. No caso do milho, a fatia poderá saltar de 23% para 27%, e no do açúcar de 35% para 41%. Na área de proteínas animais, o “market share” da carne bovina deverá no mínimo ser mantido em 18%, enquanto na carne de frango tende a subir de 36% para 44% e, na carne suína, poderá chegar a 10%.

“Ninguém poderia imaginar que em 2020 o mundo teria que conviver com os efeitos devastadores, para a saúde e para a economia, de uma pandemia global. A covid-19 estava fora do radar e o agronegócio também sente os seus impactos, já que não está isolado da economia. O etanol é um exemplo dessa realidade, por ser fortemente afetado pela redução do consumo. O momento é desafiador e a situação gera dúvidas e ansiedades. Entretanto, o Brasil demonstrou sua capacidade de manter o abastecimento interno e cumprir os contratos de exportação”, afirma Paulo Skaf, presidente da Fiesp.

A China continuará a ser o vetor de expansão das exportações do agronegócio brasileiro. A simbiose entre os dois países nos mercados de soja e carnes tem se consolidado apesar de declarações infelizes sobre os chineses de autoridades do governo brasileiro, e há demanda para que o Brasil diversifique as vendas. O país asiático também parece não ter condições de embarcar na onda protecionista que cresce no mundo por medo do novo coronavírus, embora continue a lançar mão de estratégias comerciais nem sempre previsíveis.

Se a China não tropeçar em seus problemas sanitários e sua economia continuar a crescer, estima o Outlook da Fiesp, o aumento de sua demanda por soja, usada sobretudo na fabricação de rações animais, será o principal motor para um crescimento de mais de 40% da produção brasileira na próxima década, que poderá se aproximar de 170 milhões de toneladas por safra.

No trabalho, outra maneira de medir a importância da China é a previsão de que a Ásia, liderada pelo país, representará 56% do aumento da demanda global por carnes até 2029. Grande exportador de proteínas animais, o Brasil já tem na China seu principal cliente para carnes bovina, de frango e suína e, como apontam as estimativas para alta dos embarques, também aqui a interdependência deverá crescer.

Olhando para frente, o estudo, como os publicados nos últimos anos, confirma que o cenário também é positivo para o consumo de alimentos no próprio Brasil, onde é vendida a maior parte da produção de quase todas as cadeias, com raras exceções – a soja é uma delas. Para soja, milho, açúcar e carnes, entre muitos outros produtos agropecuários, as perspectivas do Outlook são de crescimentos. Os destaques são os avanços previstos para soja e milho até 2029 (36% e 38%, respectivamente), necessários para sustentar a expansão da oferta de carnes.

O problema, afirmaram Roberto Betancourt, diretor do Departamento do Agronegócio da Fiesp, Antonio Carlos Costa, gerente do mesmo Deagro, e Alexandre Mendonça de Barros, sócio-diretor da MB Agro – que conversaram durante quase duas horas com o Valor sobre o Outlook – é que antes de 2029 está 2020, 2021, 2022…E nesse horizonte de prazo mais curto há obstáculos.

Preservar a saúde das pessoas e a qualidade, a sanidade e a sustentabilidade socioambiental dos alimentos em meio à covid-19 é um deles. Principalmente quando os consumidores estão mais exigentes e novas tecnologias, muitas delas desenvolvidas por um número crescente de agtechs, permitem a rastreabilidade total do que está na mesa das famílias. “O protecionismo ambiental europeu, por exemplo, está recrudescendo”, afirmou Betancourt.

E há questões domésticas importantes que estão tirando o sono de produtores rurais e agroindústrias. Há incertezas quanto à injeção de liquidez pelo governo na economia, em relação ao andamento de reformas como a administrativa e a tributária, sobre as relações trabalhistas pós-pandemia e a respeito dos níveis de desemprego. Afora o risco de elevação da tributação sobre o setor, justamente por ser um dos poucos que está crescendo durante a crise. São fatores que moldam uma fragilidade econômica que não poupa o agronegócio e pode apressar a velocidade de concentração dos negócios em alguns segmentos.

Mas isso em um ambiente de taxas de juros e inflação baixas, dólar favorável às exportações, novas fontes de financiamento – nacionais e internacionais -, mais recursos para o seguro rural e mais agilidade na comercialização interna, graças a ferramentas desenvolvidas e lições aprendidas nesta pandemia.

Fonte: Valor Econômico.

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