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Ambientalistas opõem-se ao desenvolvimento?

Como acontece em outras áreas - tais como as de tecnologia, de padrões de consumo e até da moralidade pública -, as grandes inovações que marcaram os avanços da civilização demoram a chegar ao Brasil. Essa é uma característica geral de países periféricos que ainda têm um peso relativamente pequeno no cenário internacional.

Como acontece em outras áreas – tais como as de tecnologia, de padrões de consumo e até da moralidade pública -, as grandes inovações que marcaram os avanços da civilização demoram a chegar ao Brasil. Essa é uma característica geral de países periféricos que ainda têm um peso relativamente pequeno no cenário internacional.

As preocupações com a preservação ambiental caem nessa categoria, como ficou evidente na década de 70 do século passado. Na Conferência de Estocolmo de 1972, que deu origem aos esforços de reduzir a poluição no mundo todo, o Brasil teve um desempenho lamentável, defendendo posições como as que o economista e ex-ministro Delfim Netto expressou recentemente em entrevista ao jornalista Ricardo Arnt: “Se diziam que a indústria do aço ia sair da Europa por causa da poluição, eu respondia: vem para o Brasil, porque temos espaço bastante para a poluição e é mais importante fazer aço; da poluição cuidamos depois” (O que os Economistas Pensam sobre Sustentabilidade – Editora 34). As percepções de Delfim Netto sobre meio ambiente, contudo, melhoraram muito desde então.

Outro exemplo é dado, no mesmo livro de Ricardo Arnt acima citado, pelo também economista e ex-ministro Maílson da Nóbrega – que naquela época era alto funcionário do Banco do Brasil -, ao lembrar que a Rodovia Transamazônica (BR-230) foi criada “em meio ao clamor para se fazer alguma coisa que permitisse a expansão da fronteira agrícola e fosse capaz de resolver o problema de seca no Nordeste”. Por essa razão, a legislação que criou a Transamazônica é a que criou o Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e do Nordeste (Proterra), que tornou viáveis migrações para a Amazônia. Conta Maílson da Nóbrega que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) chegou a fazer uma usina de álcool na Transamazônica, ignorando que a cana “era belíssima, mas sem sacarose para produzir álcool ou açúcar”.

A ideia de que reduzir a poluição torna o crescimento econômico inviável é irracional, mas foi, e ainda é, o paradigma usado por muitos economistas e desenvolvimentistas no mundo todo.

Foram essas visões incorretas que levaram ao surgimento do movimento ambientalista mais ligado à “esquerda”, que atribui o crescimento predatório a um capitalismo selvagem e, portanto, no seu entender, a solução é combater o capitalismo como um todo. Por outro lado, o ambientalismo mais ligado à “direita” vem do século 19 e tem a característica de tentar preservar o meio ambiente e a paisagem, dando a eles um sabor imobilista que às vezes serve a interesses de grupos de pressão. No atual movimento ambientalista essas duas visões coexistem.

A eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 beneficiou-se do movimento ambientalista ligado à “esquerda”. A escolha de Marina Silva como ministra do Meio Ambiente, no mesmo ano, refletiu esse apoio. Mas o que ocorreu é que o zelo da ministra em implementar a legislação ambiental logo se transformou num obstáculo às obras desenvolvimentistas que o governo pretendia realizar, como a transposição do Rio São Francisco e a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia.

A ficção de que as teses da ministra Marina Silva eram levadas a sério dentro do governo se dissipou rapidamente, resultando na sua saída do governo – tardiamente, a nosso ver. Como resultado, porém, os ambientalistas acabaram sendo caracterizados como inimigos do desenvolvimento, atrasando desnecessariamente, por motivos fúteis, obras de grande vulto, como a Usina Hidrelétrica de Belo Monte. O presidente Lula contribuiu consideravelmente para essa tentativa de desqualificação do movimento ambientalista, acusado de se preocupar mais com os “bagres do Rio Madeira” do que com a geração de eletricidade.

O problema fundamental aqui é o de distinguir entre o que os economistas chamam de “crescimento sustentável” – entendido como crescimento econômico sem sobressaltos e sem flutuações na taxa de câmbio – e o assim denominado “desenvolvimento sustentável”, em que não somente o progresso econômico é levado em conta, como também o uso eficiente dos recursos naturais, com as melhores tecnologias disponíveis e com a preservação ambiental (na medida do possível). A primeira opção (“crescimento sustentável”) é até viável por curtos períodos de tempo, mas só a segunda (“desenvolvimento sustentável”) é duradoura. A primeira olha o curto prazo e a segunda, o médio e o longo prazos, sendo evidente que o atual governo só teve em mente o curto prazo.

Por exemplo, o desmatamento da Amazônia para expandir pastagens para gado é uma atividade de baixo rendimento econômico que terá sérias consequências, porque vai mudar (e está mudando) o regime de chuvas de todo o País, além de contribuir significativamente para as emissões de gases que provocam o aquecimento global. Portanto, é essencial dirigir os rumos do crescimento econômico da região em outras direções, o que não foi feito. Argumentar que a Europa também destruiu suas florestas para progredir e que agora querem impedir-nos de fazer o mesmo reflete pura ignorância: a eliminação das florestas europeias ocorreu ao longo de mil anos e o Brasil está fazendo isso em 30 anos, na Amazônia.

As únicas medidas sérias tomadas no Brasil nos últimos anos para orientar o País na direção do desenvolvimento sustentável foram a aprovação de leis propostas pelo prefeito Gilberto Kassab, no Município de São Paulo, e pelo ex-governador José Serra, no Estado de São Paulo, que estabelecem metas e prazos para reduzir as emissões de carbono (e outros poluentes) até o ano 2020. Essas leis vão conduzir o País a uma economia de baixo carbono e não constituem um freio ao crescimento econômico, mas, ao contrário, levarão a uma modernização da indústria brasileira, o que aumentará sua competitividade no comércio internacional.

Esse artigo foi originalmente publicado no jornal Estado de SP, reproduzido aqui com autorização do autor.

0 Comments

  1. Pedro Eduardo de Felício disse:

    Cumprimento a direção do Beefpoint pelo belíssimo artigo do ex-reitor da USP, Prof. José Goldemberg. Espero que os leitores acostumados com críticas pesadas aos ambientalistas parem um pouco para refletir sobre o que diz quem verdadeiramente entende da matéria. É hora de nós que somos ligados à agropecuária fazermos um esforço de adaptação a uma nova realidade, porque o comércio internacional de alimentos irá valorizar quem produz de modo sustentável e, ainda que não fosse por isso, todos temos ou teremos filhos e netos que habitarão este planeta Terra, não há outro à vista.
    Ao professor Goldemberg meu respeito e consideração, feliz o povo que tem inteligências privilegiadas como a sua voltadas para o bem.

  2. Ciro Fernando Assis Siqueira disse:

    Professor Goldenberg desliza na retórica em razão do legítimo e louvável anseio de proteger o meio ambiente e o planeta.

    A conferência de Estocolmo em 1972 foi fortemente influenciada pelo relatório do Clube de Roma, publicado no mesmo ano e intitulado Limites do Crescimento. O relatório propôs abertamente o crescimento zero como unica forma de compatibilizar a vida humana na terra com os limites ambientais do planeta.

    A ideia de que reduzir a poluição torna o crescimento econômico inviável não é irracional como afirma o Professor. Embora compatibilizar crescimento econômico e conservação ambiental seja perfeitamente possível, limitar ou atrapalhar o crescimento econômico convencional é uma forma pragmática de poupar recursos naturais e ganhar tempo. O movimento ambientalista que atua no Brasil sabe disso.

    É muito difícil transformar a economia convencional, aquela no velho Delfim Neto, em uma nova economia sustentável, mais próxima do sonho de Ignancy Sachs, Nicholas Goergescu-Roagen e David Pearce. Muitos ambientalistas preferem o caminho mais curto de impor obstáculos à economia convencional não se importando com as consequências dessa atitude em termo de redução de empregos, renda e bem estar social.

    O Brasil precisa estar atento a esse tipo de impostura verde. Quem se preocupa com o meio ambiente no Brasil o no mundo deve saber diferenciar o ambientalistmo humano, soberano e responsável que busca o desenvolvimento sustentável do ambientalismo irresponsável e quasi-fascista que algumas pessoas e ONGs praticam abertamente no Brasil que busca SIM atrapalhar o cresciemnto econômico como forma de preservar o meio ambiente.

    Por mais paradoxal que possa parecer existem ambientalistas canalhas.

  3. wilson tarciso giembinsky disse:

    Eu e minha esposa temos quase 33 anos na convivência sustentável entre produção, recuperação, preservação ambiental de recursos hídricos, flora e fauna.

    A nossa formação de biólogos, o nosso trabalho de produtores rurais e nossa consciência ambiental nos levou a isto!
    Não visamos o lucro acima de tudo como dizem os ambientalistas, mas precisamos sobreviver dignamente….

    Quem produz sabe que não pode depredar a natureza, não pode destruir seu meio de produção e subsistência.
    Nós perenizamos um córrego, recuperamos e preservamos cerca de 60% de nossa propriedade (somos obrigados a 20%) usando no$$o bol$o…
    Sabemos o quanto isto custa e esperamos ter a devida retribuição da humanidade aos nossos esforços físicos e econômicos!

    Propomos que cada proprietário urbano invista pelo menos 20% do valor do imóvel cadastrado no IPTU, em áreas rurais de preservação nativa. (é para ele que produzimos alimentos, água, oxigênio e sequestrando carbono).
    Assim eles também dariam sua contribuição ao desenvolvimento sustentável.
    O proprietário rural, que possui imóvel urbano, já investiu portanto está isento

    Propomos que as áreas ambientalmente preservadas, que excedam às áreas de APPs e RL, não sejam computadas para cálculo de produtividade.

    Propomos que as máquinas agrícolas destinadas à produção de alimentos sejam totalmente isentas de qualquer tipo de imposto, assim o governo faria parte de sua função social. Já que não cumpre com a sua função social constitucional de fornecer saúde, educação, segurança, saneamento e infra estrutura, também junto ao homen do campo….

    Que nos paguem por sequestrar carbono, produzir água e oxigênio, já que nos pagam muito mal pelos alimentos que somos obrigados a produzir para cumprir a função social da propriedade……

    SE VOCÊ SE ALIMENTA, VESTE, CALÇA, BEBE E RESPIRA…. AGRADEÇA A UM PRODUTOR RURAL QUE PRODUZ ALIMENTOS, FIBRAS, COUROS, ÁGUA E OXIGÊNIO….. ALÉM DE SEQUESTRAR O CARBONO QUE VOCÊ EMITE….

  4. dalton domingos da mata disse:

    Bem, claro que o desmatamento na europa ocorreu durante centenas de anos, mas não se pode comparar… Ha mil anos existia tratores traçados como hoje? existiam maquinarias de alta efeiciencia? Não, era tudo a mão, a demanda era baixissima, praticamente para sustento próprio, lareiras, fogoes alenha, hoje o mundo anda muito mais rápido do que a 50 anos atrás, e a demanda gigantesca, por exemplo.. um computador de 2010 em 2011 é ultrapassado, isso acontecia a 60, 70 anos atras ? muito menos a 500 anos. Não se pode misturar maças com laranjas. Tempos diferentes.

  5. Janete Zerwes disse:

    Prezados Professor Goldemberg e produtores,

    Ao abordar a questão “desenvolvimento sustentável”, logo as opiniões se dividem, divergem, multiplicam-se e se confundem. É natural que isso aconteça, ao lidar-se com conceitos.

    As primeiras confusões se referem as duas palavras mais usadas nas discussões: crescimento e desenvolvimento. Antes de colocá-las sob o enfoque econômico, como acontece normalmente, seria interessante estabelecer um consenso sobre o significado adotado para as mesmas:

    Crescimento – Ação ou efeito de crescer.

    Desenvolvimento – Ato ou efeito de desenvolver; crescimento ou expansão gradual; (e a definição mais interessante para a presente discussão) passagem gradual de um estágio inferior para um estágio mais aperfeiçoado.

    O conceito de desenvolvimento sustentável fez parte de debates internacionais, onde a noção de desenvolvimento ligada à idéia de crescimento foi reavaliada, resultando desses debates, o conceito, propriamente dito, de sustentabilidade. Bellen, Hans Michael van. Indicadores de sustentabilidade: uma análise comparativa. Rio de Janeiro. 2007.p. 21.

    A abordagem simplista e algumas vezes ideológica, adotada pela mídia, relativa às transformações climáticas no planeta terra, no primeiro momento, deixou de lado a responsabilidade ambiental relativa ao crescimento econômico apoiado no consumo de bens supérfluos (digo supérfluos, por que a maior parte desses bens não se enquadra como necessidade essencial, nem para sobrevivência do homem, nem para seu conforto), e, direcionou o foco e a responsabilidade sobre as alterações climáticas para os desmatamentos no Brasil. Com isso foi atingida frontalmente a economia agrícola e a imagem do produtor perante a opinião pública.

    Ao pensar que o desenvolvimento sustentável só se efetiva quando sua base conceitual está apoiada em valores éticos, culturais e vocacionais, conforme ficou claro na Agenda 21 – CNUMA – Rio de Janeiro em 1992; e, considerar além desses valores: demandas de alimentos e matérias primas industriais oriundas da agricultura; dinâmicas de crescimento econômico internacionais e nacionais;impactos ambientais provocados pela produção agrícola uniforme; e, a capacidade de recuperação ambiental ao longo do tempo, nos deparamos com a imensa complexidade imposta à aplicação do conceito de sustentabilidade, não só para o setor agrícola, mas para a sociedade como um todo.

    É preciso compreender que na discussão do tema Desenvolvimento x Meio Ambiente, não cabem ideologias políticas nem interesses imediatistas entre mercados concorrentes. É imprescindível compreender que aplicar o conceito Sustentabilidade às atividades humanas, sejam elas, sociais, ambientais ou econômicas, implica em mediar, Ecologia e Economia através da Ciência, implica em agir a favor da humanidade e da natureza na manutenção do planeta onde vivemos, tanto para as gerações presentes, como para as gerações futuras.

    Comissão de Produtoras Rurais – Famato – MT

  6. Vigilato da Silva Fernandes disse:

    considero o discurso ambientalista pouco técnico, incoerente, cientificamente incorreto muitas vezes e em grande parte das vezes fanatico…pouco embasado, pouco objetivo… extremamente injusto e muito pouco brasileiro… mas vamos la, de alguma maneira temos que preservar o meio ambiente não resta duvida.Vamos mudar o foco da discussão, penso que devemos aprofundar a questão no sentido de definir quem deve pagar essa conta, ou arcar com os custos de tudo isso…quem sao os verdadeiros poluidores,seria justo lançar todo o onus da preservação ambiental sobre o produtor rural.?..a industria, o meio urbano, a prestação de serviços, as empresas, o governo, não tem nada a ver com isso???parece brincadeira… assim fica insuportável…mas realmente nao temos que estabelecer comparações com a Europa…se desmatou ou se não desmatou… são gente diferente, outra cultura, outra vocação….ganham muito em outros seguimentos da economia…são paises ricos, desenvolvidos, o que não podemos e aceitar uma receita vinda de fora, elaborada por eles…nos curvarmos em suas convençoes e conferências a despeito de nossos proprios interesses e necessidades…considero ser necessário repensar tudo isso antes de jogar o peso sobre o ombro do produtor rural…

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