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Acordo entre UE e Mercosul beneficia a carne argentina

No mundo da carne, a Argentina desponta como a principal beneficiada pelo acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. Se é verdade que os exportadores de todos os países que fazem parte do bloco sul-americano receberão uma injeção de rentabilidade de até 40%, os hermanos abocanharão a maior parte das cotas de exportação de carne bovina com tarifa zero ou imposto reduzido.

Na prática, os argentinos terão acesso a cotas de 50 mil toneladas de carne bovina. O Brasil, que tem um rebanho bovino quatro vezes maior que o do vizinho e é o principal exportador mundial de carne, ficará com cerca de 38,5 mil toneladas. O Uruguai terá 20,4 mil toneladas e o Paraguai, 5,7 mil.

Em 2018, os frigoríficos brasileiros receberam US$ 705,6 milhões ao exportar 116,7 mil toneladas à União Europeia, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pelo Ministério da Agricultura. As exportações da carne argentina, mais valorizada no exterior devido à tradicional qualidade, somaram 47 mil toneladas e renderam US$ 490 milhões, de acordo com dados da indústria local.

A vantagem de cota que os argentinos terão com o acordo entre UE e Mercosul é uma herança da cota Hilton, válida para cortes nobres. Essa cota, que já conta com tarifas de importação menores, terá a alíquota zerada com o acordo.

Atualmente, a cota Hilton possui uma tarifa de 20% e, no Mercosul, a Argentina detém o maior volume dela: 30 mil toneladas anuais. Para os brasileiros, o limite é de 10 mil toneladas, mas as indústrias nacionais dificilmente conseguem cumpri-lo devido às restrições do protocolo sanitário com a União Europeia. No último ano-fiscal, encerrado em junho, os frigoríficos brasileiros ocuparam 41% da cota Hilton.

Além de eliminação total da tarifa de importação de carne bovina por meio da Hilton, o acordo comercial prevê a criação de uma cota de 99 mil toneladas de carne bovina em equivalente carcaça (67 mil toneladas de carne bovina, efetivamente), com tarifa de 7,5%. Essa cota levará seis anos para ser implementada no volume total, contados a partir da entrada em vigor do acordo comercial – o que deverá demorar no mínimo dois anos.

No caso dessa nova cota, o Brasil ficará com a maior parte. A divisão foi definida pelo setor privado dos países do Mercosul em um acordo assinado em 2004 que deu aos brasileiros 42,5% do volume (cerca de 28,5 mil toneladas). A Argentina terá 29,5% (19,7 mil toneladas).

Ao Valor, uma fonte da alta cúpula de um dos maiores frigoríficos brasileiros argumentou que a vantagem argentina poderá atrair novos investimentos ao país, caso o acordo comercial saia do papel. O parque frigorífico argentino é pulverizado e fontes do setor acreditam que um movimento de consolidação ocorrerá no médio prazo.

No setor privado, as brasileiras Marfrig e Minerva estão em melhor posição relativa para se beneficiar da redução tarifária proporcionada pelo acordo comercial. As duas empresas estão entre os principais frigoríficos da Argentina. No Uruguai, a Marfrig é a maior empresa privada, ao passo que a Minerva, que também atua no mercado uruguaio, detém cerca de 50% da capacidade de abate no Paraguai. A JBS, maior produtora de carne bovina do Brasil e do mundo, deixou de atuar em outros países do Mercosul em 2017, quando vendeu as operações de carne bovina à Minerva.

Se a distribuição da nova cota entre as empresas seguir os mesmos critérios da Hilton (que continuará existindo), a Marfrig ficará com a maior cota de carne bovina entre os frigoríficos do Mercosul.

No último ano-cota europeu, a empresa comercializou 6,2 mil toneladas por meio da Hilton – 1,033 mil a partir do Brasil, 1,6 mil toneladas do Uruguai e 3,6 mil na Argentina. A Minerva, por seu turno, exportou 5,4 mil toneladas (440 toneladas do Paraguai, 1,2 mil toneladas do Uruguai, 1,3 mil toneladas do Brasil e 2,4 toneladas mil da Argentina). A JBS, por fim, embarcou 1,6 mil toneladas de carne a partir do Brasil.

Estimativa preliminar de uma fonte da indústria indica que as cotas de carne bovina do acordo comercial poderão, com a redução de impostos, agregar 40% da receita com as vendas de carne à Europa aos frigoríficos, considerando os preços médios atuais. Parte desse valor, no entanto, deve ser capturado pelos importadores europeus.

O benefício potencial é significativo porque as tarifas atuais pagas pelos frigoríficos para exportar aos europeus são altas, sobretudo para a carne comercializada fora da cota Hilton e da cota do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês), que é de 54,5 mil toneladas de carne bovina congelada e também tem uma tarifa de 20%. No caso da GATT, o volume determinado é válido para todas as regiões do mundo, não só para o Mercosul. Fora da cota, a tarifa de importação é de € 3,04 por quilo, mais 12,6%. Em geral, os frigoríficos do Brasil exportam cortes nobres (como filé mignon e contra filé) fora da cota.

Como a tarifa fora da cota é muito elevada – o que chega a dobrar o valor da carne no mercado europeu -, não é possível vender cortes mais baratos, em especial as partes do dianteiro bovino.

Na avaliação do presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Antonio Jorge Camardelli, é justamente aí que reside a grande oportunidade para o Brasil. Segundo ele, a cota de 67 mil toneladas, com tarifa de 7,5%, permitirá a exportação de cortes do dianteiro para serem usados para processamento por indústrias europeias.

Fonte: Valor Econômico.

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