Nutrição e reprodução em bovinos
12 de setembro de 2003
Até quando?
16 de setembro de 2003

A caminho de uma produção com mais qualidade

No mês de agosto deste ano, O Brasil bateu mais um recorde de exportação, enviando ao exterior 37,5% a mais do que em agosto de 2002. Em agosto alcançamos a Austrália, hoje o Brasil já é o maior exportador de carne do mundo em toneladas de equivalente carcaça.

Os dados consolidados até julho de 2003 mostram que o Brasil exportou mais de 445 mil toneladas de carne bovina (in natura e processada). Já a Austrália terminou o sétimo mês do ano com um volume de 483 mil toneladas de carne. Do total brasileiro, um pouco mais de 100 mil toneladas é composta de carne industrializada, o que convertido em toneladas de equivalente carcaça colocará o Brasil na primeira posição, na frente da Austrália (os dados australianos não incluem este tipo de carne, uma vez que sua produção é mínima nesse país).

Além disso, enquanto expandimos o volume exportado e os mercados atendidos (o mais novo mercado é a Argélia), na Austrália a severa seca que acometeu o país este ano prejudica em muito a produção e reduz as exportações de carne. Além disso, os principais mercados australianos como Japão, Coréia e Canadá estão importando menos (os EUA são a exceção).

Esse cenário é muito favorável para o Brasil. Na Europa, o preço da carne vem aumentando e os principais países vendedores (Brasil, Argentina e Uruguai) não têm conseguido atender a demanda.

É incrível como estamos sendo beneficiados por inúmeros fatores, mas cada incremento do Brasil no mercado mundial faz que os desafios se tornem maiores. Estamos longe de ser o ocasional exportador de carne excedente que éramos há 10 anos atrás. O aumento das exportações traz a maior exigência por qualidade e a necessidade de se entender as necessidades de cada comprador.

Agora que vivemos uma maior demanda por qualidade, a cadeia da carne vem discutindo muito sobre um assunto relacionado à qualidade: a classificação de carcaças.

A classificação de carcaças é o assunto do momento e ao mesmo tempo muito antigo. Há muito existe um sistema brasileiro de classificação. Com a utilização de um sistema de classificação a grande mudança possível é na forma de comercialização de bovinos. Com um sistema eficiente é possível mudar do sistema “bica corrida” onde se paga o mesmo por todo (ou quase todo) tipo de animal para um sistema onde há um preço base e bonificação e penalidades dependendo do animal entregue pelo produtor.

Acredito que existem duas grandes vantagens nessa mudança. A primeira é a transparência. A penalidade (ou o prêmio) tem de ser explicada dentro de critérios objetivos, como:

– peso de carcaça, o que já ocorre na grande maioria dos mercados, quase sempre representada por um desconto para carcaças leves,
– cobertura de gordura, que determina maior ou menor rendimento de desossa, possíveis problemas com maciez e desvalorização de cortes nobres (ex.: picanha sem cobertura vale menos),
– conformidade de carcaça, que determina maior ou menor rendimento de desossa,
– idade do animal, o que já ocorre em alguns mercados,
– sexo, o que já ocorre na grande maioria dos mercados.

Com um sistema simples seria possível se evitar descontos devido à raça (cruzados X tucuras X zebus). O desconto no preço será explicado pelo acabamento de gordura e não pela cor do animal. Isso facilitaria em muito a adequação da produção para buscar o prêmio pela qualidade, ou ao menos para se evitar descontos. Um bom exemplo é um produtor que poderia saber exatamente que acabamento mínimo de gordura deverão ter seus animais a fim de evitar descontos de preço. Isso pode ser alcançado com manejo alimentar adequado, apartação e no futuro até avaliação com ultra-sonografia.

A outra vantagem é o estímulo a produção de animais de maior qualidade. Talvez o termo mais adequado seja animais de acordo com as necessidades de determinados mercados. O Brasil, exportando para cada vez mais países e buscando cada dia nichos de mercado que remuneram melhor, terá que oferecer carne em padrões muito variados. Isso já ocorre com os grandes frigoríficos exportadores, que têm que se adequar a cada mercado que atendem.

Com o aumento da porcentagem exportada fica cada vez mais difícil comprar na “bica corrida” e vender com diversos padrões. A cada dia vai ser mais importante a indicação ao produtor do que o frigorífico deseja. Acredito que a forma mais simples de se mostrar isso é oferecendo preços diferenciados para tipos diferentes.

Preço diferente para qualidade diferenciada – boi orgânico

Há dois anos atrás muito se falou sobre produção de bovinos orgânicos. Dizia-se que o sobre-preço seria muito grande. Hoje a produção ainda não é grande, mas apenas uma oferta de preço bastante superior por animais certificados com certeza iria aumentar em muito a oferta deste produto. Infelizmente o mercado europeu não está pagando um sobre-preço alto o suficiente para permitir que os frigoríficos brasileiros ofertem prêmios por esse tipo de animal que anime um grande número de produtores a se dedicar a este sistema.

Preço diferente para qualidade diferenciada – boi inteiro X castrado

Acredito que os frigoríficos não são muito eficazes em demonstrar que não desejam adquirir machos inteiros (talvez não haja realmente esse interesse). O atual desconto de R$1,00/@ (ou até mesmo R$2,00/@) não é suficiente para estimular a produção de animais castrados. Isso acontece, pois R$2,00/@ de desconto nos preços atuais para estado de São Paulo representa um pouco mais de 3% de deságio. O desempenho de animais inteiros em relação a castrados supera muito facilmente essa diferença. Pode parecer que não, mas hoje é bem mais lucrativo se vender animais inteiros com deságio do que castrados com preço cheio.

O sistema de classificação permitirá a identificação de diferentes padrões e a adequação de sistemas para atender essas novas exigências. Alguns frigoríficos exportadores desejam estimular a produção de animais com mais de 18@ e acabamento de gordura superior a 3mm. Um bom consultor de nutrição, com uma boa planilha de custos poderá facilmente calcular se vale a pena ter um custo superior por se ter uma fase de engorda mais prolongada para alcançar um prêmio pela carcaça como um todo.

Podemos assim facilitar a produção e comercialização de animais (e de carne) mais adequados às necessidades do mercado. Vale lembrar que o prêmio pela qualidade (ou o deságio pelo produto inferior) não é fixo. Varia de acordo com as exigências do consumidor.

Nos EUA, a diferença entre os tipos Choice (qualidade superior) e Standard (qualidade mediana) vem aumentando constantemente, acompanhando uma maior exigência do consumidor por maciez e maior aceitação de marcas de carne. Em resumo, o consumidor americano está cada dia mais aceitando pagar uma diferença maior para a carne que considera melhor em relação a uma carne mediana. Isso significa que é mais vantajoso produzir o Choice ou por outro lado é menos vantajoso produzir o Standard.

Será cada vez mais difícil saber se estamos recebendo um prêmio por nossa qualidade, nossa eficiência, ou se nosso vizinho é que está sendo penalizado por não conseguir esse mesmo padrão.

A grande pergunta que deve ser feita é: vale a pena produzir a carne que se paga mais? Vai depender de quanto mais se paga, quanto mais se custa e quão bons vamos ser para fazer essa conta.

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