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Anemia e deficiência de ferro: efeitos na gravidez – Parte 1/2

Uma grande proporção de mulheres, seja em países em desenvolvimento, seja em países desenvolvidos, apresentam anemia durante a gravidez. Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) são de que de 35% a 75% (56% em média) das mulheres grávidas em países em desenvolvimento e 18% das mulheres grávidas em países desenvolvidos são anêmicas. Por essa razão e por causa das dúvidas relacionadas aos benefícios da suplementação com ferro na gravidez, existem incertezas sobre a necessidade de suplementação com ferro durante a gravidez.

Introdução

Uma grande proporção de mulheres, seja em países em desenvolvimento, seja em países desenvolvidos, apresentam anemia durante a gravidez. Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) são de que de 35% a 75% (56% em média) das mulheres grávidas em países em desenvolvimento e 18% das mulheres grávidas em países desenvolvidos são anêmicas (1). Entretanto, muitas dessas mulheres já estavam anêmicas no momento da concepção, com uma prevalência estimada de anemia de 43% em mulheres não grávidas em países em desenvolvimento e de 12% em mulheres de regiões mais desenvolvidas (1). A prevalência de deficiência de ferro é bem maior do que a prevalência de anemia e a deficiência de ferro (baixa concentração de ferritina – proteína da maior importância no armazenamento de ferro – e esparso ou ausente ferro na medula óssea) frequentemente se desenvolve durante os estágios finais da gestação mesmo em mulheres que começam a gravidez com estoques relativamente adequados de ferro (2). Por essa razão e por causa das dúvidas relacionadas aos benefícios da suplementação com ferro na gravidez, existem incertezas sobre a necessidade de suplementação com ferro durante a gravidez.

Regulação da transferência de ferro ao feto

A transferência de ferro da mãe ao feto é apoiada por um aumento substancial na absorção de ferro pela mãe durante a gestação e é regulada pela placenta (3,4). A ferritina normalmente cai bastante entre a 12ª e a 25ª semana de gestação, provavelmente como resultado da utilização do ferro para expansão da rede materna de massa de células sanguíneas. A maioria da transferência de ferro ao feto ocorre após a 30ª semana de gestação, o que corresponde ao tempo do pico de eficiência de absorção materna de ferro. A transferrina carrega o ferro da circulação materna para receptores de transferrina localizados na superfície da placenta, que acaba sendo transferido à circulação do feto. Esse sistema de transferência de ferro pela placenta regula o transporte de ferro ao feto. Quando o status de ferro da mãe é ruim, o número de receptores de transferrina na placenta aumenta, de forma que mais ferro é capturado pela placenta. O transporte excessivo de ferro pode ser evitado pela síntese placentária de ferritina. Evidências mostram que a capacidade desse sistema pode ser inadequada para manter a transferência ao feto quando a mãe está com deficiência de ferro.

Efeito da anemia na mortalidade e morbidade materna

Uma grande preocupação sobre os efeitos adversos da anemia em mulheres grávidas é a crença de que essa população tem um risco maior de mortalidade e morbidade durante o período perinatal (da 22ª semana de gestação até sete dias completos após o nascimento) (5,6). A mortalidade materna em alguns países em desenvolvimento varia de 27 (Índia) a 194 (Paquistão) mortes por 100.000 nascidos vivos (5,7). Alguns dados mostram uma associação entre um maior risco de mortalidade materna e anemia severa, apesar de esses dados serem predominantemente de observações retrospectivas de uma associação entre as concentrações de hemoglobina materna no parto e mortalidade subsequente. Esses dados não provam que a anemia materna causa maior mortalidade porque a anemia e a mortalidade subsequente podem ser causadas por algumas outras condições. Por exemplo, em um grande estudo na Indonésia, a taxa de mortalidade materna para mulheres com concentração de hemoglobina de <100 g/L foi de 70,0/10.000 partos comparado com 19,7/10.000 partos em mulheres não anêmicas (8). Entretanto, os autores acreditam que a relação entre a mortalidade materna e a anemia refletiu uma extensão maior da hemorragia e atraso no parto do que um efeito da condição anêmica pré-natal. Em outro estudo, frequentemente citado como mostrando uma associação entre a anemia maternal e a subsequente mortalidade, aproximadamente um terço das mulheres anêmicas tinham anemia megaloblástica devido à deficiência de ácido fólico e dois terços tinham tênia. Os dados para anemia foram extremamente baixos (<65 gramas de hemoglobina/L) e os autores disseram que, apesar de a anemia poder ter contribuído para a mortalidade, não foi a única causa de morte de muitas mulheres (9). Atualmente, nenhum estudo prospectivo provou que a anemia por si aumenta o risco de mortalidade materna e as informações são inadequadas sobre uma concentração estabelecida de hemoglobina abaixo da qual o risco de mortalidade aumenta. Esse valor foi sugerido como sendo 89 g/L, uma concentração associada com duas vezes o risco de morte materna na Inglaterra em 1958 (10). Esses valores de concentração de hemoglobina sugeridos por outros (9,11,12) precisam ser comprovados. O maior risco de mortalidade seria mais plausível e previsível se os mecanismos envolvidos fossem entendidos. Sugeriu-se que as mortes maternas no pós-parto podem estar relacionadas à baixa capacidade de resistir aos efeitos adversos da perda excessiva de sangue (12), maior risco de infecção e fadiga materna; entretanto, essas potenciais causas de mortalidade não foram avaliadas sistematicamente. Também existe falta de informações sobre as taxas e a severidade de infecções em mulheres grávidas anêmicas ou mulheres grávidas com anemia por deficiência de ferro. A deficiência de ferro foi associada com menores índices de estimulação de linfócitos (13) e a suplementação com ferro melhorou essa estimulação (14) em mulheres grávidas com anemia severa na Índia. Estudos adicionais com mulheres grávidas são necessários com medidas apropriadas da função imune em resposta à suplementação com ferro. Anemia materna e peso ao nascimento

A relação entre a anemia materna e o peso do bebê ao nascimento foi revisada mais extensivamente (15). Em vários estudos, uma associação na forma de U foi observada entre as concentrações maternas de hemoglobina e o peso do bebê ao nascimento (16). Concentrações anormalmente altas de hemoglobina normalmente indicam baixa expansão do volume plasmático, o que também é um risco para baixo peso ao nascimento (15,17). Menores pesos do bebê ao nascimento em mulheres anêmicas foram reportados em vários estudos (18-20). Em uma análise de dados de 691 mulheres na área rural de Nepal, reduções ajustadas no peso do recém-nascido de 38, 91, 187 e 153 gramas foram associadas com concentrações de hemoglobina de > 20, 90-109, 70-89 e <70, respectivamente. As chances de baixo peso ao nascer aumentaram junto com o alcance da anemia, aumentando com menor hemoglobina de forma aproximadamente dose-relacionada (1,69, 2,75 e 3,56 para concentrações de hemoglobinas de 90-109, 70-89 e 110-119 g/L, respectivamente) (21). Testes que incluíram grandes números de mulheres com deficiência de ferro mostraram que a suplementação melhora o peso ao nascimento (19,22). Alguns pesquisadores reportaram uma associação negativa entre a ferritina materna e o peso ao nascimento e uma associação positiva com o parto prematuro (23-25). Essas descobertas provavelmente indicam a presença de infecção, que eleva a ferritina. Anemia por deficiência de ferro materna e a duração da gestação

Existe uma quantidade substancial de evidências mostrando que a deficiência de ferro materna no começo da gravidez pode resultar em baixo peso ao nascimento subsequente ao parto prematuro. Por exemplo, mulheres galesas que foram primeiramente diagnosticadas com anemia (hemoglobina <104 g/L) na 13-24ª semana de gestação tiveram 1,18-1,75 vezes maior risco relativo de nascimento prematuro, menor peso ao nascimento e mortalidade pré-natal (16). Após controlar para muitas outras variáveis em um grande estudo na California, Klebanoff et al (26) mostrou um risco duplo de parto prematuro com anemia durante o segundo trimestre, mas não durante o terceiro trimestre (26). Em Alabama, baixas concentrações de hematócrito (percentagem ocupada pelos glóbulos vermelhos ou hemácias no volume total de sangue) na primeira metade da gravidez, mas maiores concentrações no terceiro trimestre foram associadas com um aumento significante no risco de parto prematuro (27). Quando vários fatores potencialmente capazes de gerar confusão são levados em consideração, a análise dos dados de mulheres de baixa renda, predominantemente jovens mulheres negras nos Estados Unidos mostrou um risco de parto prematuro (<37 semanas) e subsequentemente de ter um bebê com baixo peso ao nascimento que foi três vezes maior em mães com anemia por deficiência de ferro no começo do acompanhamento ou naquelas que tinham anemia por deficiência de ferro no terceiro trimestre (28). Relações similares foram observadas em mulheres da zona rural de Nepal, cuja anemia com deficiência de ferro no primeiro ou segundo trimestre da gravidez foi associada com um risco 1,87 vezes maior de parto prematuro, mas a anemia sozinha não foi (21). Em uma análise de 3.728 partos em Cingapura, 571 mulheres que eram anêmicas na hora do parto tiveram maior incidência de parto prematuro do que aquelas que não eram anêmicas, mas não foram observadas outras diferenças, seja em complicações na gravidez, seja nos recém-nascidos (29). Sendo assim, os resultados de vários estudos são consistentes com uma associação entre a anemia por deficiência de ferro maternal no começo da gravidez e maior risco de parto prematuro. A perda aparente dessa associação no terceiro trimestre é provavelmente por causa da maior concentração de hemoglobina que pode refletir a baixa expansão do volume plasmático e a incapacidade de discriminar entre a baixa hemoglobina causada pela deficiência de ferro daquela causada pela expansão do volume plasmático. Referências bibliográficas

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1 Comment

  1. Rosa Maria Souza Cardoso disse:

    Conteúdo excelente!

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