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Equivalências financeiras entre boi gordo versus terra e entre milho versus boi gordo em SP

Por Gustavo Lineu Sartorello¹*, Thayla Sara Soares Stivari¹, João Paulo Sigolo T. Bastos², Augusto Hauber Gameiro³

Neste mês gostaríamos de aproveitar a oportunidade e apresentar um trabalho que foi publicado no VIII Simpósio de Pós-Graduação e Pesquisa em Nutrição e Produção Animal: “Novos desafios da Pesquisa em Nutrição e Produção Animal 2014”, realizado nos dias 7 e 8 de novembro e que recebeu prêmio de Melhor Apresentação de Pôster na Área de Ruminantes. Assim na nossa próxima publicação seguiremos tratando sobre os cálculos do custo de produção.

O território brasileiro tem dimensões continentais. Com aproximadamente 8,5 milhões de km² de extensão, é o quinto maior país do mundo. A vasta extensão territorial do Brasil tem sido alvo de investimentos estrangeiros para aquisição e arrendamento de terras com o intuito de produzir alimentos, para fins especulativos ou ambos (FERRO& CASTRO, 2013). Fato este que expande as fronteiras agrícolas do país, desenvolvendo regiões onde antes não havia infraestrutura adequada para produção em larga escala de alimentos.

Na produção animal, segundo dados do Ministério de Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA), estima-se que a área de pastagem disponível (em 2011) era de aproximadamente 152 milhões de hectares, 8% menor do que em 1975. Em sentido oposto, o rebanho de bovinos está aumentando. Dados da FAOSTAT (2014) apontam que o rebanho de bovinos atingiu em 2013 aproximadamente 217 milhões de cabeças, conferindo o status de maior rebanho comercial do mundo.

Porém, apesar do tamanho do rebanho de bovinos no Brasil, o Boletim Informativo do Setor de Alimentação Animal de setembro de 2014 (Sindirações) relatou a escassa oferta de bezerros, que assim como o boi magro, que teve a arroba bastante valorizada. O clima atípico enfrentado pelos produtores neste ano, por sua vez, influenciou diretamente a qualidade das pastagens nas diversas regiões produtoras, exigindo o uso da suplementação mineral e o consumo de rações (ZANI, 2014). Ou seja, alterando a dinâmica de custos de produção, o pecuarista passou a adquirir grãos para a alimentação dos animais. A carne bovina é uma commodity e pequenos aumentos no custo de produção impactam significativamente a renda do pecuarista.

As commodities são mercadorias produzidas em larga escala e, geralmente, comercializados em nível mundial. São equivalentes e trocáveis por outra igual, independente de quem a produz. O mercado internacional determina os preços que, por consequência, flutuam diariamente com base na oferta e procura.

No sentido de proteção das flutuações de preços, algumas tradings têm adotado as operações de barter para boi, chamadas de beeftrade, em que os preços dos produtos da empresa são negociados com base na cotação da arroba do boi gordo. As operações de barter levam em conta a equivalência financeira, que por sua vez é uma ferramenta utilizada para se calcular à proporção quantitativa, determinando assim a proporção entre a troca de duas mercadorias. Desta forma é possível fazer comparações entre insumos e/ou commodities ao longo do tempo, estabelecendo valores de trocas para as mercadorias.

Neste estudo entende-se que o conhecimento das equivalências financeiras entre boi gordo versus a terra e a saca de milho versus o boi gordo pode auxiliar o pecuarista em tomadas de decisão gerenciais, tanto para a expansão como para a intensificação da atividade pecuária.

Nosso objetivo foi avaliar as equivalências financeiras entre o preço da arroba (@) do boi gordo e o preço do hectare (ha) de terra, e entre o preço da saca de milho em relação ao boi gordo.

O cálculo do preço relativo de um bem em relação a outro se faz em função do bem que se deseja renunciar, podendo ser representado pela fórmula:

PRA = PA / PB

Onde o preço relativo do bem “A” (PRA) é igual ao seu preço (PA) dividido pelo preço do bem “B” (PB) (MARÇAL, 2006).

A equivalência financeira tem por finalidade estabelecer a relação de troca entre insumos, onde é possível avaliar o efeito do tempo sobre os aumentos de um insumo em relação ao outro. Supõe-se no ano 1 a troca do insumo “A” pelo insumo “B” na proporção 2:1, podendo avaliar essa mesma relação no ano “n”. Deste modo pode-se estabelecer a equivalência financeira do preço do boi gordo para aquisição de terra de cultura de primeira e também de milho para a aquisição de boi gordo.

Os valores utilizados no presente trabalho foram compilados a partir do banco de dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA), entre os anos de 1995 a 2013 (IEA, 2014), e posteriormente deflacionados e corrigidos para o mês de julho de 2014, utilizando o IPC-FIPE (FIPE, 2014). Os preços utilizados para terra (R$/ha) foram os médios para o estado de São Paulo, que classifica o solo do tipo “terra de cultura de primeira” como áreas de produtividade média a alta, mecanizável, de solo profundo e bem drenado. Os preços utilizados para o milho (saca de 60kg) e para a @ do boi gordo são os preços médios coletados a partir do banco de dados do IEA, para o estado de São Paulo. Os dados foram analisados descritivamente.

Os resultados mostram que a relação de preços entre boi gordo e terra aumentou ao longo do período estudado (19 anos), ou seja, o preço do boi gordo se deteriorou frente aos preços da terra (Figura 1).

Figura 1

Figura 1. Equivalência financeira entre boi gordo e terra de cultura de primeira no período de 1995 a 2013.

No primeiro ano do comparativo (1995) eram necessárias 157,3@ de boi gordo para comprar o equivalente a um ha de terra. Já em 2013 esse valor passou para 216@, representando um incremento de 37,3%. Esse comportamento pode ser explicado pela significativa valoração da terra no período – aproximadamente 230% -, enquanto o boi gordo apresentou aumento de 67% nos preços da @.

O preço da terra é um componente importante a ser considerado no custo de produção animal. Tanto é que no estudo realizado por Stivari et al. (2014) os autores propuseram a utilização do Valor Esperado da Terra (GAFFNEY, 1960) para determinar o preço máximo da compra da terra nua para um estabelecimento comercial de ovinos de corte. Em outras palavras, determinaram qual seria o valor máximo que se pode pagar na terra para que a produção de ovinos de corte fosse viável.

Outro fator que exerce forte impacto na produção animal é o custo da alimentação. O milho é o carro chefe da alimentação concentrada para bovinos. Para essa commodity o cenário observado foi diferente, onde os preços da saca de milho se deterioraram frente aos preços do boi gordo (Figura 2).

Figura 2

Figura 2. Equivalência financeira entre saca de milho e boi gordo no período de 1995 a 2013.

Foi observada mínima variação de 3,4% no aumento dos preços da saca de milho ao longo dos 19 anos. Esse pequeno aumento, em conjunto com a elevação do preço da @ do boi, permitiu que a equivalência financeira entre os dois produtos subisse de 3,22 sacas em 1995 para 5,19 em 2013, aumento de aproximadamente 61%.

No cenário mundial o momento é de baixa contínua nos preços das commodities agrícolas. Os desajustes no rebanho bovino dos Estados Unidos e Austrália podem ainda gerar mais negócios externos para a pecuária bovina brasileira e valorizar, ainda mais, a arroba do boi gordo (ZANI, 2014).

Assim, frente à redução no preço de um dos principais componentes da dieta animal (o milho) e com a constante elevação do preço da terra, faz-se necessário continuar otimizando as áreas de pastagem. Tal estratégia deve ser preconizada tanto na criação de ciclo completo – por meio de pastejo intensivo, como na terminação em confinamento. A profissionalização da atividade através da sua intensificação, otimização e aplicação de métodos de gestão é algo a se almejar não só pelo pecuarista, mas também por todos os elos da cadeia da carne bovina.

Dessa forma, conclui-se que a equivalência financeira pode ser uma boa ferramenta de comparação entre insumos ao longo de um determinado período, avaliando o ganho ou perda na relação de troca, ou seja, saber a deterioração de valor de um produto em relação ao outro.

Em síntese, a análise histórica da evolução dos preços relativos pode nos sinalizar quais as tendências de manejo para o futuro. Com os resultados aqui apresentados, por exemplo, concluímos que economizar espaço (usar menos terra e/ou usar melhor a terra) e priorizar o uso de concentrados (no caso, o milho), podem ser estratégias bem sucedidas para a pecuária em evolução.

Referências

FAOSTAT – FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS SATATISTICS DIVISION. Disponível em: <http://faostat3.fao.org/download/FB/BL/E>. Acesso em: 15 de setembro de 2014.

FERRO, A. B.; CASTRO, E. R. Determinantes dos preços de terra no Brasil: uma análise de região de fronteira agrícola e áreas tradicionais. Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 51, n. 3, p. 591-610, 2013.

GAFFNEY, M. M. Concept of financial maturity of timber and other assets. Raleigh: North Carolina State College, p.105,1960.

IEA – Instituto de Economia Agrícola. Disponível em: <http://www.iea.sp.gov.br/out/bancodedados.html>. Acesso em 15 de setembro de 2014.

IPC – FIPE –Índices de preços ao consumidor – Fundação Instituto de Pesquisa Econômicas. Disponível em: <http://www.portalbrasil.net/ipc.htm>. Acesso em 15 de setembro de 2014.

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/animal/noticias/2013/02/pecuaria-brasileira-reduz-area-e-dobra-producao-em-36-anos>. Acesso em: 17 de novembro de 2014.

MARÇAL, E. F. Há realmente uma tendência a deterioração dos termos de troca? Uma análise dos dados brasileiros. Revista EconomiA, v. 7, n. 2, p. 307-329, 2006.

STIVARI, T. S. S.; CHEN, R. F. F.; GAMEIRO, A. H. et al. Viabilidade de sistemas de produção de ovinos a pasto utilizando indicadores econômicos de longo prazo e a metodologia do valor esperado da terra. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, v. 51, n. 2, p. 149-157, 2014.

ZANI, A. Setor de Alimentação Animal – Boletim Informativo do Setor. Disponível em: <http://sindiracoes.org.br/wp-content/uploads/2014/09/boletim-informativo-do-setor-versao_portugues_setembro_2014.pdf>. Acesso em: 30 de outubro de 2014.

 

[1]Alunos de Programa de Pós Graduação no Departamento de Nutrição e Produção Animal, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo (VNP/FMVZ/USP), Pirassununga, São Paulo, Brasil. 

2 Zootecnista, Mestre em Nutrição e Produção Animal pela Universidade Estadual Paulista “Profº Júlio de Mesquita Filho”, Campus Botucatu. Gerente Técnico e de Operações da JBS Confinamentos Ltda.

3Engenheiro-Agrônomo, Doutor e Mestre em Economia Aplicada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq/USP). É Professor Doutor na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Universidade de São Paulo (FMVZ/USP), Pirassununga, São Paulo, Brasil. 

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