Atacado – 09/10/08
9 de outubro de 2008
Mercados Futuros – 10/10/08
13 de outubro de 2008

A crise e a cadeia produtiva da carne

Segundo o relatório do FMI divulgado essa semana, este foi o maior choque nas economias dos países desenvolvidos desde a década de 30, quando as pessoas faziam fila para jogar-se do alto dos prédios de Wall Street. No velho continente a recessão deve atingir a Espanha, Inglaterra e Itália. A Alemanha e a França devem apresentar estagnação econômica no ano que vem. A recessão ainda não é oficial nos EUA, mas está a caminho. Os países em desenvolvimento devem apresentar um crescimento por volta de 6%, mas a economia mundial não deve crescer mais que 3%, o que poderia ser considerado como uma recessão mundial. Dentro deste cenário seria pouco provável que o setor não fosse atingido e que a demanda pelo nosso produto não diminua.

Segundo o relatório do FMI divulgado essa semana, este foi o maior choque nas economias dos países desenvolvidos desde a década de 30, quando as pessoas faziam fila para jogar-se do alto dos prédios de Wall Street. No velho continente a recessão deve atingir a Espanha, Inglaterra e Itália. A Alemanha e a França devem apresentar estagnação econômica no ano que vem. A recessão ainda não é oficial nos EUA, mas está a caminho. Os países em desenvolvimento devem apresentar um crescimento por volta de 6%, mas a economia mundial não deve crescer mais que 3%, o que poderia ser considerado como uma recessão mundial. Dentro deste cenário seria pouco provável que o setor não fosse atingido e que a demanda pelo nosso produto não diminua.

Estimativas consideram que o mercado interno absorve em torno 80% do volume, mas as exportações sempre serão um importante agente dentro da cadeia. O nosso maior cliente para carne bovina, a Rússia, passa por uma grave crise. Em duas oportunidades a bolsa registrou perdas de 20% nas ultimas semanas. Um operador que esteve na feira de Moscou na semana passada relatou que o crédito, presente em quase todas as operações de importação de carne, é quase inexiste e ainda há milhares de toneladas paradas nos portos esperando para ser renegociadas, já que é impossível repassar ao consumidor final o preço em que foram fechadas.

Tampouco há outro destino que possa absorver este produto aos níveis que foram vendidos. Em julho forçados pela alta do boi, os preços bateram recordes históricos, o Recorte 80vl foi negociado ao redor de USD 3.600/mt FOB, hoje não há demanda para o este produto que está sendo ofertado a USD 2.800/MT FOB. Ao estoque acumulado nos portos e a mercadoria em trânsito, somasse as ofertas que não encontram compradores o que vem derrubando os preços em todos os mercados. Ainda estamos longe de encontrar o piso em termos de preço.

A aprovação de novas fazendas para a Europa é uma alternativa para a carne de alta qualidade, mas os preços por lá também estão em queda livre. O Rump and Loins, uma combinação dos cortes mais caros do boi que atingiu USD 18.000/FOB no meio do ano, hoje se encontra a USD 13.000 e em queda livre.

Europa e Rússia não são exceções, todos os mercados de volume estão contraídos e caminham para uma redução na importação. Em resumo, existe um estoque considerável, o mercado sofre fortes pressões para baixar e a confiança foi fortemente atingida pelo cenário externo.

O mercado interno tem sido o melhor argumento para a alça dos preços da carne este ano. A economia brasileira apresentou um desempenho histórico nestes últimos anos. A FGV estima que mais de 52% das famílias brasileiras recebam entre R$ 1.000,00 e R$ 4.000,00 o que as colocaria entre a classe média. Em 2002 este número estava ao redor de 40%. Até pouco tempo, a carne foi considerado um artigo de luxo na mesa dos brasileiros, mas com o aumento do poder de compra e uma baixa cotação do dólar, a realidade mudou.

Segundo afirma o Sr. Ilan Goldfajn, em reportagem da revista The Economist de 11 de setembro deste ano, talvez seja muito tarde para evitar a ressaca causada pelo excesso do consumo doméstico. O endividamento vai desde crediários nas Casas Bahia até a compra da casa própria, passando por um crescimento sem procedentes na venda de carros.

Mesmo que o presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva afirme que nós estamos livres da crise e a culpa é do FMI e dos “países ricos”, nós não podemos negar que o crescimento do Brasil também foi motivado pela bolha de crédito e como disse o Arnaldo Jabor esta semana no noticiário da Globo, “nós também somos filhos da bolha”. Estamos mais sólidos do que nunca para enfrentar a crise e até poderemos sair fortalecidos desta crise mundial, mas com certeza vamos ver uma redução forte na demanda de carne dentro do mercado nacional.

O preço do boi este ano teve um desempenho bastante difícil de justificar dentro da cadeia produtiva. Empurrado pelas cotizações das commodities agrícolas e pelo bom consumo interno a cotação do boi no Brasil atingiu a marca de R$ 100,00/@, ultrapassando os preços de países como Uruguai, EUA e Austrália, que podem ofertar seus produtos no circuito não aftosico onde historicamente os preços da carne sempre foram mais altos.

A dificuldade em remunerar o alto custo da matéria-prima levou a quebra de um dos maiores frigoríficos do país e nas acusações de práticas de dumping no setor. A meteórica subida do boi não foi motivada pelo aumento de demanda, mas por dois fatores que dificilmente poderão sustentar a cotação do boi ao nível que está.

O primeiro fator como já citei foi a escalada das commodities agrícolas empurradas pelo capital especulativo que fugia da crise da hipoteca. Os preços atrativos motivaram uma demanda maior por terra o que acabou competindo com o boi em muitas regiões do país.

O segundo fator e talvez o mais relevante foi o aumento da capacidade produtiva dos grandes frigoríficos do país. O aumento foi tão desproporcional que segundo a revista Exame, o Brasil só terá gado suficiente para preencher a capacidade de abate em 2020. Nos últimos anos os frigoríficos tiveram um desempenho incrível, o que motivou a ganância de muitos bancos de investimento, os mesmos bancos que quebraram Wall Street. Assessorados por estes “magos dos negócios”, os grandes frigoríficos fizeram suas aberturas na bolsa. O negócio da carne brasileira que podia ser analisado de uma forma simplista como “produzir um produto de qualidade a preços competitivos” se desvirtuou totalmente e os frigoríficos passaram a valer mais pelos seus negócios na bolsa do que pelo resultado operacional. Em outros tempos o frigorífico poderia optar por não abater caso o resultado não fosse atrativo, mas para as empresas em bolsa isso não é uma opção já que não podem parar de faturar ou perdem mais dinheiro com as suas ações na bolsa do que com a operação de abate e venda da carne.

Pelo que podemos ver nos últimos dias nos mercados do mundo inteiro onde fortunas estão se derretendo, chegou ao fim o modelo de negócio que primava por ganhos na bolsa. Até o momento, as grandes empresas do setor frigorífico não tiveram dificuldade em obter crédito para operar com rentabilidade negativa esperando dias melhores, no entanto a falta de liquidez no mercado mundial não ira consentir tais operações e a cadeia deve se ajustar em busca de rentabilidade. O setor da carne deve focar-se nos fatores que nos levaram a posição de maior exportador de carne bovina mundial, os baixos custos de produção e a alta qualidade.

0 Comments

  1. Luiz Sérgio Dias da Silva disse:

    Crise Internacional e Adaptabilidade da Cadeia Produtiva de Carnes.

    Como bem disse FHC, Polyanas – não apenas uma – estão exagerando na dose de contentamento.

    Tentemos olhar para o segmento produtor de Carnes Bovinas, Suínas e de Aves com um olhar mais agudo e chegamos à conclusão que se não há crise como dizem as Polyanas, temos pela frente o esboço de um quadro desolador.

    Na última década, ativos foram comprados quase que semanalmente pelos (hoje) principais atores do setor. A Marca registrada para estas aquisições passou a ser a EBDITA (Earnings Before Depreciation, Interest, Taxes and Amortization, em Inglês) ou Margem Antes do Pagamento de Depreciações, Juros e Amortizações.

    Recomendo especial atenção à palavra ANTES.

    Importante? Sim a EBDITA é muito, muito importante. Mede a capacidade da empresa para gerar recursos para garantir a renovação de ativos operacionais (depreciação), para pagamento de juros sobre financiamentos tomados, Pagamento de Taxas e Impostos diversos (Imposto de Renda) e, obviamente, a Amortização dos empréstimos contraídos, sempre e quando vistos sob a ótica de uma atividade continua e sujeita a intempéries de baixa magnitude.

    O problema surge quando encontrarmos pela frente com Ativos (Plantas e/ou Empresas) comprados e ainda não liquidados. Se já foram liquidados fica a pergunta, os recursos são orgânicos (próprios) ou não. Se não são, provavelmente, existem por trás delas pesados e custosos financiamentos que foram e estão atrelados a EBDITA. Num momento de intempéries muito fortes e queda de preços, como agora, aliás, ainda que se preserve a margem EBDITA, será necessário manter os preços nos níveis atuais para manter o fluxo de caixa e de pagamento de todos os itens que compõem a EBDITA. Isto não acontecerá. Os preços em geral devem cair e muito. Como conseqüência, os prazos para pagamento de empréstimos terão que ser dilatados, o período de amortização de todos os bens alongados, impostos e taxas perdoados e a amortização, no mínimo, rediscutida.

    A EBDITA é uma margem e como tal deve ser encarada. Margem significa aquilo que está fora do leito principal e à sua beirada, do lado externo. Ter 10, 15, 20, 30% ou quanto queiram de Margem EBDITA não significa absolutamente nada. É preciso que a EBDITA representada em % seja convertida em moeda corrente (Reais ou qualquer outra) para se apurar a capacidade da empresa de fazer frente aos compromissos assumidos, portanto precificados.

    Se os preços caem e a EBDITA continua a mesma, é natural que haja redução proporcional à queda de preços do volume de recursos (produtos da conversão de EBDITA em moeda corrente, na formação de recursos para pagamento dos compromissos. Esta queda só se compensa com aumento de volume na proporção (quase) direta da queda de preços verificada.

    Portanto: margem é diferente de contribuição. Como conseqüência, não é possível falar em EBDITA como alavanca ou como medidor de “sanidade” financeira. Apenas e tão somente como mero indicador de margem. Se não estiver atrelada a indicação de custos ou de preços de vendas, significa absolutamente nada. Note-se ainda que, sem a visão de reposição de insumos e do comportamento de seus preços/custos de longo prazo fica impossível calcular qual a contribuição futura que será gerada e daí permitir a contração de compromissos igualmente de longo prazo.

    Na economia Real, o melhor e mais simples exemplo de medição de “sanidade financeira” ainda é o resultado da equação:

    Estoque nas Prateleiras + Caixa – Compromissos a Pagar > ou = 1
    Custos de Reposição

    Quando o índice é igual a 1, a empresa não cresce. Também não diminui.

    Menor que 1, risco a vista. Empresa está decrescendo na capacidade de gerar resultado.

    Se maior que 1, cresce e indica sua capacidade para investir em novas unidades produtoras, etc. pelo valor exato do quociente.

    O Pecuarista de Bovinos faz esta conta todos os dias. É o que chamamos comumente de reposição.

    Claro, há outros fatores a serem considerados, como por exemplo, o giro da atividade/cadeia.

    No Giro reside a capacidade da cadeia produtiva se readaptar a novas realidades e acomodar a situação entre seus agentes.

    A cadeia produtora de carnes bovinas tem agentes independentes. Produtores de sêmen, de touros, de vacas, de bezerros, de animais magros, animais gordos.

    A cadeia produtora de carnes suínas tem grande parte de sua produção dirigida e controlada (integrada) pelas indústrias de transformação (frigoríficos).

    A cadeia produtora de aves, mais ainda que a de carnes suínas, também é dirigida e integrada em sua maioria pelas indústrias.

    As três cadeias têm giros de estoques completamente diferentes, em função do tempo demandado para se obter um animal “maduro para abate Industrial”.

    Um boi, com sorte é abatido com 3 anos (1080 dias). Melhor esquecer as vacas de descarte para este raciocínio.

    Um suíno, em geral demanda 6 meses (180 dias) ou menos.

    Um Frango, no máximo 2 meses (60 dias, exageradamente).

    Um ano tem 360 dias. (bois, aves e suínos, comem e crescem aos sábados, domingos e feriados).

    Desta forma, quando um produtor rural entrega um produto (animal) para a indústria, um novo produto começa a ser produzido.

    Por decorrência, temos os seguintes índices anuais de giro da atividade:

    • Bovinos: 360/1080 = 0,3333 vez
    • Suínos: 360/180 = 2 vezes
    • Frangos: 360/60 = 6 vezes

    Não importa outros tempos. Esta é a raiz do giro. Se há abate de um frango novo é porque o anterior já foi consumido ou passado ao próximo elo da cadeia. Igualmente para os bovinos e suínos. Afinal, em macroeconomia, produção é igual a consumo.

    Quando acontecem reduções/retrações de consumo, a cadeia se readapta. Mais facilmente nas aves, depois nos suínos e por fim nos bovinos. Eliminam-se excessos de produção com muito mais facilidade quanto maior for a capacidade de giro da atividade da cadeia. Afinal, quem não se lembra do que ocorreu quando pipocaram casos de gripe aviária pelo mundo todo? Grandes produtores voltados a exportação, da noite para o dia, desviaram seus estoques para o mercado doméstico e realinharam os fatores de produção de acordo com o novo cenário que se criou.

    Não será diferente agora. A crise financeira Internacional realinhará todos os preços. As indústrias voltadas a atividades de maior giro terão maior facilidade de se readaptar a nova realidade.

    Ainda que haja redução da margem EBDITA, haverá também o repasse para todos os elos da cadeia na razão do giro da atividade. Quando houver alta do EBDITA isto é igualmente verdadeiro.

    O fato de a pecuária bovina ter elos independentes complica o repasse das margens ou de suas alterações. A moeda de troca do bovinocultor é rês (cabeça) e não EBDITA. Sua riqueza é tanto maior quanto maior for o numero de reses que ele possua. Afinal, ele não compra frigoríficos.

    Corremos o risco de agora submeter indústrias à obsolescência e corrosão por termos investido pela EBDITA.

    O rebanho bovino caiu de 204 milhões em 2005 para algo em torno de 185 a 190 milhões nos dias atuais. O abate massivo de fêmeas impõe a necessidade de preservação desta espécie para reposição do rebanho. Isto pode (e vai) diminuir ainda mais o giro da atividade bovina.

    A capacidade de abates dos frigoríficos de bovinos é muito superior a taxa de desfrute ou giro. Enquanto desfrutamos, anualmente, de 45 milhões de cabeças bovinas para abate, temos capacidade instalada para abater 70 milhões de reses.

    A EBDITA não pagará a ociosidade. Ainda que ela, EBDITA, permaneça rigorosamente nos mesmos níveis que estava à época do investimentos nestes ativos.

    Se a EBDITA for de 100%, mas o abate for de apenas 1 cabeça, como pagar um frigorífico que custou R$ 35 milhões para ser construído e que foi adquirido por 60, 70 ou mais milhões.

    Era por conta da EBDITA que os preços subiam no mundo todo. Isto tudo vendido por banqueiros que ofereciam dinheiro para empresários desde que compravassem uma margem EBDITA satisfatória para eles.

    Frigoríficos terão que socializar o prejuízo e restam poucas alternativas, transferir o prejuízo para os acionistas e para campo (pecuarista). É hora de convidá-los a participar do fim da festa. Talvez seja melhor dizer convidá-los a limpar o salão de festas. Será que eles aceitam?

    Sim, houve melhoria nos preços. Agora temos que agüentar a ressaca que virá com a queda deles. A ressaca será longa e forte. Mais na bovinocultura do que suínos e aves

    “Ceteris Paribus”.

  2. Francisco de Paula Barreto Neto disse:

    Parabéns pelo artigo de tamanha lucidez!

  3. Rodrigo Netto disse:

    Prezado Francisco de Paula Barreto Neto,

    Muito obrigado pelo elogio ao artigo que é na verdade um convite ao debate, na busca de construir uma cadeia sustentavél, e rentavel para todos.

  4. Orazio Papa disse:

    Sr. Luis Sergio:

    Venho parabeniza-lo pelo artigo altamente técnico.

  5. Deniz Ferreira Ribeiro disse:

    Em meu entendimento além de sua oportunidade, o artigo está recheado de comentários e raciocínios lógicos e bem articulados. Parabéns ao seu autor.

    Parabéns também ao sr. Dias da Silva pelos seus felizes comentários que abordam a questão por um ângulo diverso. Apesar da alta qualidade do material exposto pelo articulista e seu comentador, nos vemos forçados a chamar a atenção para a candura e simplicidade com as quais ambos entendem deva se processar o necessário ajuste pelo qual a cadeia da carne deverá passar para enfrentar essa nova realidade apresentada pela eclosão da crise financeira mundial.

    A cadeia da carne é entendida por eles como se fosse constituida de elos equilibrados, que saberão, portanto, trabalhar em conjunto pela superação das dificuldades futuras. Lêdo engano!

    No ramo ascendente da curva do ciclo econômico mundial, seus benefícios em nada contemplaram os produtores de matéria prima – muito pelo contrario – estes foram prejudicados pela prática de uma política selvagem e extorsiva dos frigoríficos, cujos “olhos cresceram” com tanta prosperidade à vista; a demonstração mais clara desse fato é, de um lado, o cadenciado encolhimento do rebanho bovino, consequência da redução gradativa de rentabilidade da atividade pecuária de corte, e de outro, a orgia de investimentos mal planejados, com enormes desperdícios, a título de “modernização”, praticado por uma geração de administradores jejunos na atividade empresarial.

    Agora estamos assistindo ao provável início do ramo descendente da curva do ciclo; ninguém ousa prever a rapidez de sua queda nem sua duração; querer neste momento, no qual a atividade pecuária de corte mal ensaia uma recuperação da rentabilidade perdida na fase anterior, que a produção de matéria prima arque com parte dos ônus dêsse ajuste, sem ter sido premiada com os bônus da fase antecedente, é no mínimo, contraditório. Caso a realidade da demanda de carne, doméstica e externa, venha a impôr a prática de preços de mercado abaixo dos R$ 100 por arroba, não há a menor sombra de dúvida que a escassez de matéria prima se tornará um dado estrutural na cadeia da carne.

    Em relação ao mercado externo, ainda existe muita dúvida quanto aos níveis de preços que se estabelecerão num futuro próximo, passada a tempestade dos dias que correm; a mudança de atitude dos especuladores de estoques dará o tom; quanto a grandes reduções de demanda devido à recessão global, é preciso considerar, de um lado, que embora se trate de um produto nobre, a demanda de proteína animal não é tão elástica quanto parece à primeira vista, e de outro, que os mercados emergentes serão muito menos afetados do que se imagina. O que haverá, isto sim, é um período de acomodação a novas modalidades de comércio, nas quais os componentes financeiros terão que ser revistos em seus fundamentos.

  6. Rodrigo Netto disse:

    Prezado Sr. Deniz Ferreira Ribeiro,

    Muito obrigado pelas palavras ressaltando a qualidade do texto e gostaria também de salientar que seus argumentos são também embelezados por um texto bem articulado e rico em vocabulário, no entanto o texto me parece à simples expressão de um desejo, já que o mesmo não se sustenta em números e fatos concretos.

    Divido da sua opinião a respeito da falta de harmonia entre os elos da cadeia e seus administradores jejunos que não souberam gerir o significativo montante de recursos que foram injetados no setor, perdendo a singular oportunidade de tornar a cadeia mais sustentável.

    Mas devemos ressaltar que a pecuária mesmo que não intencionalmente se beneficiou da orgia e o resultado prático disto é a cotação recorde atingida este ano. Mesmo que a cadeia não apresente uma relação harmônica entre os elos, e alguns fatos tardem mais para atingir a outra ponta, em longo prazo o preço da matéria-prima deve ser sustentado pela demanda e a redução da demanda deverá atingir a pecuária nacional.

    O caso do Uruguai onde a cadeia é bastante mais integrada, e melhor gerida devido à importância do setor para a economia nacional, pode ser um exemplo claro para ilustrar os efeitos da demanda externa no preço do boi, no meio deste ano quando a carne atingiu preço auge no mercado externo, o preço da carcaça no Uruguai era de US$3,40/kg (equivalente a R$ 82,00/@, naquela época), hoje o boi vem acompanhando a redução dos preços externos e já perdeu ao redor de 30% do seu valor, se situando na casa dos U$2,40/kg. As perdas, no entanto são amenizadas pela cotação cambial. No Brasil onde essa relação entre consumo e o preço do boi beira a ficção o impacto deve vir com a quebra de alguns frigoríficos o que reduzirá a demanda por matéria-prima e derrubará o preço do boi, fato que é tão comum na história do setor, estes eventos geralmente são acompanhados de calote ao produtor, afugentando ainda mais os investimentos na produção pecuária em curto prazo. Assim que podemos esperar um encolhimento na oferta.

    Muito obrigado pelo comentário e espero que debates saudáveis com este possam contribuir de alguma forma.

  7. Deniz Ferreira Ribeiro disse:

    Para prosseguir o debate saudável focaremos nossas observações sobre os pontos nos quais não há concordância: de início, contestamos que o texto que apresentamos seja uma expressão volitiva não calcada em números e fatos.

    Os dados disponíveis dos indicadores de preços – Indicador ESALQ-BMF para a arroba do boi e IGP-DI e Indice de Preços Pagos pelos Produtores – SP, ambos da FGV -uma vez empregados, descrevem uma realidade fática, expressa em números insuspeitos, na qual constata-se que entre 2002 e 2007 (base=mês de outubro), o preço da arroba do boi gordo caiu, em termos reais, 17,3% e 18,7 %, conforme se considere como deflator, respectivamente o IGP-DI, ou o IPP-SP.

    Os mesmos indicadores revelam que a tal cotação recorde de 2008, nada mais representa do que uma variação real positiva de apenas 4,3%, num período de seis anos, se deflacionarmos a arroba pelo IGP-DI, porém uma redução real de 2,2%, se os preços da arroba forem deflacionados pelo IPP-SP. Esses números explicam a redução da produção da pecuária de corte. Foi uma redução real de rentabilidade, numa época de prosperidade geral.

    Tampouco concordo que os preços praticados nos últimos meses signifique ter a pecuária de corte se beneficiado da orgia, pois eles representam apenas e tão somente a recuperação de um nível de rentabilidade real perdido ao longo dos últimos sete anos. Ora, é forçoso lembrar que foi esse patamar de rentabilidade e sua redução gradativa nos últimos sete anos que desencadeou um processo de encolhimento forçado do plantel de matrizes do rebanho nacional.

    Assim, nosso enfoque emana da observação dos fatos: um patamar de preços da arroba ao redor dos 100 reais, a preços de hoje, teria eventualmente o condão de reverter a tendência de redução do plantel de fêmeas, pelo menos para boa parte dos pecuaristas.

    Quanto ao Uruguai, sua realidade é muito diferente da nossa e seu mercado funciona pautado por outros parâmetros; exemplificando – à época em que o pico de preços ali chegou ao equivalente a R$ 82/@, em meados do ano, com queda de 30% nos últimos meses, conforme mencionado, o preço aqui superava a casa dos R$ 90 ao produtor e R$ 85 o equivalente carcaça no atacado. Lá houve a citada redução de 30%, aqui o preço ao produtor continua a superar o patamar de R$ 90 e o equivalente carcaça no atacado também alcança R$ 90.

    Qualquer quebra de frigoríficos repercutirá apenas por alguns dias, pois a ociosidade nas salas de abate é expressiva.

    Por último, notemos que a demanda internacional direcionada ao mercado brasileiro não resulta simplesmente da demanda mundial agregada, e sim de um deficit entre o consumo global e a produção dos demais países produtores, o qual tem sido crescente, revelando uma tendência. O modelo de produção europeu, americano e australiano estão mais afetados pela crise do que nós, pois mais dependentes de capital financeiro privado os dois últimos, e de recursos públicos, o primeiro, estes comprometidos com o socorro aos bancos.

  8. Humberto de Freitas Tavares disse:

    Caro Rodrigo,

    O preço alto da carne brasileira tem-se sustentado pela existência de um forte mercado interno, além obviamente da impossibilidade de arbitragem a preço inferior. Seus dados sobre o Uruguai, contrastados com os brasileiros, deixam isso muito claro. Se caiu lá, por que não caiu aqui?

    Tá difícil vender carne brazuca? Desova no mercado interno. Tá difícil vender carne uruguaia, americana ou australiana? Aceita o preço que aquele trader ofereceu. Não vamos nos esquecer nunca de que apenas 16% do boi uruguaio é carne que o europeu deseja, e o resto do boi e 100% de todas as vacas precisam ser – e são – vendidos também e todo dia.

    O Margen quebrou, mas não por causa do preço da arroba. Comprar de vendedor de boi relutante custa mais caro e tem que ser à vista. Isso torna a empresa ainda menos competitiva e a leva a atitudes desesperadas, muitas vezes ao arrepio da lei. Por quê o vendedor relutava em entregar o boi e a vaca gorda? Porque todo o mundo sabia que o Margen ia quebrar.

    Capacidade de abate ociosa não é problema tão sério assim. Estamos na entressafra, e nas águas tudo se resolve. Aliás, o sr. Mercado já deu um jeito nisso com a parada ou desaceleração das muitas plantas do Margen. As que ele decidir serem necessárias, em número e local, serão restauradas pela sua famosa mão invisível.

    Muito mais importante que capacidade de abate ociosa é o bom posicionamento estratégico e o custo do frete. Instalações de frigoríficos são baratas face ao giro financeiro. Faltou boi? Devolve um frigorífico arrendado, desliga uma câmara frigorífica, para de fazer hora extra de abate, dá férias coletivas, diminui a workforce de pior qualificação e mais baixo salário. Se possível, antes de tudo isso, pisa na goela do boiadeiro, mas na atual conjuntura ele está valente.

    O mundo não acabou e hoje à noite tem que ter comida na mesa. Vem aí novo aumento do mínimo, e pela bolsa-família e outros programas distributivos a sociedade brasileira continua a permitir ao despossuído o prazer ocasional do acesso à carne vermelha. Vem crise? Pela teoria do utilitarianismo, sabemos que a frustração decorrente da impossibilidade momentânea de comprar aquele Fiat Uno 92 pode se transformar em maior consumo de carne.

    Supor que o preço da carne vai desabar presume também que haja fornecedores de carne e de boi alternativos, à espera da catástrofe para se aproveitar de uma suposta ineficiência dos agentes atuais. Não há. Podemos assistir a dificuldades sérias de frigoríficos com a boca maior que o estômago, mas quebradeira geral, não. Alta volatilidade no preço? Talvez, nesta eventualidade. Mas na crise, boiadeiro deixa o boi quieto no pasto. Os poucos que adubam pasto deixam de fazê-lo. Reforma de pasto/herbicida? Deixa dar uma boa veda. Sal mineral? Sal branco!

    Despesa zero, esta é a palavra de ordem em tempos bicudos, se vierem. Com a queda de produtividade, a oferta rapidamente se ajusta à baixa na demanda.

  9. Thales dos Anjos de Faria Vechiato disse:

    Caro Rodrigo,

    Parabéns pelo artigo. O nosso país é carente em artigos que gerem debate entre diversos profissionais de um mesmo seguimento!

    Forte abraço.

  10. Humberto de Freitas Tavares disse:

    Dólar valorizado vai significar dificuldades para o JBS exportar da plataforma EUA.

    Acho que o perfil da dívida do Marfrig em US$ é alongado, então não deve ter grandes dificuldades; elas tendem a ser superadas pelo ganho cambial nas plataformas de Sul-América, se ele conseguir vencer a queda de braço com os importadores.

    Acho que Minerva tende a nadar de braçadas, com Bertin e Independência também favorecidos. Os nanicos podem ter alguma dificuldade com a retração no mercado interno.

    Alguém mais opina?

plugins premium WordPress