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Criador espanhol volta às origens para produzir a “melhor carne do mundo”

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Para fechar o círculo perfeito e oferecer a “melhor carne do mundo”, o criador de gado e chef espanhol José Gordón, de 51 anos, tirou o pé do acelerador. O dono da Bodega El Capricho voltou às origens e estabeleceu no povoado rural de Jiménez de Jamuz, a cerca de 50km de León (Norte da Espanha), uma forma de produção nostálgica e, paradoxalmente, representante da vanguarda, segundo experts em carne bovina.

“Para mim, o passado é onde está a essência de todas as coisas, é quando as coisas eram simples, naturais. Hoje quase tudo está manipulado”, diz Gordón, que cria em sua propriedade dez raças de bois autóctones da Península Ibérica. “Avançamos muito rapidamente, e creio que precisamos parar um pouco. Precisamos olhar um pouco para trás, porque estamos perdendo coisas que provavelmente não vamos recuperar nunca mais, e mais tarde sentiremos falta.”

A Bodega El Capricho produzia apenas vinho e foi fundada por Segundo Gordón, avô paterno do hoje internacionalmente famoso chef, no mesmo local hoje celebrado como fornecedor da melhor carne do mundo pela revista “Time”, pelo britânico “The Guardian” e pelo documentário francês “Steak Revolution” (2014), disponível na Netflix.

Os clientes da bodega costumavam levar a própria comida e acomodavam- se em mesas na varanda sem cobertura. Na adolescência, nos anos 80, Gordón teve a ideia de montar uma churrasqueira e oferecer aos frequentadores carne de porco, cordeiro, galinha e até de avestruz.

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Começou aí a obsessão pela carne ideal que o levaria a estudar engenharia agrônoma em Cantábria (Norte da Espanha) e à decisão-chave de sua carreira: para atingir a perfeição, teria que cuidar da produção desde o início, o ciclo completo. “Quem olha só o restaurante não vê que há muito trabalho por trás, uma cadeia produtiva inteira.”

Há 30 anos, quando tomou a decisão de abrir o restaurante na antiga propriedade familiar, Gordón botou o pé na estrada. Viajou pela Espanha e por Portugal em busca de animais especiais. Hoje tem um rebanho de pouco mais de cem bois, vindos de uma rede fiel de fornecedores.

O lugar que ele oferece aos animais é uma bucólica fazenda cortada pelo rio Jamuz, onde os bois vivem em silêncio, longe dos barulhos da estrada, em pastos onde se destacam os aromas de tomilho e de alfazema. Eles têm vida longa: os animais são abatidos com 7 ou 8 anos de idade, e alguns chegam a viver 13 anos.

“O que interessa para nós é o macho castrado no primeiro ano de nascimento, que tenha uma limpeza hormonal que faz com que as suas gorduras sejam muito delicadas”, explica Gordón, contando um dos segredos da carne saborosa e suculenta que serve a cem pessoas por dia, em média, na Bodega El Capricho.

Gordón não tem estrelas Michelin e tampouco assume o objetivo de consegui-las. Sua equipe de cozinha é jovem, comandada pelo chef argentino Diego Zarate, responsável pela parrilla (churrasqueira) e pela parte mais criativa do cardápio. O próprio Gordón divide seu tempo entre o restaurante e a produção. Na Bodega El Capricho, é ele quem leva a peça escolhida a cada mesa e demonstra aos clientes como se faz o corte.

O restaurante tem o aspecto acolhedor de uma caverna, com iluminação suave e uma decoração despojada, com mesas de madeira rústica. Carro- chefe do restaurante, o “chuletón de buey” pode custar de € 77 (o quilo) até € 120, dependendo da idade e do tempo de maturação.

Gordón circula pelo salão cumprimentando os clientes, muitos dos quais fizeram reservas com meses de antecedência. O chef é solícito, mas não interrompe o vaivém entre a grelha e o salão. Gosta de deixar sua marca em cada etapa do trabalho, com exceção de uma: “Não gosto de estar presente quando separam um animal do grupo, me sinto mal. São animais especiais. Alguns deles já tinham que ter sido sacrificados, já não deveriam estar aqui, porque o custo dispara, mas há animais dos quais é difícil separar-se”, explica Gordón, depois de passar longos minutos acariciando o pescoço de Divino, de 8 anos, 1,5 mil kg.

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Apesar de seu tamanho imponente, os bois de Gordón respondem a seu chamado como se fossem mascotes. Têm olhar dócil e vivem em harmonia. Cada animal consome mais de 30 kg diários de alimentos, como rações naturais e forragem. O chef está com os bichos todos os dias. Estaciona a picape, única interferência visível em uma paisagem que poderia ser do século XVIII, colhe um ramo de tomilho e se esgueira entre os mourões da cerca para levar o mimo a um de seus animais preferidos.

Quando encontra um animal do qual gosta, Gordón é capaz de perder o sono até conseguir fechar o negócio. “É uma paixão desmedida. Sem esse sentimento, tudo isso não tem sentido, apenas do ponto de vista da rentabilidade.”

Decretar a morte de um de seus animais é uma decisão dura. Segundo Gordón, não existe um momento predeterminado para o abate, desde que a idade mínima seja 5 anos. “Busco o momento em que eles estão pletóricos, com a quantidade suficiente de gordura. É algo visual, dá para ver quando se tem o conhecimento e a sabedoria.”

De acordo com a filosofia de Gordón, é preciso cuidar de tudo para que os animais tenham uma boa vida e uma morte digna. “A vida e a morte são fundamentais. Tudo o que se gera com o cuidado delicado, com o bom trato, que o animal se sinta bem, se sinta feliz, que esteja muito bem alimentado, sereno, não tenha medos. Tudo isso está gerando algo que não se vê, uma energia que de alguma maneira estará presente no produto.”

Ele acompanha pessoalmente seus animais ao abatedouro, em León. Esta é a única etapa do processo que ele não realiza na sua propriedade, para atender às exigências da legislação sanitária espanhola. Gordón acredita que para os animais é importante ver um rosto conhecido e, sobretudo, não sentir antecipadamente a hora da morte.

“Em alguns matadouros, dão estocadas nos animais com barras elétricas 200 metros antes do local onde vão morrer. Por favor!”, diz, irritado. “Não deixo que toquem meus animais. Vão tranquilos, vão comigo. Morrem com honra, que é o mínimo que merecem.”

Nos Estados Unidos, os animais são criados para abate rápido, em geral antes dos 18 meses de vida, e nunca depois dos 30 meses. Gordón é um crítico por definição desse modelo. “As grandes produções buscam a rentabilidade, então os animais são sacrificados muito rapidamente, com pouca idade, são alimentados para ganhar peso depressa”, afirma.

Um mercado consumidor que exige carne magra teria sido formado, em sua opinião, com base em informações disparatadas, de que todas as gorduras seriam más para o organismo humano. Para Gordón, “não se pode meter todas as carnes vermelhas no mesmo saco”. “Estou seguro de que as gorduras que estamos produzindo com esses animais, com esse tipo de alimentação natural, são de uma qualidade incrível”, diz.

A busca por aperfeiçoar e ampliar seu negócio fez com que Gordón montasse suas próprias câmaras frigoríficas, onde a carne passa por um processo de maturação de 90 dias no mínimo. Cerca de 50% da produção de carne é destinada a vendas a hotéis e restaurantes espanhóis, além da exportação, sobretudo à Inglaterra, onde a popularidade de seus produtos explodiu após reportagens do “The Guardian” e “The Telegraph”. Negociações para expansão das vendas internacionais incluem países como Brasil, México, Canadá, Estados Unidos e Rússia.

A Bodega El Capricho abre todos os dias do ano, com exceção de uma quinzena em janeiro quando a equipe viaja a um país estrangeiro para montar um cardápio de degustação. Em 2017, o país escolhido foi o Japão. “No ano que vem poderia ser o Brasil, está na nossa alça de mira”, diz.

Veja abaixo um vídeo institucional da Bodega El Capricho:

Fonte: Valor Econômico, resumida e adaptada pela Equipe BeefPoint.

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